A miséria do mundo e o serviço público na blogosfera
"I"gnóbil
Em tempos referimos que certos espaços de análise da "boa" blogosfera, a que pensa, analisa e reflecte a realidade sociopolítica nacional e internacional de forma estruturada, é, pela sua regularidade, densidade, criatividade e inovação - um veículo prestador de serviço público à comunidade. Confesso que ao longo dos anos nunca vi o Jumento, um blog de referência em Portugal, ser difamatório ou injurioso para alguma pessoa ou instituição, embora lance farpas acutilantes aos agentes do poder, à oposição, ao empresariado e à globalidade dos actores sociais que integram o tecido conjuntivo da sociedade portuguesa. Há, ao que parece, quem se sinta visado por algumas análises alí expendidas, mas a sociedade portuguesa do séc. XIX, ao tempo de Eça, Ramalho, Antero, Camilo e muitos outros nomes da nossa cultura, salvas as devidas proporções, lançavam farpas à igreja, ao Estado, às polícias e às autoridades, enfim, produziam análise em função daquilo que entendiam ir mal na conjuntura. Pois é da crítica se faz luz sobre os problemas e desafios do nosso tempo, e essa dialéctica do Iluminismo, o sentido de Aufklarung - que redunda, no plano filosófico, no cinismo moderno que mitiga um pensamento realista com algum desapontamento ou desilusão ou desencantamento da vida. Aqui chegamos à miséria do mundo, pois quando se pretende que alguém que não é um profissional da palavra consiga dizer coisas - e muitas vezes fá-lo de forma extraordinária - que as pessoas que têm a palavra o tempo todo, não seriam capazes de pensar, torna-se necessário um trabalho analítico de assistência aos media tradicionais, compensando as suas imensas lacunas, e é assim que devem ser vistos espaços de análise como este que fazem, diáriamente, serviço público e que já granjearam uma clientela fixa que se fidelizou em função de certos valores, práticas e gostos. Parece que o jornal i reconheceu esse valor de serviço público, pois fez muito bem, colhendo aí informações e análises que só podem enriquecer os seus editoriais e artigos de opinião. Com a extraordinária vantagem de que os media tradicionais fazem sempre esses balanços com lucros, e, não raro, à custa daqueles que tiveram ideias e funcionam como lebres de jornais e jornalistas que depois seguem um filão para engrandecer a história que narram. Em face desta "caixa" sou de parecer que o jornal em questão ficou devedor do blog que cita, ou dito doutro modo: o autor ou autores do blog estão credores não só do jornal em causa como de todos aqueles que diáriamente lá vão beber informação de forma gratuita, e só nos fica bem, ao menos uma vez na vida, incluindo aqui a mediacracia que diáriamente parasita alguns blogues de referência, ficar gratos aqueles com quem aprendemos alguma coisa. Isto nenhuma relação tem com questões fiscais e outras que tais.
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