Evocação de Platão, Maquiavél e Bodin e o direito da mentira do Príncipe nas questões de Estado
Se é certo que o Príncipe - quem governa - tem o direito de enganar o súbdito, afirma-se com a mesma insistência que o súbdito não tem o direito de enganar o Príncipe. Até o grande Jean Bodin escreveu: Não se devem poupar nem as belas palavras nem as promessas: com efeito, neste caso, Platão e Xenofonte permitiam aos magistrados e aos governantes que mentissem, como se faz com as crianças e com os doentes. O mesmo fazia o sábio Péricles com os atenienses para os encaminhar pelas vias da razão. Isto em Portugal não carece de nenhuma demonstração especial, pois basta olhar, ver e ouvir as declarações do PGR - o sr. Pinto Monteiro - para perceber que a Justiça ainda é um flagelo mais dramático do que o desemprego. É óbvio que há prós e contras relativamente à mentira pública e à sua utilidade - sempre que certos valores e bens estão em causa, como parece ser aqueles que são questionados aquando da eminência de um ataque terrorista num país democrático. Este perigo, pela sua natureza e potencial destruidor, é, de per se, o sinal verde que nos deveria inspirar a todos, cidadãos de países democráticos, de que devemos defender o segredo de Estado - e não a publicidade dos seus actos como se duma escritura pública se tratasse. O Estado, como as pessoas e as famílias, têm o direito a ter e manter os respectivos segredos. Têm o direito a ocultá-los e a torná-los invisíveis a todos aqueles a quem essa informação não interessa. Essa omnividência e invisibilidade do Estado foi até recentemente (re)descoberta por M. Foucault na sua análise ao Panopticon de J. Bentham. Pois é precisamente assim que o Estado se deve comportar em relação a todas aquelas práticas terroristas cujo único propósito é destruir as pessoas e a civilização ocidental. Não se pode tomar chá com essa gente, salvo no quadro de negociações cujas condições sejam reciprocamente respeitadas, o que só muito raramente sucede. Os fundamentalistas, e por isso entendo que as posições kantianas sobre os direitos dos prisioneiros são demasiado perigosas (porque auto-destrutivas), têm que compreender que não se pode privilegiar os direitos do prisioneiro em detrimento dos direitos da sociedade que ele destruíu e cuja justiça jamais será reposta. E por vezes as democracias moles tendem a cair neste exagero - que tem como desvantagem abrir ainda mais o flanco dos ventres moles da sociedades democráticas contemporâneas aos ataques das redes terroristas que pululam do arco que vai de Marrocos até à Indonésia. Relevante não é que os prisioneiros de guerra - de Guantánamo ou de qualquer outro sítio - vejam os procedimentos e conheçam as práticas democráticas e decisionais das democracias que os vigia, relevante é que os terroristas - sobretudo nesta fase póst-11 de Setembro em que o mundo entrou com o novo ciclo político protagonizado por Barack Obama, saibam que há alguém que os vê - sem que estes saibam que estão a ser vigiados - e que a qualquer momento podem ser neutralizados. Razão acrescida para validar o segredo de Estado em detrimento da teoria da democracia aberta como método para revelar procedimentos internos e sensíveis entre Estados democráticos (e amigos) - como é o caso de Portugal e EUA. Por uma vez na vida, entendo, neste particular, que o Barroso, deve manter-se calado. Até porque quando fala nenhuma garantia temos que acerta.
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