segunda-feira

A Mentira na Política. Tributo a Hannah Arendt

O que poderá levar o actual presidente da Comissão Europeia dizer, hoje, numa entrevista à tsf reproduzida pelo dn que foi enganado por um catálogo de informações referentes à existência de armas nucleares no Iraque - que justificou a intervenção dos EUA naquele País que hoje está envolto em guerra civil, completamente destruído e polarizando mais insegurança do que em 2004/05 quando a questão se colocou?
Além de ter aberto caminho para aquela vergonha que foi meter o mundo a assistir em directo ao enforcamento de Saddam Hussein! para cruel já bastou o próprio Saddam, tratá-lo com semelhante critério demonstrou que não soubemos ser muito diferentes. Tudo se passou com a cumplicidade dos EUA, e alguns de nós ficámos a saber aquilo que já desconfiávamos: somos uns bárbaros.
Por que razão, volvidos todos estes anos, Barroso só agora admite ter sido enganado - quando na altura a própria Agência Internacional de Energia Atómica, institutos de RI, Think Thanks, grupos de reflexão, universidades, analistas de diversa origem, e muitas oposições por essa Europa fora alertaram para o facto de se estar a embarcar na paranóia de g.w.Bush coadjuvado pela Antónia Blair, o trapalhão Aznar (que hoje serve de saco de boxe a Hugo Chavez) e, claro, do mordomo-mor dos Açores que viabilizou a realização da Cimeira - que serviu de plataforma de guerra ao Iraque, colocou Barroso na Comissão Europeia e que redundou na guerra civil que todos conhecemos e no incremento do terrorismo global que também teve incidência no Iraque.
Será que Barroso não lia jornais, assumindo aquele velho tique trapalhão que Cavaco usava e abusava na década de 80 quando dizia à turba que não lia a imprensa?! Estava desfocado da realidade ou, hipótese, mais provável, tinha uma desmesurada ambição de poder - que contrastava com o cansaço da governação, agravado com uma Manela Ferreira leite obsecada pelo défice!? É óbvio, hoje, que Barroso havia pensado em tudo, especialmente em si, só os seus ministros se iludiram.
Esta questão, como aqui a temos tratado abundantemente à luz da perspectiva da filosofia política e da ciência política, implica que ninguém terá dúvidas de que a Verdade e a Política estão em bastante más relações, e ninguém, tanto quanto se saiba, contou alguma vez a boa fé no domínio das virtudes políticas. Ou seja, as mentiras foram sempre consideradas instrumentos necessários e legítimos, não apenas na profissão de político ou demagogo, mas também na de homem de Estado. Barroso, naturalmente, inscreve-se naquela categoria.
Porque será assim? Seja no âmbito da dignidade da esfera política, seja no âmbito da dignidade da boa fé? Foi a isto que Durão Barroso, obviamente, não respondeu - nem poderia responder na entrevista que deu aqueles órgãos de informação. Se o fizesse, Barroso suicidava-se políticamente, e ele não é parvo a esse ponto.
Por um lado, na linha de pensamento de Hannah Arendt, é da própria essência da Verdade ser impotente, por outro, é também da essência do Poder enganar. Verdade e Poder - são ambos vectores matreiros por natura.
Neste contexto valerá a pena recuperar Imanuel Kant - que explicou audaciosamente o problema - para sentenciar que a Justiça deve prevalecer mesmo que daí resulte o desaparecimento de toda a canalha do mundo!
Como os homens entendem que não vale a pena viver no mundo inteiramente desprovido de justiça, esse "direito humano deve ser considerado sagrado, sem ter em conta a quantidade de sacrifício exigido aos poderes... "
Numa palavra, aquilo que Zé das Fritas Durão barroso não explicou, também cognominado pelo "transmontano de Bruxelas" pela forma como, por vezes, gosta de assumir as suas origens transmontanas, confundiu ou revelou foi que os factos e os acontecimentos são coisas infinitamente mais frágeis que os axiomas, os princípios e as teorias. Mesmo as mais loucas produzidas pelo espírito humano no seu fuxo de estupidez (G.W.Bush) e desmesurada ambição de Poder (Durão barroso).
PS: Dedicamos esta reflexão à memória da pensadora Hannah Arendt, uma grande mestre do nosso tempo.