terça-feira

Um regresso a Maquiavel: de como as coisas são e não o que aparentam ser...

Quantas vezes, senão todas, precisamos de ver ou que nos digam a verdade efectiva das coisas e não as suas aparências ou versões idílicas da verdade nua e crua. Assim, arredamos falsas expectativas, enganos e erros e muitas dissimulações. 

Esta preferência da verdade às aparências encontra particular relevância nas coisas do Estado, por ser aí que se jogam os grandes desafios colectivos e se questiona o bem comum ou se define e redefine o chamado interesse geral duma colectividade, de um Estado. 

Para prosseguir esse caminho, segundo Maquiavel, o homem tem de conhecer a história e recordar o que os homens do passado fizeram e daí extrair as conclusões. Perceber que resultados tiveram, ou seja, se tiveram sucesso nas suas empresas ou se falharam e somaram fracassos. 

Ora, em política só sabemos se uma acção é boa ou má, quando se conhecem os seus resultados. São estes, e não as suas intenções, que determinam a eficácia duma acção. Significa isto que o valor das acções não se avalia pelas suas intenções, mas pelos seus resultados, que consequências tiveram para uma dada sociedade. 

Certos aspectos da política portuguesa deviam ser mais e melhor conhecidos, ou seja, em caso de conflito entre actores políticos, urge sempre conhecer que motivações e intenções se escondem por detrás das acções políticas, uma vez que todas essas acções são dinamizadas por um desejo (ou ambição) dos actores políticos. Seja por acção ou omissão, existem sempre motivações ocultas na acção política que importa serem conhecidas. 
Imaginemos que ocorre um furto de medicamentos num laboratório que faz investigação e utiliza tecnologia de ponta para produzir os seus fármacos. Importa aqui conhecer a que lógica os roubos estiveram sujeitos e com que finalidade. O mesmo se diga de um furto de armas e munições duma base militar... 
Ninguém furta medicamentos ou armas apenas pelo simples prazer de fazer desaparecer esses bens, os quais podem servir a paz e o desenvolvimento do homem, ou, à contrário, podem fomentar a discórdia entre os homens numa comunidade e fomentar a guerra civil ou entre Estados. 
Nuns casos, compete ao homem público, ao decisor, mormente se estiver em perigo a paz entre as instituições e a descoberta da verdade num domínio sensível da vida pública, como a Segurança e Defesa, ser leão e raposa ao mesmo tempo. Ou seja, ser leão para mostrar a força e o ímpeto de fazer funcionar as instituições, especialmente a Justiça - que tem sido uma grande tartaruga entre nós; e a raposa, para evitar cair numa armadilha, ou em várias. 

Cumpre ao mesmo decisor político ser ambos, leão e raposa na gestão diária das coisas e dos negócios do Estado, sob pena de ser fraco e de cair nas armadilhas que outros homens e outras instituições lhes lançam. 
Todavia, o decisor político não pode ser leão o tempo todo, nem raposa a tempo inteiro, porquanto só a força ou só a manha ou a esperteza conduzirão a bons resultados. 
Se aplicarmos esta elaboração conceptual, de raiz maquiavélica, ao lamentável caso de Tancos, que tem quase dois anos e do qual pouco se sabe, facilmente se conclui que à cúpula do Estado, ou seja, ao Presidente da República e ao Primeiro-Ministro - o que se espera deles ou se lhes pede - é que sejam ambos leões e raposas em nome da defesa e do interesse do Estado. No fundo, pede-se-lhes que sejam virtuosos, líderes que actuem no tempo mais conveniente. 
Perante isto, os portugueses podem e devem perguntar à cúpula do Estado se tiveram, no momento adequado, o ímpeto do leão, e sem deixar de serem prudentes, na busca dos objectivos do Estado? 
E os factores e instituições que deles não depende (acaso ou sorte), como a Justiça (MP, Polícia Judiciária - Civil e Militar, etc) andaram bem, mal ou assim-assim? 
Em suma: Portugal e os portugueses parecem hoje estar sitiados pela descoberta duma verdade que teima em não aparecer, ou porque ela não quer aparecer porque a Justiça ainda não produziu as provas suficientes para revelar a verdade efectiva dos factos; ou porque existem forças cujo interesse consiste em ocultar aquelas provas e, consequentemente, adiar ou desvirtuar a verdade. 
Também aqui quem hoje ocupa a cúpula do Estado, o PR e o PM, tem de gozar da fortuna, ou seja, da sorte que conduza a um bom destino, nem que seja para explicar aos portugueses que inúmeros são os factores da vida que não podem ser controlados, pois tratam-se de infortúnios e de imponderáveis que nem o empenhamento conjunto daqueles, PR e PM, poderiam alguma vez esclarecer e/ou resolver. 

Se assim for, para esta impotência e desnorte não conhecerão os portugueses tamanha frustração. 
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