quarta-feira

A blogosfera nacional (I)

Sou novato nisto, mas do ano e meio que levo de blogosfera penso que já vivi uma vida. Encontra-se aqui de tudo. Mas não vou dissertar sobre esse "tudo", até porque não era capaz e deixaria, seguramente, muita gente boa e com valor de fora, e isso seria uma injustiça. Refiro apenas o que motiva e comanda este caldeirão de valores, crenças mais ou menos comuns que formam um determinado comportamento: blogar. Há quem o faça para se tornar conhecido (ou porque assim pensa), obter links, negociar e traficar pequeninas quotas de influência; por puro divertimento e queimar a solidão; e há quem o faça na esperança de produzir opiniões, comentários, críticas e, se possível, aspirando a algumas reflexões que resistem à erosão do tempo que passa. Eu tenho a modesta pretensão de integrar este escalão.
Por aqui, como dizia, vemos de tudo: o bom, o razoável e o mau. Uns apostam numa cultura meritocrática e de denúncia, outros assumem uma postura hacker e mais desafiante a atirar para o criativo; outros perfilam-se em comunidades virtuais temáticas e outros ainda procuram tocar muitos instrumentos ao mesmo tempo. A ideologia dominante é a Liberdade, que por vezes degenera em libertinagem.
Os blogues crescem à cadência dos problemas irresolúveis em Portugal: cerca de uma centena por dia, ou mais. A descoberta tecnológica, a emoção dos rankings, a aceitação pelos outros como se de um thymos científico se tratasse, a instumentalidade de tarefas e de projectos por esta via, a flexibilidade, a interactividade, a personalização formam, em boa medida, esta cultura de comunidade aberta em que todos colaboram com as suas ideias brilhantes, razoáveis e, claro, como seria inevitável - com uma abundância de babuseiras mitigadas com egocentrismos atrozes. Alguna saté comemoram o aniversário do piriquito e confidenciam as vezes no ano em que a respectiva cadela entrou no cio e quantas crias teve a ninhada. Portanto, experienciamos o admirável mundo do folclore..
Vê-se de tudo, e quando supomos já ter esgotado o cardápio das novidades eis que nos surge alguém narrando que na China nasceu mais uma criança com três braços. E depois mostra a respectiva foto, para não deixar dúvidas. Tudo em tempo real e programado, o que é mais dramático.
Perante este caldo de cultura e ambiente tecnológico coloco duas questões: será que entre nós pulula um bando de blogueiros loucos e com poucos escrúpulos que se dedicam a ataques informáticos, a decifrar códigos com vista a penetrar ilegalmente em circuitos fechados - como são esses condomínios-conta do BCE, bes e conexos? Creio que não. Não será isto um exagero? É-o certamente. O que serve para medir a distância entre aquele conceito que vemos nos filmes e o que cada um de nós entende, em consciência, aquilo que actualmente reflecte a blogosfera nacional. Nos seus recursos, interesses, redes, estratégicas e o mais...
A 2ª questão também é um caso-limite já muito conhecido que circulou mundo fora. Na transição do milénio, muitas pessoas na Colômbia - terra da coca e doutras festividades alucinogénicas, resolveram sofisticar os níveis e os métodos de violência. Pressionada por uma classe média que se entrincheirava nos subúrbios da cidade, logo apareceram os indígenas extorsionistas que entenderam que essa urbanização forçada e veloz tinha de ser tributada. Como?? Recorrendo à internet... distribuindo por esse meio centenas de mensagens contendo ameaças de morte que depois se concretizam com sequestros seguidos dos respectivos pedidos de resgate.
Neste caso-limite, a net e os milhares de mails que por ela circulavam em larga escala, transformou-se num negócio da morte, numa violência quase institucionalizada. Isto ocorreu à meia dúzia de anos na sociedade colombiana - que se apropriou da net para este fins criminais, mau grado o ambiente de injustiça social e de corrupção política que a economia da droga e a guerra civil enquadravam.
Se compulsarmos estes dois exemplos-limite e os tentarmos comparar ao uso que em Portugal fazemos da net não há comparação possível. Não havendo comparação ou verosimilhança qual o propósito de boa parte da blogosfera nacional? Eis o que tentarei explicitar noutra hora mas no mesmo local porque agora a hora - que também é uma convenção - já se faz tarde.