terça-feira

A metafísica de Deus e a miséria do homem

Com a queda do dia vem o escuro da noite, e com ela ressaltam outras ideias, outros pensamentos, outras metas e outras físicas, portanto, outras metafísicas. Sócrates e as escandaleiras das Uni ficam para trás, pisadas no alcatrão do tempo, fundido em nada. Quanto aos telejornais só é bom ouvi-los com o som em of, lêem-se os gestos e percebo rápido de que falam os jornaleiros de serviço: uma desgraça.

Dissemos aqui que é o homem que dá sentido a Deus; se o homem não tivesse existido no acaso em que existiu, Deus seria um idiota a brincar com a criação. Deus também deixará de ter sentido quando morremos. De modo que morremos sem saber nada. Morremos envoltos no mistério. E é (também) este mistério que acaba por nos matar em vida. Talvez por isso alguns de nós sejam uns mortos vivos.... Apesar de ser, no mínimo, ridículo citar-me aqui a mim próprio. Que Deus me perdoe.., mas foi apenas para (re)enquadramento.

Vejo agora que um outro blog, Estes Momentos - teve a bondade de repegar no assunto e refutar assim as minhas etéreas ideias, demonstrando-me, at once, e com um denso fôlego de espiritualidade de Roma, que não deveria armar-me em Pre. Anselmo Borges - de trazer por casa - maltratando, assim, o original. E explicita:

Tenho sérias dúvidas quanto ao facto do “homem existir no acaso”. As questões metafísicas ultrapassam qualquer acaso. Apelamos a ele quando chegamos ao limite do entendimento. Justificamos o incompreensível com uma “teoria construída sobre o acaso”, que nos possibilita uma confortável panóplia de conceitos a que não chegamos por via racional. Não podemos conceptualizar Deus, da mesma forma que o fazemos com a ciência. “Morremos envoltos no mistério”, mas não creio que este mistério nos “mate em vida”. Os “mortos vivos” não são os que vivem o mistério de Deus, talvez sejam os que pretendem explicá-lo racionalmente. A busca contínua da racionalidade pode turvar uma das mais elevadas dimensões humanas: a espiritualidade.

De facto, que mais poderei dizer... Talvez rezar, ajoelhar-me, entrar na igreja Madredeus e editar um livro a seguir, ir a Roma e ir ao casino conversar com o Papa e, claro, nunca mais incorrer nas abordagens sólidas do Pre. A. Borges cujas reflexões no Dn, aliás, aqui vamos seguindo, sempre que possível.
Mas o que é facto é que, creio, é a qualidade do homem que conseguimos Ser que dá sentido a Deus; se não tivéssemos existido nunca saberíamos como teria sido toda a Criação, pois nem a Bíblia teria sido escrita; também desconhecemos qual o sentido de Deus post-mortem; e, até lá, andamos envoltos no mesmo mistério de sempre - combinando medo, fé e esperança, tudo muito toscamente olhando para o além como um boi olha para o Louvre ou o Samora Machel mirava a colecção de quadros da Gulbenkian no início da década de 80 do séc. XX. Depois morreu no avião. Soube-se depois que aos comandos desse avião não navegava "espiritualidade" suficiente... É tudo uma lástima. Foi nessa óptica que disse que somos uns mortos-vivos. E, de facto, somos apesar dos esforços que fazemos em contrário para adiar o Dia final..
Mas a autora do blog, a Paula Capaz, não acredita que o acaso se sobreponha à metafísica, e que os negócios de Deus e do imaterial só deverão ser pensados e estudados à luz duma dimensão maior do homem: a espiritualidade, pois aqui a ciência já não entra. D'accord...
Contudo, é uma constatação que não nos deixa margem para grandes progressos, pois mesmo com tanta "espiritualidade" continuamos envoltos no mistério de sempre, sem saber para onde vamos depois da morte e também não se chega à residência dessa tal "espiritualidade" de autocarro ou de mercedes; posso até presumir que ela seja um recta longa, difícil de alcançar.
Para ser curto e grosso: percebo bem para onde vai essa "espiritualidade" quando fazemos alguns funerais. Aí a espiritualidade deixa de falar, até o piu da reza perde - se alguma vez a teve.
Mas também para ser sensível e reflexivo: devíamos mudar a inscrição no templo grego de Delfos onde se diz: Conhece-te a ti mesmo do velhinho Sócrates - por uma outra expressão mais realista: Ama-te a ti mesmo...
Por uma razão simples: é o "amor", fundamento da espiritualidade, que precede o conhecimento, e não o inverso. Este argumento, pelo menos, dá-nos uma folga temporal para pensar durante uns minutos nesta inversão, e enquanto pensamos nela, não estamos preocupados para onde vamos depois da morte nem na 5ª dimensão da espiritualidade.
Talvez seja nesses breves instantes de raciocínio lento e de combustão arrastada que podemos conquistar o Paraíso, de preferência com as 13 virgens no além esperando por nós sentadas numa nuvem ainda não poluída.
Para "Elas" - , porque não somos egoístas, formulamos igual desejo, só que em lugar das 13 virgens metemos 7 Richard Gere e 6 Brad Pitt. Talvez assim o rácio da espiritualidade melhore um pouco e passemos todos a encarar melhor o futuro dessa 5ª dimensão que nos falta, em vida...