sexta-feira

O comissário

O empresário Pedro Queiroz Pereira foi ontem à comissão parlamentar de inquérito ao BES/GES e acrescentou uma informação relevante. Disse ele: o Banco Espírito Santo foi, desde o início, um projeto construído sobre dívida e mais dívida, já que o capital dos investidores era escasso para a escala ambicionada. Os últimos anos, os anos da crise financeira mundial, expuseram esta fragilidade inicial, que a má gestão - e talvez mais... - agravou numa descontrolada fuga para a frente que tinha nas empresas do GES um formidável sorvedouro de recursos. A partir de certa altura, deixou de ser possível alimentar este carrossel. Não só o mercado de dívida secou como deixou de ser possível ocultar os buracos cada vez mais fundos. A pressão fiscalizadora do Banco de Portugal - estimulada pelo BCE - fechou de vez as saídas aos Espírito Santo e ao líder, Ricardo Salgado, obrigando-os a encarar a realidade. Não havia mais dinheiro nem tolerância dos reguladores - nem sequer apoio do governo - para tapar os esquemas, e foi isso que fez desabar o grupo inteiro em seis meses. O que Salgado e Ricciardi fizeram na terça-feira não foi explicar este percurso sinuoso. Cada um à sua maneira confirmou o que já saíra nos jornais. Isto é, contaram o que aconteceu desde outubro de 2013 até agosto de 2014 e como cada um deles geriu a crise e procurou salvar a pele quando já tudo ardia. Mas não é neste período que serão descobertos os eventuais crimes financeiros. Será preciso recuar no tempo, verificar negócio a negócio, operação a operação, para então, sim, apanhar o enredo ou parte dele. As próximas audições deveriam, portanto, ser mais específicas, mais técnicas, deveriam ser uma autópsia financeira. Talvez o famoso commissaire aux comptes seja a faca capaz de descascar a cebola. Os deputados que se preparem para o interrogar com datas e números bem estudados. Até os silêncios podem ser reveladores. O resto fica para os tribunais aprofundarem.

por André macedo

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