domingo

O realismo mágico de Vitor Constâncio e os seus anos de solidão

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A MENTIRA É UMA REINTERPRETAÇÃO INTERESSADA DA VERDADE.

Nos últimos anos em Portugal, a vida económica e financeira e até política está pejada de exemplos de gestores, administradores, agentes políticos que mentem descaradamente.

Fazem-no porque corromperam e foram corrompidos, para enriquecer à custa da economia, da finança e da actividade política, ou de todas em simultâneo. Os casos são conhecidos, mas a Justiça, porque também está amputada nos seus poderes e deveres, não consegue tocar nesses intocáveis. O escândalo do ex-BES e de Ricardo Salgado foi demasiado grande para ficar guardado, envolveu o próprio regime de Abril criado em 1974, e penalizou milhares de pessoas e de empresas, por isso teve de ser conhecido, mas o seu mentor passeia-se nas ruas de Lisboa como quem vai a Roma ver o Papa.

Os ex-politicos do cavaquismo, como Dias loureiro, Oliveira e Costa e muitos outros também andam por aí como se fossem uns peregrinos a Santiago de Compostela. Nuns e noutros casos, é o sentimento de impunidade que campeia, o que dá a firme convicção ao povo que a justiça não é cega, como tal é inútil, incapaz, lenta, cara e só serve para executar os bens do Zé Povinho quando não pagam as dívidas contraídas aos bancos para liquidar empréstimos para compra de casa. Casas essas que depois acabam por ir parar às mãos dos usuários prestamistas, ou seja, os bancos. 

Além de muitas insuficiências, o peso da memória (selectiva) torna-se aqui numa mola fundamental que explica a crise de regime em que nos encontramos. Vejamos alguns exemplos dessa vergonhosa e milionária falta de memória, ou de vergonha: Zeinal Bava vai ao Parlamento e diz que não se lembra dos actos de gestão ruinosa cometidos para ajudar Ricardo Salgado a destruir a PT; Henrique Garganeiro fez o mesmo, mas de forma menos explícita. Agora, alguns gestores da TAP dizem-se enganados pelos accionistas privados... neste teatro da gestão das empresas públicas financiadas pelo Estado. 

Inúmeros administradores do banco público, a CGD, também não se lembram das suas acções ao viabilizarem empréstimos ruinosos para empresas e empresários que conseguiram obter milhões de €uros de dinheiros públicos para comprar acções de bancos que, entretanto, se desvalorizaram e, com isso, delapidaram recursos públicos que nunca mais seram resgatados e devolvidos ao Estado. 

Todos estes casos, que cruzam a banca, a política e os negócios são conhecidos entre nós. Envolvem um ex-PM, cavaquistas, pessoas do PS, do CDS e até já do BE houve casos de especulação imobiliária, o escandaloso caso Robles, que levou à sua demissão do BE. Do PCP também são já conhecidos casos menos claros na autarquia de Loures...

Os alegados crimes em causa são sempre os mesmos: corrupção activa e passiva, participação económica em negócio, peculato, branqueamento de capitais, tráfico de influências, etc... Todavia, em todos eles há uma exploração da memória para, quando aqueles arguidos são inquiridos, negarem o seu envolvimento em tais actos criminosos que delapidaram recursos públicos e ajudaram a destruir a economia e a minar a coesão social e moral entre os portugueses, que vivem cada vez com maior carga e assimetria fiscal, económica, regional, etc.

A memória é, pois, esse dispositivo gigante que é capaz de terraplanar os factos, as relações e contar apenas o que interessa a cada momento contar. Ou seja, alguém que pode ter tido uma conduta verdadeiramente delapidadora dos recursos públicos, num dado momento, pode invocar anos depois que, apesar de tudo, teve a conduta mais zelosa de sempre, falando em probidade e grandes serviços prestados à causa pública. 

Na prática, é o viés sentimental e das emoções, distorcidos pelo peso da memória (natural e selectiva) que acaba por imprimir uma "nova verdade" sobre os factos do passado que verdadeiramente importa negligenciar ou distorcer. 
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A memória, como no livro de Gabriel García Márques, Cem Anos de solidão, concede o direito de nos movimentarmos pelo labirinto do passado, misturando a realidade com a ficção sem gerar consternação em terceiros. Por vezes, ou muitas vezes os "artistas do meio económico, financeiro e político" servem-se dessa espécie de "realismo mágico" para recriar contextos e atmosferas novos, quiça dando a entender que o tempo estava tão húmido que era possível aos peixes entrarem pelas portas do Banco de Portugal e darem ordens ao supervisor bancário para autorizar operações de financiamento verdadeiramente delapidadoras do interesse público. 
Contâncio é, hoje, um inegável seguidor do escritor colombiano e adepto confesso do chamado realismo mágico. 



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