sexta-feira

ALERTAS - por António Vitorino -

O sublinhado é nosso.
António Vitorino
jurista
E de repente passamos a figurar no mapa. No mapa do terrorismo global, claro! A notícia foi-nos trazida pelo El País, que nos colocava a par da França e do Reino Unido como países alertados pelos serviços secretos espanhóis, na sequência da operação antiterrorista levada a cabo em Barcelona pelas força e serviços de segurança do país vizinho.
As primeiras reacções a esta notícia foram extremadas. Uns pretenderam desvalorizar o alerta, reafirmando a tese de que nada levava a crer que se verificasse uma alteração da avaliação de risco normalmente levada a cabo pelas autoridades competentes. Outros interpretaram a notícia sobre o alerta como só podendo significar a iminência de um atentado que tivesse o nosso país como alvo.
Estas reacções mostram como, para a luta antiterrorista, é importante gerir bem a política de comunicação e o seu impacto na sociedade.
Portugal tem a peculiar característica de, em sucessivas sondagens de opinião pública, surgir sempre nos cinco primeiros lugares entre os países cujos cidadãos receiam pessoalmente serem vítimas do terrorismo. Ora esta percepção é manifestamente desproporcionada em face de todas as análises de ameaça e risco do nosso país. Mas, curiosamente, a um tal grau de receio não correspondem as práticas colectivas mais expectáveis, designadamente em termos de denúncia às autoridades de factos ou situações que possam prefigurar um potencial perigo para a segurança e a ordem públicas. Dir-se-á que à elevada consciência do risco corresponde uma avaliação de bom senso quanto à sua efectiva probabilidade.
Este estado de espírito bipolar torna mais exigente a gestão da informação sobre a ameaça por parte das autoridades.
Como é óbvio, à luz dos dados disponíveis, tanto dos recolhidos internamente como dos que resultam da troca de informações internacional, nada justifica qualquer tipo de alarmismo. Mas a forma mais eficaz de evitar o alarmismo é tornar claro perante os cidadãos que, nestas matérias, as regras e procedimentos adoptados não envolvem facilitismo nem ocultação dos potenciais perigos.
A experiência destes últimos anos, sobretudo após o 11 de Setembro de 2001, mostra que é difícil encontrar o justo ponto de equilíbrio entre a informação divulgada que contribui para um adequado nível de consciência colectiva quanto à ameaça e o tratamento com discrição e reserva de potenciais ameaças sem provocar reacções de alarme ou de pânico.
Comparando os vários modelos de "gestão comunicacional de situações de crise" somos forçado a reconhecer que nenhum é perfeito.
Com efeito, durante alguns anos após o 11 de Setembro os EUA costumavam com frequência elevar o nível de prevenção face a possíveis atentados terroristas e disso dar amplo conhecimento público. Como - felizmente ! - a esses alertas acabou por não corresponder nenhum atentado e como, em relação aos atentados em preparação que foram desmantelados e de que foi dada notícia pública, os mesmos não foram em regra precedidos de alertas de segurança, a gestão desses alertas caiu numa certa rotina banalizadora, que depreciou a valia deste instrumento junto dos cidadãos em geral.
Outros países - a França, por exemplo - são bem mais parcimoniosos no uso público dos alertas de segurança, potenciando portanto os casos pontuais onde a elevação do nível de segurança é accionada e divulgada publicamente. Mas normalmente as autoridades francesas são também muito reservadas na divulgação pública de atentados neutralizados.
Já o Reino Unido, usando categorias mais latas de alerta e por períodos mais prolongados, adopta uma postura de manutenção no tempo da pressão securitária, de que resulta um ambiente geral que é integrado com assinalável normalidade na vida quotidiana da sociedade.
Depois do alerta dos serviços secretos espanhóis e do episódio da mochila abandonada numa estação de metro de Lisboa que foi detonada pelas forças policias, fica mais evidente que também entre nós importa clarificar os pressupostos da política de comunicação pública perante potenciais ameaças terroristas.

Obs: Publique-se esta interessante reflexão, sem pânico, e que pode fazer doutrina e valer na praxis da Intelligence nacional como guide-line daqui para a frente. Ou seja, aplica-se - mais ou menos reserva - nessa política geral de comunicação contra o terrorismo globalitário e desterritorializado?! Comparando com a actividade do sector financeiro, em que os clientes - por razões óbvias - apreciam o comedimento, é natural pensar que no plano da intelligence, a discrição é um sinal de eficácia e eficiência na coordenação das operações de prevenção, diagnóstico e levantamento dos riscos, ameaças e perigos.

Pois por vezes falar demais é sinalizar o flanco ao inimigo - que arrepia caminho e reconfigura operação em curso em tempo real; ser discreto em demasia implica ter a opinião pública à perna que reclama sempre mais e mais informação e o governo não lhe a dá.

Contudo, ambos os modelos, como alí foi sublinhado por AV, são imperfeitos, mas entre a "mostra da montra" e ter uma reunião no "quatro dos fundos" a opção política, pela natureza e força das coisas (visto que é sempre o valor da vida humana que urge salvaguardar), não deve deixar margem para dúvidas.

Nem quero imaginar como seria o tratamento destas questões sensíveis pela dupla-maravilha Meneses & Santana - caso ocupassem a cadeira de S. Bento, e os bitaites solicitados às Agências de comunicações dos Vaz & Associados sobre estas delicadas matérias de Estado.

Felicite-se António Vitorino por mais esta reflexão que, não obstante o perigo que encerra, é mais um contributo para a saúde e segurança da República ante essa nova metástase globalitária e suicidária que anda pelo mundo matando pessoas inocentes como método de fazer política.