sábado

A Queda dum Anjo: Paulo Portas - o primeiro ministro oficioso e a sua reforma de Estado "borda d´água"


A grande reforma, porventura a única, que este figurante da vida pública poderia fazer ao país, seria compreender que a sua demissão do governo no verão passado - tão intempestiva quanto irrevogável, fez o erário público perder milhões de euros para especuladores sem vergonha. E com esse dinheiro muitos programas de estímulo às PMEs se poderiam lançar, tornando a economia mais competitiva. Isso é que seria a grande reforma perdida que só a gula e a soberba política dum homem que nunca ganhou uma eleição legislativa em Portugal deveria saber compreender.


Partindo da reflexão sobre o estado da Administração Pública portuguesa, o "guião" de Reforma do Estado do dr. Paulo Portas deveria reflectir um conjunto de propostas sérias sobre os caminhos de mudança, a partir duma nova filosofia de gestão, na qual se inspirariam recomendações úteis e medidas concretas. E não, como se viu, um ataque dissimulado ao Estado social, ao TC e à CRP, como é apanágio do primeiro-ministro oficioso do Estado português, e espetar uma lança no conjunto das administrações, reforçando o esbulho progressivo aos salários dos funcionários públicos e aos pensionistas, que têm sido o elo mais fraco desta carnificina fiscal orquestrada entre S. Bento, a São Caetano à Lapa e o Largo do Caldas. Tudo com a conivência de lesa-pátria de Belém, que não quer perturbações históricas, nem sublevações políticas neste seu final de reinado podre em que Cavaco Silva deixou cair a presidência.

Além de cilindrar o sistema de educação pública, que agora pretende concessionar  aos professores, pretender extinguir o TC, desmantelar todas as funções económicas e sociais do Estado-social existentes, da educação à saúde - quiça até recriar uma nova justiça privada (ou privativa) - tudo "grandes reformas" que o primeiro-ministro oficioso do XIX Governo [in]Constitucional levaria a cabo, se o deixassem. 

Até os Correios, uma das melhores empresas públicas este Estado pretende vender aos privados, a bom preço e sem regras claras e transparentes, de modo a que a empresa possa ir parar às mãos certas, dos empresários certos e, claro, ao preço certo. 

Portas, visto como um homem inteligente e estruturado deu, através daquele amontoado de ideias-feitas acerca duma reforma de Estado que não passa duma tentativa de justificação do poder, o exemplo acabado de que não é uma coisa nem outra. Nesse sentido, é, como se diz no post infra, a queda dum mito. O mito do jornalista autor das manchetes de 6ª feira no Indy - que faziam tremer os ministros do cavaquismo de há 20 anos. Cavaquismo que acabou por ruir sob influência do referido semanário. 

Portas não apresentou uma única quantificação dos objectivos propostos em cada uma das áreas ou sectores do Estado que se propunha reformar. Apresentou doses cavalares de semântica, com aqueles trocadinhos da rua da Madalena que já não ludibriam ninguém. E por não ter exposto um quadro, um gráfico, uma só projecção dele disseram, creio que do lado do BE, que o primeiro ministro oficioso não sabe mexer no computador, et por cause cozeu aquela manta de retalhos com base em artigos de imprensa. Podia, ao menos, nem que fosse para disfarçar, pedir conselho ao Valadares Tavares ou, no limite, frequentar um daqueles cursos rápidos de 48 horas no INA...

Mas não. O dr. Portas pensa que por causa da recessão, cuja semântica o seu "soldadinho" (leal e) de chumbo designa "milagre" - são as regras constitucionais que se têm que dobrar aos seus desmandos e incompetência na aplicação do memorando, esfaqueado vezes sem conta - observando a regra de roubar aos pobres para dar aos ricos - que, afinal, se traduziu em mais e mais e austeridade e pobreza no ciclo infernal em que caímos. 

O primeiro-ministro oficioso nem sequer teve o cuidado de apresentar um estudo, uma referência, demonstrar que sabe distinguir a política da administração. Não. O dr. Portas é, afinal, e tão só um jornalista que tem umas noções de economia e de finanças, que os advogados que o rodeiam lhe transmitem nos intervalos dos recortes dos artigos de jornal que serviram de base aquela sopa da pedra melhorista do Estado, com total atropelo da teoria da organização weberiana. 

A esta luz, o dr. Portas é a versão do Estado "melhorista" do Camilo Lourenço, esse grande expert em direito económico.

O melhor que resulta daquela manta de retalhos saída do Largo do Caldas, e que demorou mais de um ano a fazer,  foi, precisamente, aquilo que ele não disse, mas que de alguma forma esteve ligado às práticas políticas do governo de José Sócrates. 

A recuperação do Simplex - através da desburocratização do Estado e a facilitação da vida às empresas - espelha bem o plágio em que o primeiro ministro oficioso incorreu. 

Em suma: se o CDS não vale sociologicamente mais do que 6 ou 7% das intenções de voto, e se aquele guião não conseguiu inspirar uma única reforma do Estado séria - posto que se alicerçou na obsessão anti-estatista e no desejo privatizador típico dos anos 80, ideológicamente balizado pelas regras do Consenso de Washington, então será caso para perguntar por que razão o primeiro ministro oficial, Passos Coelho, delegou no seu primeiro ministro oficioso, Portas, essa tarefa?!

A resposta parece clara: Passos, que desconhece quase tudo nos meandros da média e alta administração do Estado, pediu ajuda a Portas, julgando que este - pelo mito de saber que carregava aos ombros - o poderia ajudar, ajudando também Portugal e os portugueses. 

Enganaram-se rotundamente. Mas o mais grave é que também enganaram os portugueses que hoje pagam caro esse experimentalismo político saído dos laboratórios incompletos do Largo do Caldas e da São Caetano à Lapa. 


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