segunda-feira

António Vitorino fala-nos da "espanholização" da vida política portuguesa

António Vitorino salienta uma característica que, infelizmente, está a graçar na sociedade portuguesa dos nos nossos dias e parece que inundou o espaço público na razão inversa à qualidade das nossas elites, dos nossos dirigentes, dos nossos quadros superiores, enfim, do escol que dinamiza a roda dentada das esferas política, económica e social do país.
Ainda pensei que AV puxasse pelo limite do seu argumento e fizesse uma incursão por Richard Senet e nos falasse na Corrosão do carácter - como ilustração civilizacional da conflitualidade quase visceral que hoje detectamos no espaço público (na mico e na macro-política) - entre líderes partidários, parlamentares, dirigentes em geral cuja crispação se acentuou na sociedade portuguesa e parece agravar-se à medida que nos aproximamos dos dois actos eleitorais que faltam para perceber uma coisa: o falhanço do pseudo-projecto da actual comissão liquidatária da Lapa dirigida pela srª Ferreira leite. A isto soma-se o caldo cultural de caça às bruxas típico dos sem carácter que só estão na política por erro, engano e para azar do povo.
Acrimónia, azedume pessoal é a matéria-prima dessa espanholização e que, em parte, decorre duma liderança forte de Sócrates - por contraponto - a uma ausência de projecto, identidade, visão e estratégia por parte do maior partido da oposição, o psd. O que sobrou num lado, e notemos que Sócrates práticamente nunca perdeu nenhum debate parlamentar (sendo até o PM que mais tem ido prestar contas e ser fiscalizado pela oposição na casa da democracia) encontra o seu equivalente funcional no que faltou no outro, ou seja, a srª Ferreira é o paradigma do vazio na antecâmara da morte do pensamento político em Portugal. Que ideia ou projecto infra-estruturante se lhe conhece para Portugal?
A senhora apenas tem uma intenção: rasgar tudo. Afirma-se pela negativa, parece que apenas aproveita a reforma da Segurança Social - que viabilizou a sustentabilidade do sector no país.
Este gap alimenta aquela acrimonia e azedume pessoal e institucional, em boa parte explica a formulação de AV quando referiu que a sociedade política portuguesa atravessa esse efeito de espanholização.
Depois sobrevem o jogo das alianças em face de nenhum partido sózinho conseguir capturar a maioria absoluta, já que o psd e cds juntos podem, ainda que remotamente, formar uma maioria relativa - com a esquerda da esquerda a esfarrapar-se entre si (BE e PCP) para ver quem assume a 3ª posição no ranking partidário em Portugal.
Mas o que aqui é mais verosímel não será a possibilidade de psd + cds (que deram exemplo de má memória ao país no passado recente) formarem governo, mas sim determinar como se distribuirão os 20% de indecisos - cerca de 1 milhão de votos - entre os dois partidos do arco da governação. E enquanto não se perceber sociológicamente essa arrumação - as sondagens irão impôr a sua regra, ainda que muitas das suas previsões não seja confirmada pela realidade.
E em Lisboa - em que a direita vai coligada - como num jogo de soma Zero - a população poderá, por força da dinâmica de novas políticas públicas que o PS está a sistematizar no plano nacional, mormente na área social e económica, perceber que deverá fazer o seu voto útil no líder que melhor conhece a capital e que num esaço de tempo intercalar - dois anos - conseguiu arrumar a casa, pagar as dívidas e lançar os alicerces da mudança na capital, e isso é um crédito político imputado a António Costa.
Veremos, pois, como se desenrola esse efeito de arrastamento e as surpresas que o povo português nos tráz, mostrando, mais uma vez, que é capaz de duas coisas ao mesmo tempo: reduzir substancialmente a taxa de abstenção - indo votar massivamente; e que as opções de voto dos portugueses não se prestam a confusionismos, ainda que nas Europeias quisessem punir o governo por algumas políticas de saúde e de educação que mereciam mais e melhor atenção por parte do governo em funções.
Lisboa e Porto - por terem uma dimensão nacional poderão repercutir esse efeito de arrastamento nas autárquicas, e se partirmos de pressuposto que a srª Ferreira leite não sabe, não pode e não quer governar o país - o partido mais votado será, necessáriamente, o PS liderado por Sócrates - que determinará também um impulso a António Costa na capital, por isso é útil que este também não se demarque tanto do PM, porque além de contraproducente pode gerar azar.
E o azar em política é, hoje, mercê da crise, uma variável que espreita mais do que a sorte...