jurista
A comunicação ao País do Presidente da República sobre as alterações do estatuto político-administrativo dos Açores marca o Verão político e cria o ambiente para a rentrée.
Desde logo pelas expectativas criadas. Ou melhor, pelo silêncio que permitiu que cada um transferisse para a comunicação a sua própria expectativa sobre a situação nacional.
Poucos terão apostado que sairia na rifa do discurso o Estatuto dos Açores e, por isso, a maioria dos comentários foi no sentido de que se esperava outro tipo de intervenção.
Mas, mais do que o tema escolhido, a gestão profissional do enquadramento da comunicação mostra que o modelo prova e até pode ser tido como uma espécie de ensaio geral para outros voos.
Houve quem achasse que o enquadramento, a forma e o tom seriam desproporcionados para a substância do tema escolhido. É bem verdade que as emendas ao estatuto questionadas pelo Presidente da República na sua comunicação me parecem, no mínimo, bizantinas e até desnecessárias do ponto de vista da racionalidade do funcionamento do sistema autonómico dos Açores. O mesmo é dizer que, se elas não justificariam o dramatismo da defesa dos poderes presidenciais em apelo directo aos portugueses, não é menos verdade que o seu valor acrescentado não justifica nenhuma querela ou confronto institucional. O debate sobre o copo meio cheio ou meio vazio acaba por ser sempre um debate ocioso...
Claro que neste caso, em que as alterações dizem respeito a um estatuto político-administrativo de uma região autónoma, mesmo tendo sido adoptadas por unanimidade na Assembleia da República, a relação institucional não se resume à tradicional lógica bipolar dos processos de promulgação das leis (Presidente/Parlamento, o mesmo é dizer, Presidente/maioria parlamentar), mas traduz-se numa relação tripolar, dada a necessidade constitucional de intervenção da Assembleia Regional dos Açores.
Mesmo assim, já todos nos habituamos a que o tempo no Continente seja frequentemente condicionado pela posição do anticiclone dos Açores, pelo que a primeira linha de resposta à situação criada terá de partir dos órgãos regionais em vésperas de eleições. E neste plano a incomodidade gerada pela intervenção presidencial até me parece distribuir-se equitativamente por todos os principais protagonistas da vida política regional.
Contudo, o que surpreende neste episódio é que, tendo o Presidente da República colocado o assento tónico da sua intervenção na afectação dos poderes presidenciais consagrados na Constituição, provocada pelas alterações do estatuto dos Açores, apresentada como questão "político-institucional" da maior gravidade, o Chefe do Estado não tenha entendido suscitar o tema junto do Tribunal Constitucional à semelhança do que fez com vários outros preceitos do mesmo diploma, na maioria dos quais, aliás, teve ganho de causa.
É que se há questão verdadeiramente relevante, em termos de interpretação constitucional, é a da delimitação do perímetro exterior dos poderes presidenciais e da medida em que o legislador parlamentar pode, por via da lei ordinária, condicionar o seu exercício.
Trata-se, sem dúvida, de uma questão política, mas também de interpretação constitucional num terreno em que a pronúncia do Tribunal Constitucional poderia trazer um valor acrescentado relevante.
Até porque são já alguns os casos em que poderes presidenciais enunciados de forma ática na Lei Fundamental são depois densificados por via de lei ordinária, sendo benéfico poder contar com um enquadramento doutrinal fora do contexto mais premente das disputas político-partidárias.
Uma tal opção teria poupado ainda o esforço da líder do PSD de, uma semana antes da comunicação e no decurso de uma deslocação aos Açores, ter antecipado uma minimização dos danos partidários da comunicação do Presidente da República sobre o novo estatuto, ao insinuar que sobre o mesmo seria o PS e o Governo que estariam à procura de um conflito institucional com o Chefe do Estado. Percebe- -se, pois, melhor porque é que Manuela Ferreira Leite confessou ir limitar os encontros pessoais com o Presidente da República...
Obs: António Vitorino acha que a blitzkrieg comunicacional de Cavaco à nação - veiculada ao jornal de Belmiro dirigido por um tal sr. Fernandes através de um assessor-fantasma - não passa de um "ensaio-geral para outros vôos"...
Com efeito, Cavaco já se profissionalizou nessa techné e arte que é o psico-drama. Uma técnica, rotinada com 10 anos de S. Bento, e, que, doravante cavaco recuperou da pior forma e no pior timing político - com os portugueses a irem de férias levando Cavaco na bagajeira e no tejadilho com uma má memória.
Cavaco pensou que através daquela blitzkrieg se vitimizava e, ao mesmo tempo, criava um laço de cumplicidade com o povo português, mas o tiro saíu-lhe pela culatra e fez ricochete.
Cavaco tentou explorar a verdade através de dramatismos, como ensinara Moreno na sua tese do psico-drama. Mas com o amadurecimento da democracia, a elevação do índice geral de cultura política dos portugueses - ninguém já hoje compra aquela preocupação como sendo de importância vital para o País. Muitos de nós sabemos hoje distinguir um gato duma lebre..., mesmo que não estejamos a investir em acções em bolsa!!!
Para agravar a situação, Cavaco mandou interditar o espaço aéreo no Allgarve (zona de Albufeira) para impedir a recolha de imagens de sua casa no Sul, ainda que se vá banhar nas praias envolventes com paparazis por perto. Agora, desde a praia da Galé até à Marina de Albufeira não há nada para ninguém, as empresas de restauração e de vida nocturna que queiram divulgar as suas iniciativas & festas do J-8 na silly season conhecem agora na ordem do PR o pior dos inimigos à sua actividade económica.
Assim sendo, até apetece perguntar a este PR-"marafade" se é assim que o Estado - através dos seus órgãos e titulares - cria um ambiente económico amigo do investidor!!??.
Quanto às preocupações de segurança..., Cavaco talvez tenha razão: milhões de portugueses, mesmo aqueles que nele votaram, ficaram-lhe com um pó terrível. Sendo certo que muitos desses milhões dificilmente voltaram a votar nele. Por este andar, qualquer dia o PR manda evacuar a zona de Belém, Algés e Dafundo sempre que sai do Palácio Rosa em visita oficial...
Além da nóia acerca dos poderes presidenciais conexos ao Estatuto dos Açores, Portugal conhece agora um PR com a nóia da segurança.
Qualquer dia para um empresário ou um privado requerer um alvará para fazer uma obra ou uma simples marquise na sua casinha terá de solicitar tal formalidade ao Sr. PR, Cavaco e Silva. Ou "Silva" só, na pior das versões insulares...
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