sábado

Primeiras Jornadas para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial do Alentejo - Alandroal




As cidades são cada vez mais pólos de cruzamento de gerações e de mentalidades, espíritos e lugares que se alimentam e retroalimentam do seu imaginário. O património cultural, por sua vez, é o cenário onde decorre a produção desse imaginário, no qual se projecta o futuro construído e desejado pelas sociedades. Mas para que esse futuro desejado seja construído urge priorizar certas tarefas, adaptar certos valores, aplicar certas políticas públicas. É desse carrefour de influências e tendências que se recupera património (material e imaterial), monumental ou relacionado com tradições, valores e costumes (orais e outros) que conferem singularidade a uma região, a uma cidade, a um valor cultural que o distingue dos demais do mesmo género em todo o mundo. 

A esta luz, as nossas terras de origem deixam de ser os locais onde foram sepultados os nossos progenitores, e passam a configurar os sítios onde podemos lançar as raízes do presente e as sementes para gizar o futuro próximo. Creio que foi sempre assim, ainda que não tenhamos grande consciência disso. Os media planetários que permitem a circulação da informação em tempo real dão-nos, hoje, a sensação de que tudo foi diferente na vitrine global do tempo tríbulo em que vivemos. 

Neste contexto, o Alandroal não é diferente dos demais locais, pois busca a sua identidade, a forma de a reconstruir e pretende saber que ajudas privadas e institucionais pode contar para se desenvolver sem, contudo, perder singularidade. O turismo (lato senso) - gastronomia, património cultural - material e imaterial - e outras modalidades de afirmação identitária da região - servirão para afinar estratégias e medidas para reforçar esse conceito estafado que é o desenvolvimento sustentável (que remonta ao Relatório Bruntland dos 80´s). O qual seria suposto estancar a migração de pessoas para o litoral e o encerramento de pequenas unidades empresariais que tendem a fechar em resultado da recessão que o país atravessa. 

Entre os vendedores de sonhos, que tudo convertem à mera mercantilização da cultura que, por desconhecerem a dinâmica histórica e social, tudo tendem a embrulhar em meros pacotes e roteiros turísticos; e os mais prudentes que entendem que o desenvolvimento sustentável se afirma com base num modelo de desenvolvimento mais seguro e complexo assente na atracção de IDE para as regiões do interior do país - há que tirar a bissetriz de ambas e concluir que o modelo de desenvolvimento do Portugal profundo não se faz apenas a vender pacotes de turismo que, pela natureza das coisas, remete para uma oferta sazonal e não fixa de forma permanente as pessoas ao território, como seria desejável.

Seja como for, o paradigma vertido no Património Cultural Imaterial/PCI, que alguns descobrem agora como se fosse a panaceia para a resolução de todos os problemas e males do rectângulo, é uma eficiente plataforma para se discutir ideias e organizar estratégias para construir e reconstruir as nossas identidades regionais, ou seja, determinarmos aquilo que desejamos ser no futuro fazendo com que a imagem que desejamos fixar para nós próprios não seja muito distante daquele que os outros, no estrangeiro, possam fazer de nós. 

Neste contexto foi particularmente interessante a intervenção da historiadora Ana Paula Amendoeira, agora com redobradas responsabilidades na Dir. Regional de Cultura do Alentejo, cujo currículo tem a vantagem de contar com a experiência no âmbito do ICOMOS (Cons. Internacional dos Monumentos e Sítios em Portugal) - que poderá ajudar a recriar aquele imaginário que fará o futuro das nossas sociedades num devir próximo e em linha com o padrão desenvolvimentista que todos desejamos. 

O risco neste tipo de tarefas complexas é julgar, como fazem alguns com fraca formação histórica e sociológica, que as identidades dos povos podem ser manipuladas, matizadas e formatadas através de um roteiro turístico como quem está a vender coletes de salvação a quem sabe que se está a afogar. 



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