sábado

Ir ao Ikea num Sábado...

Nota prévia Ikeana: Há precisamente um ano escrevemos aqui esta reflexão sobre o Ikea, o novo centro de diversões diurnas dos lisboetas e arredores. Quem perder 5 min. a observar a conduta das pessoas (tem mesmo de ser, porque as pessoas são formigas, e há dias em que não conseguimos ver os produtos, pois estes transformam-se em pessoas) percebe que o Júlio de Matos e o Miguel Bombarda juntos são mais saudáveis e até inofensivos. Aquilo é uma tourada de mães, mães grávidas com os carrinhos dos bébés (convertidos em carrinhos-de-choque da Feira Popular mas com um toque bricolage), coxos, marrecos, cegos, gente normal, gente que pensa que é normal, classe A, B, C, D (juntamente com o alfabeto todo). Um jogo de espelhos com elas a tropeçar neles, depois o esquema inverte-se. Tinha uma lista de coisas para comprar. Comprei um copo que, por azar, se partiu. Acabei por sair como entrei, que nem uma pena e com vontade de dizer uma asneira a terminar em "X".
Sociedade-Ikea: suspensão da existência
Qual de nós já não foi ao Ikea, essa grande multinacional...já nem digo a nacionalidade com medo de não errar, porque isso muda à velocidade da lux. Ao longe parece uma grande fábrica de leilões de presuntos-gigantes, ao perto assemelha-se mais a uma multidão de turistas e de refugiados andando aleatóriamente como se tivessem saído de um ninho de cucos. Pois é, eu também lá fui comprar um caixote para arrumar livros. É quase preciso um doutoramento para perceber aqueles trajectos, não vão as pessoas girar em torno de si próprias. Mais do que a dona Branca, alí promete-se o paraíso na terra, e com todas aquelas embalagens ficamos drogados. Primeiro pela visão, depois pelo cheiro e lá damos com a embalagem que queremos. Delgadinhas, compridas, compactas, bem cheirosas... Depois não cabem no carro. Mas isso pouco importa, porque o limite é o céu.. O que interessa é que aquilo parece um estádio da Luz cheio de moscas numa frenética actividade sexual, doentia, com pessoas a mandarem-se literalmente para cima dos colchões, a esfregarem-se, a abrirem as pernas, a fazer convites aos namorados e maridos (dizendo: vem querido!!!) - alí - diante da malta toda - que parece não ligar - porque todos, afinal, fazem o mesmo, todos comungam da mesma pacotilha cultural e psico-comportamental. Talvez isto seja um exagero, mas aquele grande leilão de "presuntos" importados que nos ilude acaba por nos fragmentar, por nos dividir, ou seja, por nos converter (nós próprios) em mercadorias. Exactamente iguais aos taipais que sobem por aqueles tectos acima em direcção ao céu. Somos mais uma commodity padronizada igual a tantas porcas, parafusos, anilhas, cadeiras, sofás, colchões, garfos e outras girafas que por lá andam naquela passarelle labiríntica.
Mas, de facto, se as pessoas dispusessem de um autentico poder de escolha iriam alí parar??? Alí sentimos que todos estamos no mesmo barco, mas, ao mesmo tempo, sentimos que também somos completamente diferentes uns dos outros, de modo que aquilo é uma fábrica de presunto que satandardiza também as diferenças, embora sob a capa de que somos todos iguais. Mas o que me pareceu mais grave, e só por isto é que partilho aqui esta estorieta sem interesse nenhum, é que enquanto por lá vegetava deixei de saber quem era, perdi a identidade, senti que tomei as pílulas da alienação, "(desi)existencializei-me". Passou-me quando cheguei a casa, apesar dos taipais.., à semelhança da sociedade que temos. Portanto, empate 0-0...