domingo

Evocação de Fernando Pessoa e o seu "banqueiro anarquista"

É sempre útil recordar o imenso legado de Fernando Pessoa, o mais criativo poeta nacional de todos os tempos, alguém que compreendeu transversalmente a modernidade dos tempos, dos processos e o seu "Banqueiro Anarquista" representa essa espécie de conto metafísico que absorveu o autor e tem a vantagem de resumir hoje aspectos da nossa vida económica e financeira. Este regresso ao mix de praxis com o dever-ser da ética e da moral faz com que os nossos banqueiros sejam, hoje, pérolas do disfarce que procuram mitigar com inteligência, dissimulação e alguma lógica. Até que sobrevém o vazio das suas palavras, eis o que entendo após ler declarações de banqueiros do regime, nas suas máscaras mercantis e egocentricas que tentam ocultar o vazio que existe por detrás do dinheiro que os cerca. São pessoas que nunca chegam a conhecer o valor da amizade, dos amigos, dos homens, pois o cálculo do dinheiro atravessa sempre todas essas relações. Casam entre si, consolidam-se endogamicamente para aumentar a formação dos respectivos capitais, são meros comerciantes sem personalidade, ainda que tentem dar uma imagem pública de a ter, mas uma análise mais fina demonstra aquilo que verdadeiramente são: meros comerciantes com máscaras múltiplas que utilizam para cada momento. Ou melhor, a sua personalidade deve ser subordinada ao seu comércio, que está fatalmente condicionada ao seu mercado, e Pessoa, que era poeta, e publicitário nas horas vagas, topou bem estes cromos modernos que hoje funcionalizam boa parte da nossa vida económica, para o melhor e para o pior. Pessoa foi o maior banqueiro de todos os tempos, na medida em que a sua obra é hoje um activo, nunca nos criou dívida nem sacou comissões indevidas. Com ele alguns mestres do disfarce da alta finança em Portugal deveriam aprender algo, deixando cair as máscaras do costume que hoje qualquer observador atento e informado já topou à légua.

Etiquetas: ,