terça-feira

A função do analista: à procura do mundo..

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O emaranhado de loucura que campeia nestas eleições obrigou-nos a ir ao baú importar mais uma reflexão que espero seja útil. Fizémo-lo como quem não quer perder o mapa da estrada e pretende recuperar do inconsciente para o consciente níveis e elos duma percepção que só vale enquanto se compreende o tecido conjuntivo do que está em jogo. De que nos serve percebermos as cores que estão no tapete se não compreendemos toda a tapeçaria em que a vida se transformou. Eis a minha modesta pretensão, o meu mais sincero contributo para ver essa tal clareira no meio do Oceano.
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  • A função do analista: à procura do mundo..
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  • A sua função é, cada vez mais, a de recobrir todo o tipo de proximidades e interacções possíveis do mundo físico ou imaginário, entre identidades e sistemas que são, permanentemente, atravessados uns pelos outros. Hoje, todos os elementos desterritorializam outros fazendo-nos percorrer um trajecto labiríntico: da política à economia, da sociedade à cultura e ao ambiente.
  • Ele opera, essencialmente, com três tipos de categorias: o sistema de ideias, o sistema de dispositivos e o sistema de comportamentos sociais. E a partir daí, tomando por referência um determinado facto ou fenómeno, estabelece uma articulação lógica e uma narrativa racional a fim de enquadrar, compreender e explicitar a globalidade do objecto que deu lhe origem.
  • Por exemplo, se o analista quiser equacionar a correlação da democracia ocidental e a questão do petróleo no quadro da dependência energética ocidental – deverá fazê-lo acompanhado da rede de interacções que esses vectores suscitam. Ou seja, num quadro de co-evolução. Assim, para ilustrar o exemplo, poderá enquadrar a crise da democracia ocidental por referência à crise endógena da Europa e ao efeito cumulativo das decisões políticas (erradas) do passado e dos dispositivos associados que depois modificaram os pressupostos de sustentabilidade. Poderá, de seguida, invocar a globalização competitiva como aquele decisor oculto que muda a natureza das coisas, alterando as próprias condições de regulação e dos efeitos de atracção de capitais com mobilidade estratégica necessários à potenciação dos indicadores de produtividade e de crescimento duma sociedade.
  • E, em terceiro lugar, pontilhando a rede argumentativa, enquadrar o vector do terrorismo islâmico presente no efeito de perturbação do funcionamento de sociedades complexas (abundantes), como as ocidentais, hoje consideradas uma espécie de ventre mole infiltradas por correntes migratórias doutras partes do mundo que não partilham dos nossos valores personalistas.
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  • Desta interacção o analista poderá identificar a tal rede de interacções influentes evidenciando vários factores: 1) a agudização da crise da democracia Ocidental resulta da acentuação da crise endógena da Europa por efeito da desvalorização dos poderes (intervencionistas) do Estado; 2) a articulação dessa crise democrática é potenciada com a intensificação do expansionismo migratório (de pessoas, capitais e tecnologias) que pode conduzir ao efeito (explosivo) de ressentimento ideológico que, regra geral, encontra solução no terrorismo em rede; 3) por fim, a cadeia argumentativa pode ainda invocar que a crise democrática, a complexidade gerada pela globalização competitiva e o terrorismo islâmico, remetem os factos para um risco (cumulativo) fragmentador do processo de globalização (via modernização e desenvolvimento) na escala mundial, como forma de contestar (e até combater) a subordinação definitiva da área cultural islâmica resultante da difusão mundial dos valores do Euromundo (iniciado com a era gâmica dos Descobrimentos), que sofreu um inesperado e terrível abalo com o 11 de Setembro, nos EUA, e com o 11 de Março, em Espanha.
  • É da articulação de todos esses eixos do problema que se dá ao leitor a configuração do problema da ordem mundial impedindo, desse modo, que cada vector fale por si na sua densidade crítica que, agora, emerge em contexto co-evolutivo.
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  • Naturalmente, o que se ganha em pormenor, nas análises conjunturais, perde-se em compreensão sistémica em que os pormenores se inserem – quando se pretende ter the all picture; quando se consegue uma visão de conjunto, perde-se nos detalhes. Regra geral, os media privilegiam análises conjunturais, relativizando as questões estratégicas do tempo longo (F. Braudel) cujas estruturas comportam as possibilidades de futuro dos comportamentos sociais.
  • Estes três sistemas: ideias, dispositivos e os comportamentos sociais representam, afinal, o esquema analítico (interactivo) que permite ao leitor ler as interacções na malha do tempo. Por outras palavras, o analista contemporâneo tem de estar preparado para estabelecer sempre novas conexões e codificações dos fenómenos sociais e políticos do seu tempo. Basta que consiga ler tudo aquilo que coloca num texto, quer numa relação manifesta, quer numa relação secreta ou oculta – na ligação com outros textos.
  • Assim, pela intertextualidade o analista faz corresponder os factos entre dois ou mais textos; pela metatextualidade liga um texto a outro sem necessariamente o citar; pela hipertextualidade une um texto do presente (o hipertexto) a um texto do passado (o hipotexto); e pela arquitextualidade agrupa um conjunto de categorias (de tipo discursivo ou de enunciação de problemas) que relevam de cada texto singular.
  • Afinal, o analista deverá reflectir a lógica horizontal (como um rizoma) e tomar o mundo nas suas mãos e fazê-lo rodar lentamente ante as lentes do leitor, que se sentirá esclarecido sobre tudo o que vê em cada um dos continentes, e acenar em concordância silenciosa.
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  • Texto extraído do nosso livro - Em Busca da Globalização Feliz - Análise e Reflexão Política, Hugin edit., 2005, págs. 139-141.
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