sexta-feira

Comprar o futuro: domar o tempo, invisuais ao poder

  • A maior parte do que pensamos, dizemos ou fazemos não coincide com a realidade. É assim na vida pessoal, social, económica e em geral. Isto não seria grave se o futuro, com todos os seus problemas e tragédias, não tivesse já determinado. Mas quando tentamos antecipar ou imaginar esse futuro ficamos cegos: ou vemos tudo escuro, ou vemos tudo neve. A complexidade da vida das sociedades modernas adensou esta preocupação de comprar-futuro. Mas como demover esse monstrinho imóvel que se chama destino? O tal que nos coloca permanentes armadilhas, quer ao pensamento quer à acção. Por isso, vemos tudo preto ou branco, ou a preto e branco. E são essas as cores cegas que se apoderam de nós.
  • No fundo, queremos antevisões e esbarramos com mais do mesmo. Queremos uma percepção extra-sensorial que nos diga que amanhã o petróleo vai baixar, e só temos notícias que nos contrariam; queremos uma notícia que nos aponte que o valor do dinheiro vai baixar e a realidade segue num carrossel que não é tocado por nós.
  • Na política, na sociedade, na cultura, na economia nada hoje é estimável ou previsível. Nem os casamentos são já as referências que foram no passado. É certo que à custa de muita violência - física e psicológica. Mas não falemos de coisas tristes porque não somos porta-vox das mulheres, seres maravilhosos a quem só faltam asas para voar.
  • Estas questões colocam-se, por maioria de razão, aos agentes políticos que têm de estar sistemáticamente a antecipar o futuro, a delinear medidas para regular os problemas micro e macro-sociais e, assim, assegurar o funcionamento das instituições.
  • Por aqui se imagina a angústia que os políticos hoje devem ter. Muitos nem um meio dia conseguem estimar, quanto mais um debate parlamentar, aguentar a gestão duma oposição na adversidade (como M. Mendes actualmente) ou ainda suportar uma legislatura inteira - como Sócrates. Esta questão da compra do futuro coloca-se, portanto, a todos estes actores e agentes da governação doméstica que também têm responsabilidades na esfera da globalidade, ié, das relações internacionais.
  • Lembremo-nos do que Platão dizia neste contexto: antes da realidade materializada, já existe um mundo de projectos que se pôs no terreno a delinear formas, a impôr conteúdos. Ora isto é dramático, na medida em que - a ter algum fundamento - significa que só as pessoas mais sensitivas e mais dotadas - (e nem sempre as encontramos na política, e às vezes em parte alguma...) conseguem reconhecer alguns desses sinais, antecipar alguns desses projectos ou ideias que balizam o futuro. Confesso que por vezes vou à varanda, e se verifico que se o céu está muito nublado digo logo que vai chover. Mas não passo disto, nem são estes os sinais de que aqui falamos.
  • Será que esse futuro não existe já no passado? Assim como uma espécie de tempo paralelo. Felizmente tenho boa vista e até acho que não seja completamente destituído, mas não encontro nenhuma resposta para prover estas dúvidas sobre a compra do futuro que se colocam com acuidade na esfera política, por envolver os destinos colectivos.
  • E por saber que essa aquisição de futuro é um enigma que se esconde nas dobras do tempo julgo que não seria má ideia fomentar a entrada de invisuais na política, já que, como sabemos, são pessoas com uma sensibilidade excepcional que poderão, um dia, conhecer esse futuro muito antes dele aparecer.
  • Estas pequenas conjecturas vieram-me à memória ontem à tarde quando assistia a parte do discurso de Paula T. Pinto que quer, e bem, assumir as responsabilidades na Distrital do PSD em Lisboa. E sempre será preferível, de longe, a sua eleição à infiltração do PsD pela versão amadora dos Donos da bola e do universo faccioso-populista da futebolítica tão bem representada pelo sr. fernando Seara, que parece que ainda é edil de Sintra, apesar de ainda se levar 2 horas (eu disse 2 horas!!!) para percorrer Lisboa-Sintra (uns miseráveis 20 quil.). Por outro lado, nunca sei se Seara quando fala está representando o departamento de futebol do Benfica, o velho CDS ou um PSD tão estranho quanto etéro, que é o dele e de mais ninguém.
  • Algo o persegue desde os tempos de faculdade, e não creio que seja o PSD, embora possa admitir que seja ele quem persegue o partido. Sabe-se lá para quê??? Realização do bem comum, não é certamente. É por isso que o PSD às vezes não é um partido, mais parece um albergue espanhol. Recebe todo o tipo de acantonados da política. Um dia destes ainda veremos Garcia Pereira de braço dado com Arnaldo de Matos e Otelo Saraiva de C. - sob o alto patrocínio de Durão Barroso inspirado no livro vermelho de Mao Tsé Tung - ingressar no PSD - com antónio Preto lavrando em acta essas novas aquisições.
  • Por acaso foi uma tarde muito bem passada à conversa com o Jorge, a Teresa, o J. Eduardo, o Rui e muitos companheiros de outras guerras que o tempo futuro, porventura, já não reproduzirá.
  • Em rigor, estas minhas estranhas preocupações com a precognição do futuro no quadro da política portuguesa traduzem-se numa ideia simples e que um dia ainda desejaria ver realizada: ter em Portugal um Primeiro-Ministro invisual. E não nos referimos aqui a Sócrates, reporto-me a um verdadeiro invisual que, pelas suas excepcionais capacidades extra-sensoriais, poderá antever os problemas antes deles se manifestarem e desenvolver formas de conhecimento nunca antes vistas que nos permitam explicar o inexplicável em que hoje se encontra Portugal.
  • Em suma: do que precisamos, do que Portugal precisa é de um jovem "cego" em S. Bento. Por enquanto ainda não nos pronunciamos sobre os jardins do Palácio de Belém.
  • Este post é dedicado a todos os invisuais de Portugal que por serem seres verdadeiramente excepcionais, deveriam ter, um dia, responsabilidades políticas. Se quiserem perceber a excepcionalidade de que aqui falamos façam o seguinte e comezinho exercício: suponham-se totalmente cegos (de vista e tudo) e tentem sair de casa, apanhar o elevador, atravessar estradas (pode ser alí a Av. da República...), entrar no metro, etc, etc... Façam um dia essa viagem ao interior do inconsciente e vejam quão cegos ficam... Ainda que vejam ou julguem que vêm algo só porque têm os olhos bem abertos.