domingo

Putin:o novo czar formatando o novo império



De facto, nunca deixou de estar em curso uma competição global. Segundo o ministro dos NE russo Sergey Lavrov, pela 1ª vez, em muitos anos, emergiu um ambiente realmente competitivo no mercado das ideias entre diferentes sistemas de valores e modelos de desenvolvimento. A boa notícia, para o lado russo, é que o Ocidente está a perder o seu monopólio no processo de globalização, afirmação e projecção de poder planetário. 

Ou seja, e tomando como exemplo a tentativa de anexação da Crimeia pela Rússia do novo czar, quando os russos falam de um mundo multipolar, não se reportam apenas à distribuição de poder. Referem-se também à competição do sistema de valores e ideias que estruturam e promovem a fundação de uma ordem mundial multipolar. 

A novidade em toda esta narrativa é que, pela 1ª  vez, é a Rússia a utilizar a justificação assente do Direito Internacional Público - segundo o qual o poder na Ucrânia foi tomado à força, logo não é legítimo. E não o sendo, o poder de facto transitório não é legítimo; e com esta habilidade jurídica Putin, o novo czar coloca, duma só penada, a Ucrânia, os EUA e os restantes aliados num regime fora-de-lei. O que dá espaço à Rússia para se arrogar da condição respeitadora do direito internacional supostamente violado pela oposição ucraniana e pelos apoios externos (EUA) - que apoiaram activamente esse golpe anticonstitucional, como Putin lhe chamou. 

Na verdade, esta habilidade jurídica de Putin, tantas vezes utilizada pelo Ocidente para justificar a intervenção armada noutros países, é agora mitigada por Putin para legitimar a ocupação de facto da Crimeia pela Rússia, e manifestar a hegemonia militar do império no condicionamento político da Ucrânia - que apenas lutou para depor um oligarca corrupto, Yanukovitch, financiado pelo seu amigo do outro lado da fronteira do leste - que ainda é mais corrupto, apenas com a diferença de que dispõe de incomensuravelmente mais poder. 

Putin, ao utilizar as armas jurídicas do Ocidente, manipulando as vantagens dos argumentos constantes do Direito Internacional Público, revela que aprendeu depressa a lição. Não só foi o agressor como alega ter o DIP do seu lado, porque, por um lado, o governo ucraniano de transição é ilegítimo, logo não é um interlocutor credível da Rússia; por outro, o Império arroga-se o direito de intervir para proteger todo e qualquer cidadão russo que esteja sob qualquer tipo de ameaça pelos poderes ucranianos. 

Assim, Putin faz a quadratura do círculo. 

De facto, o Ocidente ficou enredado nas armas que ele próprio criou para se defender no passado recente. Tudo isto ocorre num mundo democrático que acreditava que a competição tinha terminado quando viu cair o Muro de Berlim. 

Alguns também pensaram que seria o fim da história...



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