quarta-feira

Ora bolas Cavaco! - Editorial do Jumento -

O argumento mais utilizado em seu favor por Cavaco Silva durante a campanha eleitoral foi o de que graças aos seus conhecimentos e experiência em economia poderia dar uma ajuda preciosa ao país. Com este argumento inteligente Cavaco Silva deixava para trás um Mário Soares conhecido por ser pouco dado aos dossiers da economia e um Manuel Alegre mais vocacionado para bater certo com o fim da prosa. O argumento era tão forte que Cavaco usou-o em todas as oportunidades, até fazia parecer que se estava a oferecer para consultor de José Sócrates.
Deus fez-lhe a vontade e o seu mandato foi brindado com uma das maiores crises económicas de que o mundo tem memória, uma excelente oportunidade para Cavaco Silva dar a tão prometida ajuda. Mas o que diz Cavaco? Que não pode dar nada.
É evidente que quando Cavaco prometia ajuda não lhe passava pela cabeça que iria estar perante um daqueles desafios que tornam os políticos grandes da mesma forma que os podem reduzir à sua pequena dimensão, estaria mais a pensar naquilo a que no mundo da bola se conhece por "bitaites". Mas a vida tem destas coisas e no dia em que deveria estar a celebrar três anos de mandato foi obrigado a dizer a um grupo de trabalhadores que não lhes podia dar nada. Não pode dar nem pode ajudar quem tem poderes para fazê-lo, a verdade é que os vastos conhecimentos de economia de Cavaco Silva terão sido mais úteis em tempos de vacas gordas do que se estão a revelar perante uma crise grave.
Ora, se os vastos conhecimentos e experiência de política económica não estão a ser de grande valia, restaria a Cavaco Silva fazer aquilo que se espera de um Presidente da República, ele próprio percebeu-o e fez mais uma declaração nesse sentido. Só que nem todos têm a memória assim tão curta e recordam-se do ambiente de intriga promovido durante meses por “assessores” anónimos de Belém, começaram com a escolha de Manuela Ferreira Leite e só pararam quando exageraram e obrigara Cavaco Silva a emitir um comunicado desmentindo as notícias que corriam. Todos se lembram das intervenções de Manuela Ferreira Leite antecipando declarações do próprio Cavaco Silva.
Entre as promessas de Cavaco que ultrapassavam as suas próprias competências e o exercício das atribuições que a Constituição lhe confere, resta esperar que Cavaco Silva se concentre na Presidência, significando isso que não ultrapassa as suas competências e não as exerce através de assessores intriguistas e anónimos.
Obs: De facto, a experiência acumulada ao longo de 10 anos sentado no cadeirão de S. Bento pouco valem hoje, ante uma crise sistémica (porque múltipla - financeira, económica, social e ambiental), que começou na alta finança (assente nas contabilidades criativas e na ganância dos gestores, CEOs e accionistas) e acabou por escavacar a economia e a sociedade. Primeiro na América, depois na Europa.
Percebe-se isso quando só ao fim de três anos de mandato Cavaco resolve assumir o papel de embaixador económico que deveria ter logo assumido no primeiro ou segundo ano de mandato. Ao terceiro foi para a Alemanha supondo que iria desbloquear o impasse trágico em que mergulhou a Qimonda e veio de lá de mãos a abanar. Entrada de leão, saída de sendeiro...
Agora, no Roteiro pela Inclusão e combate à Pobreza, na linha de reflexões que aqui demoradamente escrevemos 2ª e 3ªfeiras, vimos um Cavaco denunciando duas coisas:
  • 1. Que já anda em campanha eleitoral junto de velhos, novos, empregados e muitos desempregados e nem as criancinhas escapam à beijoca e à graçola fácil e saloia.
  • 2. E um Cavaco cuja frase mais sonante e deprimente, também na linha do que defendemos aqui na 2ªfeira, foi: Eu não tenho nada para Vos dizer...

Portanto, quando no slogan supra se diz - Sei que Portugal pode vencer - mais uma vez, lamentavelmente, o projecto colectivo dos portugueses não encaixa nos objectivos pessoais e políticos de Cavaco - que já interiorizou a ideia de que a crise económica e social que graça hoje em Portugal pode, paradoxalmente, ajudar na sua reeleição para Belém. Mesmo que Belém pouco ou nada faça para melhorar a vida dos portugueses.

Cavaco tem-se limitado a dar eco das cartas que lhe chegam à secretaria do Palácio Rosa, como se o PR fosse uma espécie de notário dos pobres ou o banco alimentar da Junqueira.

Ainda que Cavaco, como temos constatado, os únicos contributos que tem dado para atrair Investimento Directo Estrangeiro, foi a sua viagem à Alemanha que se saldou num fiasco, um psicodrama em torno da questão do Estatuto dos Açores cujo braço-de-ferro se saldou na sua pior (e mais humilhante) derrota política de sempre, conferir um estatuto de porta-voz não autorizado ao ventríloquo Ferreira leite (sua ex-pupila), e certificar o grande poeta de Coimbra (não, não é Alegre!!! desta vez é Manuel Joaquim Dias Loureiro que até Fado canta) de que está imune a qualquer tipo de vírus financeiro e que, por isso, pode continuar grande e leal Conselheiro de Estado.

Voilá, o legado de Cavaco nestes três anos de mandato ao estilo de Américo de Tomás. Só já falta dizer que esta é a 1ª vez desde a última que eu cá estive..., seguida de um Yes, we can... com sotaque do Sul.

Cavaco fez isto tudo pelo seu querido Portugal. E onde se diz "Portugal pode vencer", melhor fora, porque mais realista, se dissesse: Comigo, com ou sem experiência, quero fazer um 2º mandato, só depois me reformo."
Confesso que tenho algumas saudades do tempo em que Cavaco dizia: deixem-me trabalhar...
E na altura, até falava verdade. Hoje as pessoas que acreditam nele devem ser as mesmas que acreditam no poeta-deputado Manuel Alegre: poucas...