quinta-feira

O absurdo na sociedade, na política e na religião em Portugal

Vai mas é trabalhar, ó....
A vida pública portuguesa foi colonizada por um conjunto de condutas e declarações que "não lembram o careca", demonstram que algo vai mal na mente colectiva. E o mais grave é que tais declarações ocorrem num momento em que a economia perdeu o seu capital maior: a confiança e os mercados retraem-se; as finanças foram abaladas pela disfuncionalidade do sistema bancário; a sociedade tende a ver fragmentada a sua coesão com o aumento das injustiças; e a política, "armazém" para onde converge todas as pulsões, tensões e conflitos - quando deveria serenar as almas, não fazer intriga e politiquinha de alguidar - acaba, perversamente, por ampliar essa desgraça colectiva que envergonha ainda mais a situação do "zé povinho" - que assiste a tudo impávido mas pouco sereno.
Vejamos sumáriamente alguns exemplos que ilustram esse absurdo ou loucura da normalidade em que Portugal está a mergulhar:
  • 1. Ferreire leite, a líder da oposição reclama o regresso da ditadura para melhor implementar as reformas da [sua] social-democracia. Tudo dito com o seu élan e glamour no American Club. Antes a pataculada tivesse sido debitada na Lapa. Lindo;

  • 2. Cavaco Silva, PR e "tutor" daquela ex-pupila - um nado-morto da política à portuguesa, ainda não sabe se tem uma espécie de "toupeira" em Belém, o que levou Mário Crespo a dizer que ou a "garganta funda" existe ou é inventada pelos jornais;
  • 3. No day-after - Belém envia uma queixa ao patrão na SIC na esperança de que Balsemão - ponha a lembrança do psd à frente do negócio da tv de Carnaxide e dê umas palmadinhas no rabo de Mário Crespo. O ideal seria despedi-lo sem indemnização - por Crespo ter violado uma regra sagrada poetizada (e denunciada) por Alexandre O'Neill: respeitinho que é muito bonito... Mas Balsemão joga a carta no lixo, Crespo fica-se a rir - e o remetente da dita fica com o mesmo prestígio e autoridade que hoje Ferreire Leite tem: zero. Isto é que é fazer política com "p" ("piqueno"), como diria a srª Leite;
  • 4. Depois Cavaco, numas declarações avulsas à tv, ainda investe 30 segundos para explicar que não tem jeito para a intriga política. Foi uma bela tentativa, mas a sua praxis política em torno da questão do Estatuto dos Açores (apesar de ter razão jurífica) - revelou que prefere um bom conflito na praça pública, por recurso ao psicodrama ampliado pelos media - marginalizando formalmente as competências do Tribunal Constitucional. Durante 10 anos Cavaco cultivou em S. Bento o low profile em nome da elevada eficâcia política, hoje perdeu ambas as valências e é pena.
  • 5. Para agravar este drama nacional - o cardeal D. José Policarpo - de mãosinha ao peito e num registo de desafio inter-civilizacional desanca nos "mouros" - imputando-lhes características que muitos maridinhos católicos professam na sua paróquia, mas em relação aos quais D. José nem pia. Nem nas homilias de fim d' ano. Revelando incoerência de princípios e uma hipocrisia lamentável - que esconde algo que ainda desconhecemos. É a nova cruzada de Roma contra os infiéis a partir de Lisboa.
  • 6. Ferreira leite - com o psd contra si, as sondagens a empurrá-la para o fundo do poço e a sociedade a querer vê-la em casa a tratar do netinho e a fazer o bacalhau espiritual - tem um desabafo surrealista e desafia o PM a dar-lhe uma boleia para um debate público. Socas responde que o "bailarico" tem hora marcada quinzenalmente no Parlamento.
  • 7. Al berto da Madeira continua a chamar "colonialistas", bastardos (e outras coisas que aqui a minha educação me impede de escrever) e a fazer ultimatos ao psd (pasme-se!!!), e diz que não sabe quem é Pedro Passos Coelho, o mesmo que semanalmente sarna Ferreira leite nas esquinas dos jornais, talvez beneficiando da ajuda de alguma "garganta funda" amiga da alegada fonte anónima dos pastelinhos de Belém.
  • 8. Santana vai (re)candidatar-se a Lisboa contra Lopes - porque parece ter apostado com os amigos do costume (Gomes da Silva, Pinto e mais um outro que me escapa, mas não é o Antonho Preto) - em como, desta vez, vai conseguir aumentar o número de assessores, agravar o buraco financeiro e construir um viaduto do Areeiro até à Lapa - com paragem obrigatória na 24 de Julho, com escala na Kapital.

Fico com a sensação que à luz destes princípios e condutas poderiam estar a matar uma pessoa à pancada e continuarem com um ar perfeitamente normal, embora cada um com as suas preocupaçõesinhas diárias, revelando, súbitamente, a miséria da própria condição humana:

Uma reclamando as virtualidades da ditadura como sendo o regime mais adequado à execução das reformas; o outro a persistir no erro de ajudar o nado-morto na política à portuguesa com base em solidariedades antigas que remontam ao cavaquismo; um terceiro acha que a normalidade política é um órgão de soberania pressionar o proprietário dum canal de tv para punir um jornalista por se ter questionado acerca da natureza das fontes anónimas de Belém junto dos media; Cavaco acha que não tem jeito para a intriga política (na suposição de que não é ele o mensageiro); temos um cardeal patriarca que um dia quis ser Papa em cruzada e escolhe a tertúlia onde um dia Santana Lopes foi edil para lançar o grande ataque aos mouros, porque, diz: - batem nas mulheres e são poligâmos; Ferreira leite foi o maior embuste do cavaquistão que, como o BPN (embora distintos), estão hoje a provocar todos os seus danos colaterais no sistema; Al berto da Madeira há 3 décadas que ensandeceu e ainda não sabe, o seu maior problema é levar-se a sério e achar-se normal; Passos Coelho será uma esperança até aos seus 65 anos, ano a partir do qual se (re)candidatará à liderança do PSD; Santana Lopes ainda não se levantou da cadeira onde à 20 anos viu o filme Voando sobre um ninho de cucos, protagonizado por Jack Nicolson.

"Maneiras" que o espaço para a fantasia é, hoje, poderosamente, limitado.

Resta supôr que esta gente deveria era, no dizer do actor que faz - Os Contemporâneos - vai mais é trabalhar, ó....

Mas no plural.

PS: Para compôr este ramalhete neorealista, Olhão conhece agora um novo tipo de candidato político à autarquia: um ex-reformado da Polícia Judiciária. Ainda veremos antigos autarcas da capital candidatos a inspectores da judite.

Pergunte-se a Santana se quer abraçar uma carreira na área da investigação criminal...