sexta-feira

Quando o valor das elites desce abaixo da infra-massa

Quando estamos em casa e ligamos o televisor é na convicção de que vamos aprender algo ou divertirmo-nos como a agenda de infotainment que as estações têm para nos oferecer. Contudo, há momentos em que nada disso ocorre, porque nos deparamos com um suposto titular de cargo público, ainda por cima entrevistado numa estação paga com os impostos dos portugueses, e que em resultado dessa conversa resulta uma mão cheia de nada. Pouco importa que o ministro seja do partido A, B, C ou D ou esgote o abecedário, o que seria importante é que o entrevistado não manifestasse tanta ignorância, tanto lugar-comum, tanta banalidade acerca dos negócios do Estado, imprimindo neles uma ideia de superficialidade e desarticulação que arrasa qualquer mente, mesmo a mais crédula e ingénua.
Não se pode falar de impostos, transportes, modelos de gestão de empresas do Estado, como quem fala de salsichas ou de comida para cão. Há que ter maior seriedade e preparação no tratamento de cada uma dessas questões, todas elas como uma história, com uma verdade.
Mas o que é que, em nome do Gov, alguns pretendem fazer: como não dominam nenhum dos assuntos na especialidade, iludem o povo com enunciados genéricos, com frases-prontas, com raciocínios rápidos da loja dos 300 a fim de serem consumidos como se de verdades se tratassem. Em tempos, Ramalho Ortigão referiu que a opinião pública era a coisa mais estúpida que existia em Portugal, e, de um modo geral, pode afirmar-se que a opinião pública é construída por ideias dominantes nas massas, sobre os vários assuntos de interesse politico e social.
Mas o mesmo Ramalho Ortigão, sempre crítico e perspicaz, identifica nessa opinião pública as fontes primárias, as tais ideias-feitas, os tais lugares-comuns, que depois pululam entre nós mediante entrevistas atávicas, dadas por gente cultural, técnica e politicamente impreparada para falar em público e com o público, pois a única coisa que tem para dizer são os tais lugares-comuns que, vistos à lupa, apenas visam fixar a sede do exercício do poder e, se possível, reforçá-lo. Nisso, todos os players públicos aprenderam a lição do florentino Nicolau.
São precisamente esses seres atávicos que ocupam a esfera pública, que alienam o povo, que já tem uma baixa cultura política, não podendo, por isso, conseguir distinguir uma banalidade dum lugar-comum, porque para ele ambas as coisas são distintas e até podem ser boas para o seu futuro. Mas não são.
É, pois, contra esta alienação induzida (especialmente, a partir do Estado - que deveria dar o exemplo de competência e seriedade) que nos devemos bater, o que implica desnudar os verdadeiros charlatães que ocupam hoje o espaço público, dentro e fora do exercício do poder, sob pena de incorrermos em mais preguiça mental, em mais conformismo, tudo por incapacidade julgadora dum povo que só acorda à pedrada.
Daqui decorre uma constatação comezinha: hoje, em Portugal, faz-se política sobre o joelho, e alguns dos titulares de cargos públicos representam o Estado da pior forma, ou seja, como aqueles alunos que, de per se, já são naturalmente limitados, depois ainda têm a agravante de não conseguirem minimamente alinhar duas ou três ideias claras acerca de cada uma das políticas públicas em curso.
Este facilitismo explica por que razão temos tão maus políticos, gente que faz política e governa o país com convicções de campanário (ou de partido), com ideias de freguesia alimentadas com conversas em torno de rotundas e promessas de distribuição de subsídios e de nomeação de boys para colonizar toda a máquina do Estado, incluindo o logradouro comum...visível pelos impostos crescentes que actualmente pesam sobre os portugueses, singulares e colectivos.
E foi isto que me transpareceu numa entrevista que ontem a televisão pública passou quando entrevistou um titular de cargo público que, como se evidenciou, não conseguiu transmitir uma única ideia útil e clara ao país. E o mais grave é constatar que é sobre esse atavismo que a generalidade do escol dirigente hoje arquitecta as ideias que servem de guião à governação de Portugal.
Improvisa-se, e, por vezes, o improviso é péssimo. Pena é, porque sacrifica os interesses nacionais, esse improviso seja sistematicamente mau, e aqui parece não haver excepções.

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