sexta-feira

Nobre e leal - por Rui Tavares -

Nobre e leal
03.05.2007, (in Público, assin.)
Rui Tavares
1. O lema da cidade de Lisboa é "Mui nobre e sempre leal". Carmona Rodrigues deve deixar a presidência da cidade porque demonstrou não entender o sentido desta frase. Não porque é arguido. Mas porque, passada uma semana sobre as primeiras notícias de que o era, ainda não se dignou informar disso os seus concidadãos. Não porque foi visitar uma exposição de motos em vez de falar aos lisboetas, mas porque nem sequer o seu gabinete sabia se tinha saído do país em representação da cidade. Não porque não tenha legitimidade eleitoral, mas porque acha que a confiança política apenas funciona dos eleitores para os eleitos, e não dos eleitos para os eleitores. Não porque até o presidente do partido que o elegeu defende novas eleições, mas porque, segundo algumas notícias, Carmona ainda cogita a hipótese de se enquistar numa câmara que não domina, não controla e não governa. Se acha que pode fazer alguma coisa por Lisboa, Carmona Rodrigues deve parar de fugir e, por uma vez, obedecer ao lema da cidade.
2. As próximas eleições vão ser intercalares, para um mandato de apenas dois anos. Tanto melhor. A próxima câmara municipal terá de começar pelas mais modestas e essenciais das coisas. Para já, vai ser preciso arrumar a casa, dominar o caos financeiro, motivar os funcionários e os colaboradores da câmara. Mas há mais: ninguém voltará a confiar numa oposição que, em boa medida, partilhou os vícios da presidência. A irresponsabilidade, a mesquinhez e a política de vistas curtas têm de acabar. O drama é que os aparelhos locais dos partidos estão infectados e ninguém espera que se curem sozinhos.
3. A política, como se costuma dizer, começou nas cidades. E agora está a voltar a elas. Desde logo porque a globalização e a integração regional têm diluído as fronteiras nacionais. Mas também porque é nas cidades que estão os grandes motores desse processo. Quando invejamos a vitalidade económica da Catalunha, da Inglaterra ou da Califórnia, sabemos que parte da resposta está em Barcelona, Londres ou São Francisco. Uma Lisboa do futuro não deve imitar estes exemplos porque a imitação nunca chega: vejamos até onde nos trouxe a necessidade provinciana de imitar Bilbau com um edifício de Frank Gehry. Mas Lisboa terá certamente de se reinventar segundo as novas regras. Tem todas as condições para isso, mas falta-lhe o que estas cidades têm: ambição e participação política dos seus cidadãos. Está na hora de os lisboetas começarem a dizer o que querem da Lisboa do futuro. Portugal precisa dela.