segunda-feira

11 de Setembro, again: os pesadelos do Ocidente

Aparte o horror que foi reconhecer aquele trágico incidente na história da Humanidade - com tantas vidas perdidas de forma gratuita, pergunto-me como estaria hoje o Mundo em termos de Segurança vs Liberdade caso G.W.Bush não fose o atrasado mental que é, o aparelho político que o segue não fosse como é, e, por um conjunto de casos e acasos da própria História, como estaríamos todos hoje: com mais ou menos segurança? Com mais ou menos índices de modernização, estabilidade social e desenvolvimento humano..
Responder a isto é tão complexo quanto contigente, é mesmo fazer retro-história, e isso comporta erros e desvios que jamais nos dariam de all picture. O que é facto é que aquela fantasia trágica dos fundamentalistas islâmicos foi eficaz, realizou-se - ante os olhos atordoados do mundo e a impotência da América - que nada pôde fazer.
Nesse sentido, avulta a impotência da superpotência restante da Guerra Fria. Mas as imagens daquele horror ficaram gravadas a lazer na minha memória, e são hoje mais memorizáveis do que os takes gravados nos filmes de ficção. Só que aqui os há uma atenuante: actores não morrem... Parece até que a exibição daquela violência é tanto mais intensa do que uma confrontação nuclear entre os EUA ex-URSS ao tempo da Guerra Fria e do muro de Berlim cujos sinais e resquícios o PCP de jerónimo ainda hoje nos recorda - a avaliar pelos métodos canalhas, centralistas e moscovitas - que utilizou para afastar compulsivamente um seu autarca de Setúbal sob a impotência do PS e do PSD - partidos que pouco ou nada (quiseram) fazer para mudar as moscas, quiça porque sabam que eles próprios serão as próximas moscas. Também aqui a oposição andou mal, parece até ter estado à altura do PCP pouco ou nada distinguindo-se dele.
Mas o 11 de Setembro é dramático - pelas vidas de pessoas inocentes, milhares delas, mas também pelo espectáculo da violência que já não nos empurra para os sujeitos que foram objecto daquela violência medonha. O ataque bárbaro ao WTC representou esse deslizamento das representações da violência que ultrapassa em muito a ordem da própria ficção, inaugurando uma espécie de metamorfose subterrânea dos comportamentos colectivos gerando em nós, todos nós - que temos consciência e memória - uma grande imagem com efeito permanente que nos revela essa clivagem entre a realidade e a representação.
Será isto suficiente para gerar na humanidade um novo imaginário da violência? Cremos que sim, dado que depois do 11 de Setembro todos nós conseguimos cruzar essas linhas, associar esses níveis possíveis de violência. Hoje já nada é impossível. Nenhuma operação terrorista é não-factível. Tudo, portanto, é operacional, concretizável e com pequenos meios e baixos custos, basta determinação e algum trabalho de rede dentro do Rizoma. Em seguida até ficamos livres para afirmar que a arte do cinema é um anão diante tanta barbárie.
Creio mesmo que no plano mental, epistemológico, civilizacional os ataques de 11 de Setembro - pela espectacularidade e grandiosidade - operaram mudanças profundas na nossa cosmovisão e na natureza de compreensão com que, doravante, passamos a percepcionar os fenómenos sociais e políticos na contemporaneidade.
O 11 de Setembro, pela sua natureza, dimensão e efeitos não cabe em nenhum Manual de Instrução para Crimes Vulgares, antes ele alimenta a nossa imaginação de que toda e qualquer violência pode ser ao mesmo tempo pensada e executada, quase em tempo real. Por conseguinte, a violência deixou de estar apenas associada aos indivíduos violentos, ela é hoje um mal comum da humanidade com que temos de lidar: diáriamente, de hora a hora, de minuto a minuto, se estivermos a embarcar num aeroprto será de segundo a segundo. Por mim falo...
Isto é no plano da psicologia colectiva, e na esfera política? Vejamos, sumariamente, alguns factos:
  • 1. Os EUA ainda são governados por um mentecapto
  • 2. a Liberdade recuou ante o avanço progressivo da insegurança e da instabilidade
  • 3. O Iraque continua a explodir, com norte-americanos e indígenas lá dentro
  • 4. O Irão emerge como uma super-potência regional querendo assumir o papel de Estado-director na área.
  • 5. Os pesadelos da Humanidade devem ter-se multiplicado, sobretudo por parte dos familiares daqueles que perderam a vida bárbaramente e alguns até mostaram a sua bravura no vôo93
  • 6. A polarização do capitalismo mundial em lugar de criar pontes entre os povos gera ainda mais desigualdades que separa e contrapõe o Norte do Sul, o Ocidente do Oriente do Mundo
  • 7. A hegemonia (unilateral) norte-americana sobre o mercado global e nos planos financeiro, político e cultural, tecnológico e informativo e até institucional gera um efeito múltiplo de ressentimento ainda maior no Oriente, logo o terrorismo está para durar
  • 8. O american way of life pode estar a provovar danos nos projectos societários dos países do Velho Continente
  • 9. A não resolução de problemas da Palestina vs Israel são absolutamente cruciais para essa distenção, mas os EUA aqui comportam-se como aquele elefante dentro duma loja de porcelanas, em vez de equilibrar mais o prato da balança para o lado palestiniano que tem todo o direiro a instituir o seu Estado na Palestina - região do mundo para onde confluem as três religiões monoteísta do livro - comporta-se como a avestruz diante do leão
  • 10. Depois, a tradicional arrogância da Ilha-Continente ou da República Imperial com um dia Raymond Aron lhe chamou, uma arrogância e soberba assente na ignorância e na soberba acicatada pela sua fatal teimosia e mania de superioridade sobre as outras civilizações, sobretudo islâmicas - é o molotov no bolo criando um caldo de explosividade ainda maior.
Estes são, sem carácter exaustivo, alguns dos dramas actuais que em vez de distenderem o clima de paz e guerra entre as nações, só conduz os espíritos à intensificação da sua criminalização - em que hoje todos os projectos sociais alternativos podem estar à mercê de um ataque ou missão suícida.
E é contra este risco, esta imprevisibilidade que entendo que o Ocidente - independentemente da vontade, meios e visão dos EUA - deverão ter uma palavra a dizer. Até porque, será bom não esquecer, a América foi uma filha do Velho Continente que cresceu muito depressa, e isso, tal como nas pessoas, é mau. Faz até lembrar aqueles crianças que têm a cabeça tão grande que depois não conseguem andar...
  • Duas notas finais:
Este texto é dedicado à memória daqueles homens e mulheres que perderam a vida naqueles ataques bárbaros - bem como aos seus familiares que guardam essa dôr de forma mais intensa.
  • A questão para o anão político que é G.W.Bush é a seguinte: o que pensa que sucederá aos movimentos progressistas e radicais do Terceiro Mundo que hoje se manifestam cada vez mais impacientes, e que de Porto Alegre a Kabul, desenhando um arco terrível, parece já emergir uma solidariedade Afro-Asiatico-Latino/Americana contra os EUA e a Europa por tabela - que vai a reboque...por não dispôr dumas forças armadas verdadeiramente alternativas e credíveis ao Tio Sam. E dentro deste cenário - o que é que o sr. Bush pensará, se é que ele pensa algo, das próprias forças progressistas árabes e muçulmanas - que são, na prática, as primeiras vítimas dos islamitas mais fundamentalistas...