quinta-feira

À espera de domingo - por António Vitorino -

À espera de domingo António Vitorino
Jurista
Ao fazer 50 anos senti-me alivia- do: finalmente acabara a crise dos 40!
No domingo que vem, a União Europeia comemora o 50.º aniversário do Tratado de Roma, num ambiente onde não é seguro que consiga ultrapassar a crise dos 40, ou seja, num clima de incerteza quanto à superação do período de indefinição de rumo resultante da reprovação do tratado constitucional nos referendos francês e holandês de Maio e Junho de 2005.
O paradoxo da União é que parece mais popular fora das suas fronteiras do que dentro delas... Com efeito, quer como exemplo de integração regional quer como pólo de atracção de futuros potenciais membros, o projecto de integração europeia continua a aparecer, a quem o vê de fora, como um jogo de soma positiva em termos de consagração da paz, da prosperidade económica, da coesão social, da segurança e do equilíbrio nas relações internacionais. No fundo os mesmos valores que há 50 anos motivaram os "pais fundadores" e presidiram à celebração do Tratado em Roma, em 25 de Março de 1957.
Mas, paradoxalmente, a União parece suscitar menos entusiasmo junto dos que já cá estão dentro, seja nos países fundadores (os seis que estiveram em Roma há 50 anos), seja nos que sucessivamente foram entrando até aos 27 Estados membros actuais. Para estes, os 50 anos surgem mais como um referencial de habituação do que propriamente como um motivo de continuada e renovada paixão...
Uma sondagem recentemente divulgada pelo Financial Times (FT/Harris, publicada em 19 de Março) indicava que cresce o número dos que pensam que o seu país estava melhor antes de aderir do que depois da adesão à União Europeia (44%) entre os cidadãos da Inglaterra, França, Alemanha, Itália e Espanha...
Este resultado aparece em contraste com os números do Eurobarómetro, que normalmente é realizado duas vezes por ano (na Primavera e no Outono) pela Comissão Europeia, quer quanto ao total dos países da União quer quanto àqueles cinco em particular.
Mesmo assim, segundo aquela sondagem, nos mesmos cinco países apenas 22% acham hoje que o seu país estaria melhor se saíssem da União Europeia, contra 40% que pensam o contrário!
Isto significa que, para os inquiridos, permanecer vale a pena, ainda que sem grande entusiasmo ou em parte também porque o risco de sair acabaria por ser ainda maior do que permanecer no que já se conhece...
Em linha com o Eurobarómetro, as posições mais críticas em relação ao projecto europeu são assumidas pelos ingleses, mas mesmo entre estes há uma maioria que prefere ficar na União que tanto critica a optar pela porta de saída.
Chegados a este ponto, não podemos deixar de reconhecer que um saldo tão pouco motivador parece parco perante a magnitude das realizações obtidas nestes últimos 50 anos!
Serão então os europeus uns ingratos? Não creio.
As respostas que evidenciam algum desalento até podem ser tidas como fruto do sucesso destes 50 anos de integração.
Com efeito, a União aparece aos olhos dos europeus como dado adquirido, uma realidade natural em relação à qual não haverá que creditar os sucessos do passado.
A paz, o desenvolvimento económico, a coesão social, a segurança, são tudo elementos que representam uma espécie de "obrigação natural" do projecto de integração europeia. Desfrutam-se mas não se agradecem!
O que suscita ansiedade e desconfiança nos europeus são as expectativas para o futuro que eventualmente poderão não ser satisfeitas pela União, tal como ela hoje se apresenta e funciona.
Existe, pois, em menor grau, um desejo ou até um receio de um retrocesso ou de uma diluição suave do projecto europeu, mas mais uma dúvida funda que consiste em tentar saber se o modelo de sucesso que deu frutos nestes 50 anos ainda pode resultar para futuro no mundo globalizado em que vivemos.
Ou seja, se o projecto de prosperidade e de coesão social europeu ainda pode funcionar neste momento de profunda transformação à escala planetária.
A resposta a esta questão passa pela redefinição de um novo compromisso entre competitividade e emprego, entre prosperidade e solidariedade territorial e entre as gerações.
A Declaração de Berlim do próximo domingo não pode deixar de iluminar o caminho desta resposta inadiável.
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