sexta-feira

Umberto Eco e os livros: uma ajuda à ministra da Cultura

É sabido que sem conceitos e sem capacidade de abstracção não vamos a lado nenhum: ficamos no lobi do mundo sensível mas não entramos no tesouro do mundo inteligível. Ficamos num impasse; é como estarmos dentro do armazém do conhecimento mas não sabermos ler. Somos inutilizados. Contudo, a TV e Net fizeram uma revolução mas não fazem milagres. Estes estão reservados ao futuro mais modesto dos livros, de que os (verdadeiros) estudiosos nunca se apartam. Para eles a Net é um acessório, um veículo, uma espécie de bibliografia em trânsito que dantes encontrávamos nos diccionários. Mas não podemos dispensar os livros, como diz o mestre dos mestres - Umberto Eco: Se me ligar à Net e procurar o programa Gutenberg, posso obter a obra completa de Shakespeare. Mas por que razão encher o meu computador com uma data de bits (...) e a seguir esperar duas semanas que a impressora mo imprima, quando por 5 dólares (...) posso comprar a edição da Penguin?" in Le Notizie Sono Troppe: Imparate a Decimarle, 19996. Bom, isto foi há dez anos, então as impressoras ainda eram a vapor, hoje são mais tipo TGV (invisível). O problema é que com o preço de um tinteiro compram-se dois livros...
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Hoje a ministra da Cultura tropeçou num daqueles presentes que estão na Rua Ferreira Borges. Mas os presentes dos caninos contornam-se sempre. daí que a tarefa mor seja a de procurar seduzir os portugueses para a leitura. É preciso motivá-los, e a TV produz imagens mas apaga conceitos atrofiando, assim, a nossa capacidade de abstracção e com ela toda a capacidade de compreender. Como se faz esse regresso à leitura e aos livros? Marcelo, Zaramago, Figo são 3 maus exemplos: o 1º só passa os livros dos amigos e conhecidos mas que nem por isso têm qualidade; o 2º não passa, só se vende a si próprio numa conversão forçada e alucinatória do marxismo ao turbocapitalismo; e Figo quando abra a boca é para mutilar a língua de Luís Vaz. De modo que o melhor é equacionar esse regresso aos livros com estímulos inteligentes às famílias, às escolas e às instituições da sociedade civil que influem - directa ou indirectamente - nesse estímulo à leitura. As televisões também poderiam dar uma boa ajuda através de programas inteligentes e apelativos. Talvez nos intervalos dos jogos de futebol... salte uma poesia de Alberto Caeiro, Ricardo Reis ou mesmo do Pessoa nessa assembleia de heterónimos que ele comporta. São sempre as palavras que explicam aquilo que as imagens mostram. Mas só depois das imagens serem explicadas é que elas assumem significado para o mundo, até lá não passam de imagens que integram o tal lobi do mundo sensível. Reduzir o preço dos livros e, se possível, oferecer os clássicos da literatura portuguesa (Camões, Vieira, Eça e Pessoa) à porta das discotecas - poderia ser uma terapia de choque e ajudar a virar o panorama dos jovens neste capítulo. Levar o Pessoa para a Kapital poderia ser uma ideia genial - por entre vodkas e "viskis".. Afinal, estava tudo em casa... Os tempos é que mudaram, mas as bebedeiras são sempre as mesmas, as figuras tristes também. Enfim, um bom prenúncio... Agora, e uma vez que há dinheiro, só é necessário que o ministério da Cultura em articulação com a sociedade articulem objectivos e meios para pôr em prática um conjunto de medidas simples que poderão fazer de nós os amantes ideais para os livros. Estes ao menos não nos traem...