terça-feira

Globalização, hibridização..: o que é nacional nos Estados?

Tou xim!!!!
Se formos alí ao Continente do nosso amigo Belmiro da Sonae e olharmos para uma prateleira de fruta descobrimos que nada alí é proveniente de um só país. E se pensarmos um pouco reparamos que o mundo está mesmo alí, não graças ao Belmiro mas em virtude dos múltiplos processos que consubstanciam a dita globalização. Tal significa que as pessoas já não têm de esperar pela época das frutas e vegetais para os poderem comprar, basta que tenham poder de compra.
Papaias, abacates, mangas, mangos, grelos, grelinhos, couves-de Bruxelas (tipo Durão Barroso), laranja espanhola, espanholas, brasileiras tudo alí pulula à espera de mão que leve aqueles produtos, mais ou menos gostosos, mais ou menos caros.
Aquilo é o bazar dos novos tempos em que cada um de nós encontra alí o que não supunha encontrar e, por vezes, leva o que não precisa. E não me refiro a alguém que vá comprar batatas ao hipermercado e venha de lá montado num Mercedes, reporto-me sim às necessidades artificialmente criadas pelo marketing e pela Pub. mais agressiva que faz com que as pessoas menos atentas comprem o que efectivamente não precisam. Sendo que muitos desses produtos foram cultivados e produzidos em mais de uma centena de países diferentes, é impressionante. De modo que quando se olha para a couve-de-Bruxelas, além de ser a carantonha de durão barros vê-se também a Assembleia Geral das Nações Unidas, dada aquela variedade de cores e de nacionalidades.
Toda esta lenga-lenga leva-nos à questão de partida: o que é que hoje é nacional no interior dos Estados? Pois tudo parece sofrer ou ter sofrido um processo de hibridização, um processo acelerado com a globalização. É assim nos produtos e também com as pessoas, o conhecimento, o dinheiro e as tecnologias. Tudo hoje no mercado global parece observar essa regra da hibridização, tudo tem uma componente sexual cruzada, mercê da combinação de diversos factores que interferiram naturalmente nas nossas vidas. As lealdades nacionais, as ligações religiosas, as solidariedades de género competem e conflituam nessa arena da hibridização. Nada é hoje genéticamente puro, tudo conheceu uma influência do exterior, tal como as frutas nas prateleiras do hipermercado.
Mas será isto bom ou mau? Melhor ou pior para todos nós, para a Humanidade? Nacionalismos e patrioteirismos pirosos à parte, creio que o balanço desta hibridização é francamente positivo, foi essa, aliás, a grande matriz inspiradora da gesta dos Descobrimentos iniciada pelos portugueses de quinhentos que só sabiam navegar à bolina, e sabiam que os ventos os poderiam levar, mas não sabiam bem para onde nem se tinham possibilidade de regressar, dada a enorme incerteza de previsão dos equipamentos nauticos e dos conhecimentos então disponíveis sobre o mapa-mundi. Ainda assim, zarparam alí de Belém... Ou eram loucos ou homens de muita coragem, ou um pouco de ambos, por isso ousaram..
Todavia, quando algo corre mal, da economia à sociedade passando pelo ambiente, a culpa é sempre da meretriz da globalização. Ela é pau para toda a obra, como diz o povo. A qual, no fundo, sempre existiu, embora em menor escala e intensidade, apenas hoje ela arca com todo o passivo do mundo que a esmaga. Será ela dirigível? Poderá a globalização assumir um rosto mais humano e desenvolvimentista? Será que a poderemos ver na tal prateleira do supermercado que, em rigor, é uma metáfora rica desse grande sociólogo inglês que é Anthony Giddens?
Seja como fôr, quando penso que pouco ou nada é já nacional, o argumento pouco pesa quando confrontado com as inúmeras portas que se abriram com a proliferação de nações e o crescimento das identidades étnicas e nacionalistas, incluindo aqui a dos povos indígenas, que ora podem reforçar laços com o exterior. Por outro lado, o balanço também se afigura positivo quando olhamos para o crescimento das comunidades não territoriais, como as solidariedades de classe, as solidariedades de género, de gays e lésbicas, de gestores, dentro e fora do PRACE, das solidariedades raciais, especialmente entre a raça negra e agora também entre a raça amarela, como os chineses que estão a colonizar África, sem armas de fogo.
De tudo isto resulta também um aumento da cultura cosmopolita e universalista, sobretudo se pensarmos em termos de campanhas humanitárias, do desenvolvimento para a cooperação, da preocupação da defesa e promoção dos direitos humanos, da salvaguarda com o ambiente no planeta. Enfim, há excepções a tudo isto: Cuba, Angola, Coreia do Norte, alguma África-útil que só pensa no ouro negro e nos diamantes e noutras matérias-primas estratégicas, alguma América-latina que continua anti-democrática e militarista resolvendo as coisas com a diplomacia da bastonada.
Seria uma pena que hoje quando cada um de nós vamos ao hipermercado comprar papaias ou couve-de-Bruxelas víssemos estampado nesse vegetal a cara do actual mordo-mor da Europa. Apesar de tudo, a hibridização da globalização metaforizada pela prateleira das frutas apresentada por Giddens (desconheço se ele sacou a metáfora de "alguém" que antes dele teorizou o conceito) - conhece mais vantagens do que desvantagens, até porque isso nos permite a todos termos mais mobilidade, mais diversidade de produtos e preços mais baixos. Mesmo que nada disso seja exclusivamente nacional.
Who cares???