O melhor testemunho politico de Meneses, apesar de esquizofrénico...
Foi escolhido para líder do PSD em eleições directas. Conseguiu um resultado sólido contra Marques Mendes. Mas enfrentou a oposição interna permanente dos "barões" do partido. Ao fim de sete meses conturbados decidiu bater com a porta. Regressa à Câmara Municipal de Gaia com vontade de se recandidatar a um quarto mandato. [in JN]
O que levou à sua demissão? Terão sido, como alguns dizem, as críticas que partiram de dentro, concretamente as de Ângelo Correia?
Quando cheguei à liderança, o PSD era um partido sem quadros políticos para promover ideias, era um partido falido, com um passivo de cerca de 15 milhões de euros...
Não é o passivo que Marques Mendes aponta...
Não é matéria para debate, é um facto. Vão ao Tribunal Constitucional e está lá. Por outro lado, era um partido sem capacidade de mobilização e que há mais de uma década não tinha produção programática. Ou seja, não tinha ideias para a governação. Em seis meses, tudo isso mudou. Criámos mais de uma dezena de grupos de trabalho para produzir ideias. Comigo, o partido iria passar, dentro de umas semanas, para uma nova sede na Avenida da Liberdade – agora já o posso dizer. Um espaço aberto aos cidadãos, que permitiria abandonar o “bunker” da Lapa. Seria um partido moderno e europeu. Já estava negociado.
Mesmo com o partido falido?
Vendíamos o edifício da Lapa exactamente pelo mesmo valor que nos custava a nova, já equipada. Até posso dizer quem era o comprador: a CPLP. Por outro lado, um partido com capacidade de combate. O PSD liderou uma matéria como a ratificação do Tratado de Lisboa, denunciámos a política de saúde, o falhanço da política de segurança e a política económica deste Governo. Também pedimos ao Governo para inverter as políticas fiscais, denunciámos o abandono do interior, questionámos o pacto de Justiça....
Essas são razões para ficar, não para se demitir...
Se existia um pensamento estratégico e consequente, por que é que o líder do partido vai embora? Porque nestes sete meses, se avançávamos com a proposta de isenção fiscal para o interior, éramos dizimados por causa das quotas; avançávamos com o Polis Social, éramos dizimados por termos contratado uma empresa de comunicação... valia tudo. A nossa mensagem para o exterior, debaixo desta barragem de uma oposição interna tremendista e de uma oposição militante da opinião publicada... Face a isto, o meu sentido de responsabilidade dizia-me: o partido e o país precisam de um choque que os faça cair na realidade. E esse choque já está a acontecer, já se pode começar a comparar o discurso, as ideias e a actuação do presidente cessante do PSD, com os que querem ser presidentes do PSD. Era expectável que se gerasse uma onda exuberante, entusiasta, quase fanatizada de apoiantes que levassem ao altar uma figura particularmente incontestada, amada pelo povo e pelos militantes. Não é isso que está a acontecer. A campanha é mole. A candidatura que alguns dos que me criticavam queriam eleger como tocada pela divindade arrasta-se de uma forma triste e cinzenta pelo país.
Mas as críticas de Ângelo Correia custaram-lhe ou não?
Dentro da campanha contra mim tive de tudo um pouco. Reparem que os que criticavam os regulamentos são os mesmos que agora coabitam com eles de uma forma tranquila – os mesmos que diziam que era preciso retirar o líder à bomba. O que é uma bomba é a falta de entusiasmo que essa candidatura está a suscitar entre os militantes. É uma candidatura ‘dejá vú’, que, a ser vencedora (no que eu não creio) iria fazer com que o José Sócrates tivesse um passeio. É alguém que foi responsável pelo pior dos três anos de Governo PSD-CDS, uma política económica fracassada, que conduziu a quase 7% de défice. Face ao tipo de ataques e críticas que eu sofri, nem Sá Carneiro, nem Cavaco Silva teriam chegado a primeiro-ministro. Ficou provado no último ano que é possível que alguém que é popular, que trabalha, que tem ideias, sair do país profundo e ganhar um grande partido em Portugal. Mas ainda não possível ganhar o país. Porque a ditadura dos interesses centralizados, a ditadura de uma aristocracia política, económica e cultural sediada nos corredores do centralismo não aceita que alguém que tem votos, que tem apoio do país real e que tem ideias, mas não almoça nem janta com essa aristocracia, tenha poder em Portugal.
E as críticas de Ângelo Correia?
Ângelo Correia foi um colaborador exemplar do primeiro ao último minuto. As declarações tranquilas que ele fez foram truncadas e utilizadas como se fosse um vendaval – essa matéria aliás não me fez perder um minuto, porque sabia da sua fidelidade.
Errou em algum momento?
Ninguém é perfeito. Teria feito uma ou outra coisa de forma diversa. Mas não julgo que essa tenha sido a questão essencial. A minha eleição nunca foi aceite por essa aristocracia. Faz-me lembrar aqueles três ou quatro meses em que o dr. Fernando Gomes foi ministro da Administração Interna e as pessoas eram assaltadas, violadas, esventradas! Era uma república africana nos seus piores momentos! Ele saiu e voltou o remanso habitual...
O que está a dizer é que quem controla os aparelhos partidários e o aparelho de Estado não gosta das pessoas do Norte? É isso?
Não, isso é um raciocínio simplista. Evidentemente que ser do Norte e de fazer vida política e social no Norte tem uma consequência: é não estar nos corredores onde está essa aristocracia. Mas se for alguém de Cascais, que também não frequente esse clientelismo do Bloco Central...
Apesar da campanha “mole” os elementos da sua direcção já dividem apoios entre Passos Coelho e Santana Lopes... Até há quem, da minha direcção, apoie Manuela Ferreira Leite – uma pessoa que era, por exemplo, contra o inquérito ao Banco de Portugal sobre o BCP... Já disse que alguém no partido lhe ligou pedindo que travasse essa investigação. Foi Manuela Ferreira Leite? Não… [pausa] Houve pessoas que me prometeram apoios e protecção se não avançasse com o inquérito, que era muito perigoso – porque ia colocar em causa algumas off-shores de algumas personalidades. Eu não cedi a essas pressões. Que pessoas foram? Não é crime fazer essas pressões. Mas é uma acusação política, a que está a fazer. É, em larga medida eu toquei nos interesses instalados. Para que fique mais claro, se não vai dizer quem foi... … até tiveram a imprudência de me mandar mensagens. Essas pessoas são as que Manuela Ferreira Leite representa nesta campanha interna? Inequivocamente. Já se percebeu que exclui uma das candidaturas, a de Manuela Ferreira Leite... A minha isenção tem limites. Como é que eu podia ser condescendente com uma candidatura que tem como porta-vozes pessoas que disseram que eu tinha que ser tirado do PSD à bomba? Só se eu fosse hipócrita e destituído de carácter... ...e, posso citá-lo, “a pessoa que foi responsável pelo pior de três anos do Governo” de Durão Barroso e Santana Lopes. Uma frase que nem quando foi candidato a líder usou. Agora estou mais à-vontade para a usar. Porquê só agora? Estou muito mais desprendido em relação à agenda, ao politicamente correcto. Eu não tenho nada de pessoal contra Manuela Ferreira Leite. Mas tivemos três anos de política económica que erigiram o défice como prioridade – isoladamente acho que era uma má prioridade – e o que concluímos é que foi um falhanço. Resultou em quase 7% de défice. E não venham dizer que foram Bagão Félix e Santana Lopes os responsáveis! Não foram? Por amor de Deus! Nem que ele pegasse, nesses seis meses, nas notas e deitasse pelas janelas. Aquilo com que Santana Lopes levou em cima foi com os resultados dessa política. O PSD anda a arrastar essa mágoa na oposição desde há três anos, de cada vez que fazemos oposição, levamos com ela na cabeça. Dividido nos apoios, o ‘menezismo’ alguma vez voltará a juntar-se? Andei 70 mil quilómetros pelo país, propostas políticas fiz várias. Não estou reformado. Não sei estar em part-time na política. Enquanto estiver no activo a nível local e regional, também estarei a nível nacional. O tempo é um bom conselheiro. Há quem aponte Pedro Passos Coelho como herdeiro do “menezismo”, sobretudo por causa dos apoios que tem recebido dos seus apoiantes mais próximos. Reconhece-lhe esse estatuto? Olhando para o partido vejo que a minha base social de apoio era maioritária e, se eu fosse agora candidato, teria porventura dois terços dos votos expressos. E a minha base de apoio está relativamente repartida entre as candidaturas de Passos Coelho e de Santana Lopes. Mas também vejo que uma parte da base de apoio de Marques Mendes está também repartida por estes dois candidatos, talvez mais virados para Passos Coelho. Nessa visão, quem sobra para Ferreira Leite? Eu acho que há possibilidade de Manuela Ferreira Leite ser a terceira mais votada. Acho sinceramente, ao contrário do que alguma Comunicação Social, que a quer levar ao colo. Espero que, mais uma vez, como aconteceu há nove meses, não consiga. Santana Lopes chegou a dizer que nunca se candidataria contra a sua vontade. Manifestou-lhe essa vontade? Ele disse que se eu não fosse candidato ele seria. “Não seria candidato contra a vontade de Menezes”, dizia ele. O que querem que eu responda? Queremos que nos diga se falou com ele antes de ele se apresentar... Conversei com ele, com Pedro Passos Coelho e até com Manuela Ferreira Leite, veja lá. Santana Lopes e Passos Coelho têm sido comedidos na apreciação do seu mandato. Aceita a crítica de que hoje os portugueses não ouvem o PSD? [Pausa] Acho que os portugueses ouvem, mas que não estão a gostar nada do que estão a ouvir. Se Rui Rio tivesse sido candidato a líder, teria sentido o impulso de se recandidatar? Não. Estaria assegurado que Santana Lopes e Passos Coelho ganhariam. Ferreira Leite foi uma boa ministra das Finanças? Uma má ministra das Finanças e uma péssima ministra da Educação. E Santana Lopes? Foi um bom primeiro-ministro? Foi um bom secretário de Estado da Cultura, foi um bom presidente de Câmara, na Figueira e em Lisboa, mas enquanto primeiro-ministro não tinha condições, à partida, face às circunstâncias políticas que encontrou. E líder parlamentar? Foi excelente. E leal? Sempre. A Pedro Passos Coelho faltará currículo? É um jovem quadro. Mas não tem propriamente 20 anos, tem quase a idade com que Kennedy foi presidente dos Estados Unidos. Há pessoas que têm juventude, que não têm experiência governativa e que chegam aos cargos e têm sucesso. Há muitos exemplos desse, felizmente, para não serem sempre os mesmos a ocupar os lugares. “Preferia que houvesse uma segunda volta” Ferreira Leite tem insistido na mensagem de que ela é, entre os candidatos, a mais credível como candidata a primeiro-ministro. Já percebemos que não é a sua perspectiva, queremos agora saber se Santana Lopes... Credibilidade é uma palavra que já me mete muita impressão... O que é preciso é ter ideias novas, diferentes. Se me disserem quais foram as ideias novas... Qual é a credibilidade dela? Os 7% de défice ou o falhanço no Ministério da Educação? Entre Ferreira Leite e Sócrates votava em quem? Em Manuela Ferreira Leite. Porque...? Porque sou diferente de Manuela Ferreira Leite, que quando lhe fizeram essa pergunta... Mas se ela foi uma má ministra das Finanças, uma péssima ministra da Educação, se não tem ideias... Vamo-nos entender: eu sou militante do PSD e nada me obriga a ser. Uma das minhas obrigações enquanto militante partidário é lutar pelos agentes do partido mesmo que não acredite neles. Quando considerar que não devo ter esse comportamento, devo sair do partido – nem que seja por uns meses. Eu não tenciono sair do partido. Santana Lopes teria, agora, condições para ser um bom primeiro-ministro? Acredito que qualquer um dos candidatos que considero eticamente irrepreensíveis terá condições para isso. Está a excluir Ferreira Leite... ... mas vou dizer-lhe mais: quem tanto criticou a legitimidade do líder que foi eleito com a maior votação de sempre no partido em 30 anos, não terá legitimidade para ser líder do PSD se tiver menos de 50% de votos. Mas se forem Santana Lopes ou Passos Coelho a serem eleitos com menos de 50% dos votos, terá essa legitimidade? Eu preferiria que houvesse uma segunda volta, como acontece no PS. Contudo, há uma relatividade política aqui: é que quem contestou este líder, quem disse que ele tinha de ser corrido à bomba quando teve quase 60% dos votos, por essa razão não tem legitimidade para exercer o cargo com 30% ou 40%. Acha que ainda há possibilidade do líder do PSD mudar antes das legislativas de 2009? Não serei eu a dizer que o líder tem que sair à bomba. Sintetizando: contesta uma candidatura, não apoia publicamente nenhuma das outras duas. Não teme que esteja a contribuir para que seja eleita precisamente a que contesta? Manuela Ferreira Leite só seria vencedora destas eleições se tivesse maioria absoluta. E a tal procissão, o tal andor, a tal vaga de fundo, não está a acontecer. Pelo que conheço do partido, prevejo que possa ficar em terceiro lugar. Isto porque Patinha Antão ainda não estará em condições, embora esteja a fazer uma grande campanha, de ficar à frente de Manuela Ferreira Leite. A verdade é que as sondagens que existem – Expresso e TVI – a colocam como a mais bem colocada para uma disputa eleitoral com José Sócrates. Sondagem à opinião pública. Mas quem vota? A opinião pública ou os militantes do PSD? Quem ganhar no PSD vai a votos no país. ...Mas mesmo na sondagem à opinião pública há uma grande falácia: numa sondagem num grande jornal nacional eu era primeiro, mas como não convinha que o fosse colocaram mais duas pessoas da minha área para aparecer em terceiro lugar. Esta manipulação primária da realidade só serve para enganar pacóvios. O que se deve exigir ao próximo líder do PSD? Que ganhe todas as eleições em 2009: que ganhe as europeias, que melhore o ‘score’ do PSD nas autárquicas, que ganhe as legislativas. Quando eu saí da liderança, o PS tinha perdido [nas sondagens] a maioria absoluta. Portanto, não me venham dizer que o objectivo é tirar a maioria absoluta ao PS – isso eu consegui quando cheguei à liderança. Se esse objectivo não for atingido, o líder deve demitir-se? Depende. Da forma como o combate for feito, do resultado relativo, da compaginação dos resultados das autárquicas com os das legislativas. E também de quem for o líder? Com Ferreira Leite a sua contemplação será menor? Eu prefiro um líder que do ponto de vista geracional possa ficar os quatro anos. Candidato a Gaia Admite voltar à liderança? Não é nada provável. Não é provável daqui a ano e meio? Não, não é nada provável que tenha esse desejo. Será candidato a deputado? Não, o meu empenhamento é no quadro autárquico. Para um quarto mandato em Gaia? Para um quarto mandato. Gostaria de levar a bom porto aquilo que será a cereja em cima do bolo – os grandes projectos privados que estão a ganhar força em Gaia, os grandes projectos públicos, as marinas, os grandes hotéis, a recuperação do centro histórico. Do ponto de vista político também quero que comparem os meus resultados eleitorais com os resultados de outros agentes políticos do partido. Por exemplo com Rui Rio? Por exemplo, porque não? A Câmara de Gaia pode vir a ser uma espécie de refúgio para relançar a sua carreira política? Não tenho essa perspectiva. Não tenho nenhum apetite para voltar a ter uma intervenção nacional. Entre as pessoas que se candidatam à sua sucessão, não há nenhum que tenha um discurso regionalista. Santana Lopes é claramente a favor da regionalização e Passos Coelho tem o compromisso saudável de fazer um referendo interno. Abrem a porta para que o PSD possa voltar a avocar essa bandeira. Eu bater-me-ei de forma intransigente nos próximos anos pelo avanço da regionalização. Imagina-se como líder de uma região? Essa antecipação de cenários não é saudável. Ficaria bastante feliz se ainda durante a minha vida política activa pudesse avançar-se para a institucionalização das regiões administrativas.
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