sexta-feira

OS TRÊS RISCOS - por António Vitorino -

O sublinhado é nosso, a foto já integra o rizoma e não reclama "copy-raites"
OS TRÊS RISCOS António Vitorino
jurista
Não surpreenderá o leitor que este artigo verse o Tratado de Lisboa. O acordo alcançado em Lisboa na semana passada põe fim a um ciclo de intenso debate institucional na União Europeia na própria noite em que se fechou o Tratado de Nice, em Dezembro de 2000.
Há que saudar o sucesso da presidência portuguesa, tanto dos seus responsáveis políticos como dos diplomatas envolvidos. Foi o triunfo do método e da perseverança, não isenta de arrojo. Ainda me lembro do cepticismo com que os "meios europeus" de Bruxelas receberam as palavras do primeiro-ministro José Sócrates na noite do Conselho de Junho que aprovou o mandato quando anunciou que a intenção era ter o acordo final já no Conselho informal de Outubro.
Pois bem, ele aí está, o acordo que culmina a mais curta Conferência Intergovernamental da história da União. É verdade que tal se fica a dever porque se trabalhou com base no Tratado Constitucional e num mandato detalhado aprovado durante a presidência alemã. Mas só quem não está familiarizado com estas coisas europeias é que pode ignorar que a recta final é sempre a mais difícil porque é aí que cada país avalia o equilíbrio global do acordo e... se não estiver contente pode criar reais dificuldades!
Desta feita as coisas também se passaram assim. E o Tratado de Lisboa honra o perfil das três sucessivas presidências portuguesas da União.
Há contudo que não subestimar três riscos com que nos iremos confrontar no período de ratificação que se iniciará após a assinatura do Tratado previsto para 13 de Dezembro em Lisboa.
O primeiro risco é que a controvérsia sobre a forma de aprovação do Tratado acabe por diluir o conteúdo e as inovações do próprio Tratado. Decidir da forma de aprovação é sem dúvida uma questão importante. Mas parece-me avisado que Portugal postergue essa decisão para um momento posterior à assinatura do Tratado. A visibilidade que lhe advém de exercer a presidência acabaria por fazer da decisão portuguesa (que se quer livre e apenas em função dos nossos interesses como Estado) uma peça relevante do debate sobre a forma de aprovação noutros países. Evitar essa instrumentalização significa reforçar a nossa capacidade própria de decisão. E adoptá-la sem tibieza, assumindo todas as suas implicações na vida política interna.
O segundo risco tem a ver com a ilegibilidade do novo Tratado. Com efeito, o Tratado Constitucional teria decerto muitos defeitos, mas ao assentar numa preocupação de codificação dos tratados existentes fazendo-os convergir para um texto único, o defunto Tratado Constitucional era susceptível de uma leitura mais fácil e corrida. Ora a decisão tomada no mandato de Junho de abandonar a vocação constitucional do Tratado, mantendo a existência de dois tratados (o Tratado da União e o Tratado sobre o Funcionamento da União), com remissões recíprocas, e adoptando a técnica legislativa de emendas pontuais aos Tratados vigentes, tudo resulta numa dificuldade acrescida de leitura (e de compreensão) pelos não especialistas. O retorno à técnica clássica de redacção dos Tratados vai exigir um esforço de informação e de comunicação acrescido, desde logo pela publicação de um texto suficientemente claro e preciso sobre as inovações introduzidas pelo Tratado de Lisboa. E isto independentemente da forma de ratificação que venha a ser escolhida entre nós.
Este esforço de informação faz parte também da resposta ao terceiro risco: o da deturpação do conteúdo real do Tratado. Vozes apocalípticas logo vieram dizer que vinha aí o directório das grandes potências europeias, que se tratava de impor o federalismo à força, que a Comissão iria definhar, que se estava a "militarizar" a Europa, inclusive que se estaria a fazer reentrar a pena de morte por via da Carta dos Direitos Fundamentais! Estas reacções típicas de especialistas em sound bites contam com a complexidade do Tratado como aliada, sabendo que a desmontagem destes "fantasmas" exigirá sempre tempo e muita pedagogia até que se possa repor a verdade ou delimitar a exacta dimensão das críticas assim formuladas.
Não será possível virmos a ter um debate racional sobre o Tratado?
Obs: Infelizmente, António Vitorino tem razão. Posto que a chamada oposição das margens, a mesma que sempre foi anti-europeísta, com o PCp à ilharga e o BE agora a secundá-lo, vai, oportunisticamente, fazer uma campanha negativa pelo - Não - ao Tratado de Lisboa com o fito de fazer barulho e arrebanhar alguns votinhos de descontentes e, assim, abater o governo socialista nessa xicana política. Já toda a gente percebeu as motivações dos camaradas Jerónimo e Anacleto Louçã: um anda a ler as Obras completas do Lenine e a fazer purgas na dispensa do Comité Central da Soeiro Pereira Gomes, para se purficar e regressar à origens do comunismo internacional; o outro anda muito caladinho últimamente.
Até dá vontade de lhe recomendar o marketeer que tratou da imagem ao santana lopes na CML, mais que não seja para ver se alguém começa a pagar as contas por tanto absurdo e oportunismo no teatro político português.
Já para não falar na humilhação que seria um referendo feito em Portugal votado por 10 ou 15% da população, e desses só os militantes pelo Não lá iriam. Seria cá uma legitimidade e pêras..., depois de termos negociado o Tratado de Lisboa com brilho e eficiência. Tenham juízo!!!
E isto também é dirigido aos doutores e catedráticos de Direito e conexos que andam por aí a representar Bertolt Brecht nas estações de televisão onde alimentam polémicas artificiais ou, pelo menos, com 21 anos de atraso...
Estão lixados, porque desta vez lá terão de ir todos ao Mosteiro dos Jerónimos, e se tiver sol será mais um dia bonito e feliz do resto das nossas vidas.
É a vida...
Já agora, dê-se os parabéns ao António Vitorino que, se calhar, também por lá andou a negociar o Tratado. Só não sabemos se vestido de Talleyrand ou de...