quinta-feira

António Damásio, a consciência, a corrupção e a República

Não ouvi o que foi dito nos discursos presidenciais sobre o feridado da República, nem acredito que muito português se tenha perdido por aí. Mas já acredito mais no esforço intelectual de António Damásio que ontem foi virtuosamente recebido em Belém. É desse fragmento que ora damos sinal. E porquê (?), qual o verdadeiro peso da consciência em nossas vidas, mormente na esfera pública que mexe com os interesses de todos nós? Eis a questão. Algumas notas damasianas:
1. Desde logo, não se compreende a vida sem a sua ligação à consciência, seu armazém de afectos, razões e experiências;
2. Depois, é uma fonte de energia sem a qual a integridade dos nossos tecidos neuronais (e outros) sobrevivem;
3. Dela depende ainda a capacidade de construção de imagens, de metáforas com base nas quais geramos cenários, avaliamos propostas e escolhemos estratégias de acção públicas ;
4. São ainda auxiliares à concepção de planos de acção políticos, económicos, sociais, culturais futuros, na medida em que a capacidade transformadora das imagens é enorme, além de fonte de criatividade.
De facto, as acções - especialmente as ligadas à esfera política - estão ligadas à consciência, é através dessas imagens orientadores que os agentes políticos planificam, executam e controlam os dispositivos de maximização do bem comum. Mas isto já era comum noutras épocas, é certo. Então, qual a novidade do papel da consciência neste novo tempo??? Cremos, na linha do cientista A. Damásio, que a novidade reside precisamente na possibilidade da consciência se ligar ao tal santuário íntimo da regulação da própria vida, e a partir daí conceber e manipular novas imagens - que serão orientadores das políticas públicas e dos acontecimentos futuros.
Novidade essa que hoje se tornou vital dado os inputs gerados pela globalização económica, financeira, social e cultural que hoje cruza as linhas das nossas fronteiras físicas, virtuais e também neuronais que se alojam nas profundezas do nosso cérebro, em regiões do tronco cerebral e do hipotálamo - que nos permite relacionar os processos e as imagens evitando, desse modo, que façamos tanta borrada em Portugal. O que nos leva a supor que já há inúmeros os deputados, secretários de Estado, ministros e alta Administração que não têm nem hipotálamo nem tronco cerebral, e alguns nem coluna vertebral têm... São os fujões do sistema que integram uma nova categoria política a ser integrada na nova gramática política.
Daí a vantagem da criteriosa utilização da consciência num ambiente complexo e de mudança gerada pelas globalizações múltiplas que demandam as nações, as sociedades, as empresas, os Estados e as pessoas individualmente no curso das nossas acções e de manipulação da nossa vida interior.
Portanto, a consciência opera como o fiel de armazém contendo o conhecimento útil de que as imagens são guias estratégicos, seja na perspectiva do organismo biológico, seja na lógica de uma sociedade inteira - como Portugal. Se amanhã os 10 milhões de tugas resolverem levarem a sério o apelo do PR acerca da necessidade vital do combate à corrupção e consequente moralização da vida pública, não teremos quaisquer dúvidas em crer que construíremos todos um Portugal mais respirável, mais competitivo e também mais coeso e solidário.
Mas já que o sr. PR dá o mote nesse combate, como lhe compete, aliás, seria também curial que ele pensasse duas vezes antes de receber em Belém sujeitos com o curicula fiscal do sr. carrapatoso, que é um transfuga aos impostos em Portugal, no valor de 140 mil contos dando, desse modo, um péssimo exemplo em como a corrupção campeia em Portugal, ainda por cima é recebida em Belém com cortezia. Ainda que me tenham explicado, de forma meramente formal (que nunca atende às essências dos problemas) que quando se recebe não significa partilhar, embora em política, o grosso dos actos sejam simbólicos e o que parece é.
Temos, pois, de oferecer uns exemplares de manuais de introdução à política a alguns assessores dos jardins de Belém para completarem o 5º ano de Política, já sem o "U" do "ultramarino" porque o império já caíu, não vão eles... Porque, por vezes, certas explicações, além de serem canhestras são uma ofensa à inteligência humana. E podemos ser um país de gente pobre, mas nem sempre em todo o lado habita a estupidez. B. Spinoza tinha razão, ele disse na sua Ética que a consciência se dirigia em 1º lugar para a autopreservação mental da própria vida do organismo. Teoria equivalente promoveu o filósofo Thomas Hobbes quando referiu que a sobrevivência do Estado era a 1ª estaca nessa construção política e (do poder). Vectores só possíveis porque existe esse tal "armazém" de know-how que é a consciência.

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