O populismo de Cavaco e Sócrates no "Portugal dos caninos"
Imagem WHKG
Foi lamentável ver este fdsemana os dois homens que ocupam o vértice do aparelho de Estado em Portugal, PM e PR desenvolverem sistemas intelectuais de justificação que roçam o mais descarado populismo, ainda por cima à boleia dos deserdados da vida, daqueles que não têm casa, não têm emprego, não têm uma família, não têm amigos, enfim, estão entregues à sua sorte e aos pequenos esbulhos que vão fazendo nas esquinas da vida.
Ver Cavaco aterrar num casamento de ex-homeless foi como avistar um E.T. no Terreiro do Passo; ver Sócrates tentar convencer a sua genuína preocupação com os sem abrigo foi, apesar de ser um pouco mais sofisticado na argumentação, um exercício igualmente lamentável, porque se cada um de nós fosse um E.T. que aterrasse em Portugal ficaria convencido que existem políticas públicas consistentes dirigidas a essas camadas da população - que, em rigor, faz disso um sistema de vida, e muitos deles nada fazem para ingressar na vida activa e serem, de novo, agentes activos da sociedade e da economia, em suma, capturarem a sua condição de cidadãos plenos.
No fundo, um e outro, PM e PR recorrem ao populismo mais ou menos descarado para delimitar o terreno e marcar pontos junto das populações em contexto eleitoral. A esta luz o populismo consiste numa fé, num credo baseado na premissa segundo a qual o povo condensa a virtude esmagadora através das suas tradições colectivas, é o mesmo povo que está arredado das políticas de S. Bento e Belém.
É nestes momentos que os agentes políticos usam e abusam do populismo para demonstrar quão importante a pequena gente do povo e do campo - está ameaçada pela aliança do capital industrial e do capital financeiro, e quer Cavaco quer Sócrates tentaram - com as suas posturas face à pobreza em Portugal - fortalecer essa ideologia assente na supremacia da vontade do povo enquadrado pela relação directa entre esse mesmo povo e o líder. E como o poeta Alegre não tem esse estatuto, capacidade, autoridade e influência de ombrear com Cavaco essa jogada na actual partida de xadrez em que se tornou estas eleições presidenciais, foi o PM himself quem assumiu essas dores.
Mas Cavaco foi longe demais, pois não hesitou em ser um penetra num casamento para o qual não foi convidado, de gente humilde a quem ele nunca deu um tostão furado ou fez qualquer referência. E lá se apresentou, com uma lata tremenda, mais o seu chefe da casa civil, Liberato, que deambulava insignificante pela festarola como se tivesse roubado o queijo na dispensa aos seus irmãos mais pequenitos. Lampeiro, com o "queijinho dos votos" no bolso... Há imagens que valem por mil palavras!!!
Ante este cenário de subúrbio, dei comigo a pensar que lá estava cavaco entre os seus, como se também tivesse passado por igual experiência-de-rua, frequantador habitual da sopa-dos-pobres aos Anjos. Só que no Palácio Rosa - que coabita com Dona Maria. E é com estes "descamisados da vida" que se vai afirmando o populismo eleitoral, qual paixão moralista sem nenhum programa a sustentar as balelas que esses players cantam ao zé povinho apenas com o fito de lhes sequestrar o voto. E o povo alienado ainda acredita neles!!! No fundo, quer Cavaco quer Sócrates imputam esse apelo à força mobilizadora do povo para restaurar as forças socioeconómicas duma nação estourada - por eles próprios - que agora julgam poder recuperar através desse mito que é o povinho. Estas narrativas, este quadro de mentalidade e os raciocínios a que conduzem os portugueses, só traduzem uma coisa: o estado verdadeiramente doente e decadente a que os players políticos e as instituições no seu conjunto chegaram, porque até os materiais a que PR e PM recorrem para se digladiarem políticamente evocam aqueles sucateiros de Sacavém que pretendem vender as peças das viaturas sinistradas mais caras do que na origem.
Ao que chegou uma nação quase milenar com uma História épica feita com a gesta dos Descobrimentos. Tenho para mim que, se por um acaso do destino, engenheiria social da genética ou um milagre dos deuses, homens como Pedro Álvares Cabral, Vasco da Gama, Infante D. Henrique ou até mesmo Luíz Vaz cá regressassem e vissem quem (e como) hoje os políticos nacionais dirigem os destinos de Portugal, renunciariam aos seus feitos para que nunca estivessem associados a este "Portugal dos caninos".
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