quinta-feira

O Estado-refém - por João Cardoso Rosa -


João Cardoso Rosas


O discurso dominante sobre a reforma do Estado transformou-se num imenso logro. Por um lado, o Governo apresenta ideias gerais e documentos para dizer que vai ainda proceder a essa reforma. Por outro lado, a oposição diz que o Governo não fez e não fará uma reforma do Estado. Nenhuma destas visões nos revela verdadeiramente aquilo que está a acontecer.
A verdade é que o Governo fez já em boa parte - e continuará a fazer - a única reforma do Estado que pretende fazer e que consiste em diminuir a sua dimensão e o seu poder tornando-o, propositada ou inadvertidamente, refém de interesses especiais. A oposição deveria por isso ser mais assertiva na defesa de uma reforma outra do Estado - aquela que consiste em dar-lhe a dimensão e o poder que lhe permitam desempenhar as funções e tarefas de um Estado moderno.

Assim, é bem vinda a vaga de fundo a favor da renegociação da dívida portuguesa. É mais do que tempo de exigir ao Governo de Portugal que defenda o país em vez de seguir a estratégia da Alemanha. Aquilo que é inaceitável é que o Estado português continue a emagrecer e a deixar de cumprir em grande medida os seus compromissos com trabalhadores, pensionista e a sociedade em geral, ao mesmo que tempo que não belisca sequer os outros e iguais compromissos com os seus credores institucionais.


Seria também bem-vindo um discurso que acabasse com a fraude do "ajustamento do sector privado que não foi feito pelo sector público". Na verdade, o ajustamento no sector público foi brutal, embora numa lógica de corte cego. Mas aquilo que aconteceu no sector privado foi a transferência de custos das empresas para o Estado através do desemprego. Ou seja, muitas empresas, em vez de ajustarem o seu funcionamento, limitaram-se a despedir trabalhadores cuja subsistência é hoje garantida pelo Estado em subsídios de desemprego, subsídios sociais de desemprego, assistência social, etc.


Seria também crucial que os agentes políticos tivessem um discurso com consequência no sentido de defender os cidadãos face ao comportamento predatório das empresas rentistas ou mais poderosas. A sensação que existe hoje na sociedade portuguesa é a de que há "estados" dentro do Estado e que é cada vez mais difícil lidar, por exemplo, com a EDP ou os grandes bancos. Os preços e custas cobrados por este tipo de empresas, assim como o seu comportamento imperial e arrogante, deixam hoje no desespero sobretudo as famílias mais frágeis economicamente, mas também muitas pequenas e médias empresas.


Precisamos por isso, com urgência, de libertar o Estado da teia de interesses à qual está hoje submetido, no sentido de voltar a conferir-lhe o papel de protecção e serviço aos seus cidadãos. Essa será uma tarefa 

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Obs: Medite-se em todos e em cada um destes parágrafos. Todos têm, lamentavelmente, fundamento na verdade dos factos cuja consequência é a de empobrecer os portugueses. 

- O sublinhado é nosso. 



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