Financial Times faz exame a Portugal em dossier
Doing Business in Portugal, isto é, «Fazer Negócios em Portugal» é o título do dossier que o «Financial Times» publica esta quarta-feira. O jornal dedica quatro páginas e 10 artigos à análise do estado da economia do país e defende que estão a surgir sinais positivos em vários setores.
«Decididos a levar a cabo reformas» é o título do primeiro artigo. O jornal escreve que os «objetivos estruturais estão a ser atingidos», embora a um «custo enorme». A desistência do TGV para ligar Lisboa a Madrid é tida em conta.
O jornal evoca Eça de Queirós com uma observação datada de 1872: «A nossa situação só é comparável com a da Grécia:. A mesma pobreza, a desgraça da mesma política, a mesma confusão económica». E cita uma série de comentadores portugueses que admitem que os problemas subjacentes à falta de competitividade do país remontam a mais de um século; não são problemas só com algumas décadas.
O FT sublinha, por outro lado, que a maioria dos líderes europeus e economistas reconhecem agora que seria totalmente injusto equiparar Portugal à Grécia em termos de escala de dificuldades no que toca à dívida, à transparência das contas públicas e ao compromisso entre os partidos para pôr em prática reformas.
Os «comentários mordazes» de Eça de Queirós não caíram no esquecimento. São bem atuais. E «a necessidade de reformas estruturais tem sido amplamente reconhecida já há mais de uma década, mas os sucessivos governos têm-se esquivado ao custo político de as implementar».
«Sinais positivos começam a surgir»
Na segunda página, o FT faz notar que as dificuldades do país «não diminuíram o entusiasmo» dos portugueses pelo euro. Mais ainda: que «há sinais positivos que começam a surgir».
É disso exemplo o crescimento das exportações. E o jornal também acredita que a perda de uma década de competitividade é um cenário que está a começar a ser invertido.
O programa de assistência financeira foi desenhado para aumentar a produtividade e reduzir os custos com o trabalho. «Os riscos são, no entanto, elevados. A recessão na Europa, que compra três quartos das exportações portuguesas e, em particular, na vizinha Espanha, que responde por um quarto, seria uma má notícia. Um novo aumento dos preços do petróleo conduziria a um panorama ainda pior».
No plano interno, «o principal perigo é que o programa de austeridade, sendo implementado para combater a crise da dívida, vá fatalmente comprometer o crescimento do país que precisa de aumentar as receitas fiscais e reduzir a despesa com prestações sociais».
Outro texto olha para o setor financeiro: «Bancos esperam melhoras rápidas». O jornal escreve que a primeira coisa que um bancário diz a um visitante é que o setor financeiro português «é muito diferente dos da Irlanda e da Grécia», os outros dois países que caír
am nos braços da ajuda externa.
«País prepara-se para vida depois da dívida» é outro dos textos - e avisos - do FT.
«Grandes vendas constituem retirada irreversível do Governo» é um outro artigo, claro está, sobre as privatizações, que «já conseguiram juntar quase 10.000 milhões de euros» e através das quais se espera arrecadar «mais 7.000 milhões». As privatizações são, no entanto, «uma das partes mais sensíveis da agenda governamental».
Na terceira página, o FT diz que a as pressões externas facilitam as mudanças e que «pela primeira vez» há uma vontade de fazer reformas estruturais. O ministro da economia, Álvaro Santos Pereira, tem direito a citação no jornal: «Todas as condições estão garantidas».
A última página deste dossier aborda a energia - em que «as incertezas na regulação mancham as perspetivas do setor» -, com o Financial Times a considerar que Portugal é uma «nação dedicada ao mar», mas está «a abrir um novo capítulo», e que o setor turístico tem «boas perspetivas apesar do aumento do IVA».
Obs: Esta notícia só o é porque Portugal ainda tem menos importância do que o influente jornal de economia e finanças FT, especialmente na marcação do agenda-setting transnacional. Se notarmos, não há uma só novidade no que é descrito, ainda que embrulhado numas citações literárias de Eça, para que a coisa assuma uma vertente mais literária e culturalista. Mas nem isto já é novidade.Mais exportações, mas isso, de per se, não representa o crescimento ou a retoma da economia; as reformas arriscam-se a matar o doente (que são os portugueses); o atraso é estrutural, já o sabíamos e se não fosse o fontismo..; a comparação com a Grécia - já é um clássico do miserabilismo pós-moderno do realismo político, ainda que nos matemos menos do que os gregos, o que revela que de nada serviu tanta filosofia e cultura política democrática, já que a Grécia foi o berço duma civilização que hoje se suicida publicamente e morre aos milhares de SIDA e de pobreza que conduz ao desespero-suicida; as privatizações.., são o que são, com o Gov a nomear boys-velhos para o board da empresas que hoje se "chinesinam" (e cumpliciam com o Gov) e vão comprando os restos do Euromundo, ou seja, vão engolindo a memória do Ocidente europeu, em jeito de vingança pela imposição dos velhos tratados desiguais.
Dito isto, que são constatações de lana-caprina, pergunto-me qual a novidade de o FT pegar em Portugal para escrever meia dúzia de banalidades, fazendo cair de quatro os media nacionais - revelando todo o seu paroquialismo analítico e mediático neste canto subdesenvolvido da Europa?! Tanto mais, desconhecendo a natureza das relações do Estado com as grandes empresas, dando-lhes a oportunidade de violar grosseiramente a concorrência em Portugal, com sérios prejuízos para o consumidor. As energias são um dos exemplos desta cumplicidade criminosa do Governo sobre todos nós, consumidores e contribuintes, mas isto o garboso FT desconhece, ou finge que desconhece. O que é preciso é motivar e inspirar o Gov a continuar as reformas.. Só posso encontrar uma justificação plausível para estas coberturas sem fundamento: é que o influente jornal também já se encontra em crise, e qualquer factóide já lhe serve de motivo para fazer uma rábula. Não porque Portugal não mereça uma grande reportagem, mas porque o que é descrito apenas deprime um país e um povo que perdeu o norte, se afunda em impostos e pobreza, tem uma classe política que vive da ilusão, da mentira e da promessa fácil a fim de perpetuar no poder e pouco mais.
Portugal merece mais do que as banalidades do FT, mas para que as banalidades do FT tenham notório desinteresse a ponto de passarem a ser ignoradas, o país tinha de criar condições éticas e morais prévias, com partidos políticos menos corruptos, que permitissem a emergência de um escol dirigente mais competente, técnica e políticamente, e que um verdadeiro plano de reconstrução nacional fosse comunicado e aceite pelos portugueses. Como este desígnio está além das nossas possibilidade actuais, continuamos a fazer a figura do burro que anda de BM, talvez na esperança de continuarmos a sermos cobertos (noticiosamente) pelo garboso e influente FT. Sempre dá outro estilo...
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