Sócrates e o sonho de Marcelo - por João Marcelino -
1. O Plano de Estabilidade e Crescimento, que será hoje aprovado por um Conselho de Ministros especial antes de ser submetido aos parceiros sociais, e a céu aberto à oposição, é um documento essencial para os próximos anos e também para a definição do ambiente político. dn
Através das opções que nele tomar, o Governo vai provar se tem coragem para traçar linhas sérias de combate ao défice e ao endividamento do País, que passa por pedir sacrifícios às pessoas, e mostrar se é, ou não, um Executivo de centro- -esquerda, o que se faz pedindo sacrifícios que não só às mesmas pessoas de sempre.
José Sócrates, todos os dias contestado pelo vício provado de não conseguir resistir ao que dizem dele e do que faz, tem aqui uma excelente oportunidade para entrar num novo ciclo. Nele teria de deixar de se preocupar com a comunicação social e de se concentrar naquilo que o País lhe mandou fazer: governar. Os votos não lhe foram confiados há pouco mais de quatro meses para se entreter com jornais e jornalistas. Teve-os porque muitos portugueses entenderam ser ele, entre os candidatos que se apresentaram, o mais capaz para enfrentar os problemas económicos e financeiros, combater o desemprego, modernizar a nossa sociedade.
Nada disso está a verificar-se. Pouco tempo passado já existe de novo a dúvida - sempre oriunda de factos marginais aos grandes problemas das pessoas e assente em eventuais defeitos de carácter - sobre se Sócrates será capaz, se terá condições, para cumprir esse mandato.
Quanto mais tempo o primeiro-ministro perder com este carnaval em que teve, e tem, uma quota de responsabilidade, mais poderá criar as condições para eleições antecipadas.
2. A possibilidade dessas eleições (antecipadas), já se sabia, iria sempre marginar a discussão eleitoral do PSD. Com ou sem vontade, com ou sem convicção, os três candidatos não fugiram ao inevitável numa semana em que Aguiar se mostrou agressivo, Rangel surpreendido e Passos com mais tempo de preparação.
O mais interessante no PSD, no entanto, é verificar esta realidade: ainda há pessoas no partido que não desistiram de tentar levar Marcelo Rebelo de Sousa à presidência através de um golpe de mágica. Alberto João Jardim apela à desistência de todos para que se estenda a passadeira ao professor. Santana Lopes, no semanário Sol, fala dele como "o melhor candidato".
Está dado o mote para o congresso extraordinário. Há quem acredite ser possível convencer Aguiar-Branco e Rangel a saírem de cena (os dois ao mesmo tempo para que nenhum ficasse a rir-se…), deixando Marcelo defrontar Passos Coelho, e correndo o risco, apesar de tudo, de uma derrota.
Assentemos nisto: pela sua experiência, Marcelo Rebelo de Sousa seria, no entender do País, com certeza melhor candidato a primeiro-ministro que qualquer um dos seus três jovens companheiros. O pior é que não se chega a São Bento sem passar pela presidência do partido - e aí convém recordar que o PSD tem razão de queixa de Marcelo, que em tempos abdicou da liderança depois de desfeita uma aliança com Paulo Portas.
Portanto… Marcelo pode estar tentado a descer à Terra de novo, mas não é certo que mesmo que o milagre se desse se lhe abrissem as portas da vitória. O frentismo contra Passos Coelho pode gerar movimentos inesperados. E antes ainda seria preciso que Rangel e Aguiar-Branco estivessem disponíveis para confessarem que estiveram a abrir terreno. Não me parece, mas aguardemos pelo tal congresso de Santana. (...)
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