quinta-feira

Júdice trucida Cavaco quando reflecte sobre o legado de Sá Carneiro

Cavaco "destruiu" o PSD de Sá Carneiro, aumentou o peso do Estado e foi autoritário. Público
Júdice descreve no livro o que falhou nas últimas três décadas (Nuno Ferreira Santos)
Ao longo dos últimos 30 anos, o pensamento político de Francisco Sá Carneiro desapareceu no PSD, apesar de as sucessivas lideranças invocarem constantemente o legado do fundador do partido. Mas terá sido nos governos de Cavaco Silva (1985/1995) que a mensagem política de Sá Carneiro foi completamente banida. Em 10 anos, assistiu-se à acentuada alteração da "matriz ideológica" do PSD, à "destruição do pensamento estratégico" do antigo primeiro-ministro da AD e à "mudança da natureza sociológica" do partido.
Um retrato muito pouco simpático de Cavaco Silva e do consulado cavaquista consta do livro O meu Sá Carneiro - Reflexões sobre o seu pensamento político (D. Quixote), do advogado José Miguel Júdice, que, à semelhança do que aconteceu nas últimas presidenciais, voltou a ser convidado para integrar a Comissão de Honra da recandidatura do Presidente da República. A obra chega às livrarias no fim-de-semana e será apresentada no dia 30, às 18h30, no El Corte Inglés, por Manuel Braga da Cruz, reitor da Universidade Católica.
Cavaco Silva, que "entrou na cena política como o verdadeiro herdeiro" de Sá Carneiro, "procurando assumir o seu estilo frontal e sem cedências", acabou por transformar o PSD num partido "feito à sua imagem e semelhança: um partido tecnocrático, um catch all party, ou seja, um partido sem fronteiras, onde todos poderiam vir plantar a sua tenda, desde que aceitassem a liderança indiscutida do então primeiro-ministro, e assim ajudassem a conquistar votos e a manter suseranias".
O livro, que também reproduz excertos de uma conferência dada por Júdice em 1981, quando se filiou no PSD, serviu para o autor reflectir sobre "o que falhou" nas últimas três décadas. E as falhas, que provocaram a "destruição do edifício" que Sá Carneiro tinha começado a construir, não são notórias apenas nos governos de Cavaco, mas também no Bloco Central, na governação de António Guterres e de Durão Barroso.
Contudo, Júdice dedica grande parte do capítulo A herança desbaratada a Cavaco, notando que, a partir de 85, as mudanças no PSD aproximaram-no do PS e dissiparam o legado de Sá Carneiro. Ao ponto de o PSD, nos dias de hoje, se apresentar como um partido "feudalizado, com militantes criados aos milhares para as trocas políticas". "Cavaco Silva fez um partido de consumidores e abdicou da bipolarização", afirma Júdice ao PÚBLICO, qualificando ainda o Presidente como "um grande político, que não é ideólogo, e que olha para a sociedade civil com uma certa suspeição". Entre 85 e 95, com duas maiorias absolutas, o então primeiro-ministro "aumentou o peso do Estado e apresentou-se como um líder autoritário, não permitindo a libertação da sociedade civil, como Sá Carneiro sempre defendera".
Ou seja, "desperdiçou" 10 anos: "Teve poder e tinha dinheiro a rodos. Se o Estado tivesse emagrecido, se ele tivesse alterado a lei laboral e libertasse a sociedade civil, hoje estaríamos melhor." "Com Cavaco teria podido ser diferente", lê-se no final do livro. Não foi.
Obs: Sempre apreciei mais o Júdice politólogo do que o Júdice-advogado, que apenas está onde está o dinheiro. Diz aqui toneladas de verdade acerca de cavaco e da sua perniciosa inBlockquotefluência na sociedade portuguesa. E só foi assim por causa dos milhões que afluiram a Portugal através dos Fundos Comunitários decorrente da nossa adesão à então C.E.E, em 1986. Cavaco é verdadeiramente o autor do monstro deste défice estatal, que depois os sucessivos governos PS e PSD agravarem, multiplicando institutos públicos, aumentado o sector empresarial do Estado para potenciar as clientelas políticas que, em momentos críticos, ajudam a ganhar eleições.
Veja-se a esse propósito as relações entre o então PM (1985/95) e Oliveira e Costa, e aqui foi pena que Júdice não tivesse dissertado mais e melhor. Talvez com receio de encontrar o que assustaria milhares de portugueses. Mas medite-se neste approach e, se possível, conheça-se o book deste super-advogado das múltiplas facetas socioprofissionais.
Nem que seja para prestar uma justa homenagem a Francisco Sá Carneiro - que foi completamente trucidado pela praxis cavaquista, e que excepcionando as estradas e pontes, com dinheiros da CEE, em nada mais valorizou a economia e a sociedades portuguesas.
Temos de agradecer a cavaco por ter sido o verdadeiro pai do monstro do défice do Leviatão que construíu e que depois outros agravaram.

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