Self-fulfilling profecy
Todos sabemos que por vezes desejar muito uma coisa ela acaba por se concretizar. Ou seja, a pofecia de um acontecimento leva ao acontecimento dessa profecia. Mas ninguém antecipou a queda do Muro de Berlim nem o termo da Guerra Fria e do colapso do comunismo; ninguém pensou que Durão abandonasse o país para ir para Bruxelas ganhar mais 3 mil cts; ninguém supôs que a economia nacional estava tão deficitária; que o crescimento económico era negativo, que a sociedade estivesse tão esfrangalhada e assimetrica como está, e o mais. Quer dizer, nem sempre os desejos e os prognósticos que se reportam a acontecimentos futuros podem ser influencienciados pela acção humana do presente, de molde a acelerar e reforçar o aparecimento dessas tais profecias que vamos alimentando nas nossas cabecinhas. Imaginemos que logo à noite no progama da Srª dona Fátima C. Ferreira os intervenientes vão anunciar ao país que anda para aí um instituto de estudos económicos e sociais na posse de informação que aponta uma melhoria significativa do crescimento económico, com todos os indicadores de desenvolvimento económico e social a disparar... Muitas empresas, certamente, terão automáticamente a tendência para reforçar os seus investimentos, alargar os seus budgets, intensificar os seus "gastos" em pub., e o país, porque no seu conjunto acreditou nesta onda, saí globalmente reforçado. Com mais crescimento, modernização e desenvolvimento. Uma alegria. Na vida pessoal passa-se o mesmo, temos um exemplo magnânimo de S. Lopes que acreditou ardentemente, com tanta força que até rebentou a costura às calças, que haveria de ser PM e conseguiu sê-lo, e com os resultados que a Nação e a República tão bem conhecem. É verdade, ando com esta questão há anos: o Plateau já fechou??? E a Kapital, que é feito...
Daqui decorre uma quase certeza: quem deseja muito uma coisa acaba quase sempre por alcançá-la. Cavaco consguiu ser PR - com dez de preparação; Marques Mendes conseguiu fazer com que Cavaco fosse PR; o dançarino Jerónimo substituiu Cunhal no PCP; Louçã demonstrou à esquerda que é mais do que um movimento social pró-aborto e pró-liberalização dos casamentos gay; Ribeiro e Castro provou que não é diferente de Freitas e carece de reciclagem; P. Portas espelha uma vaidade imensa e inaudita e pretende - a prazo - demarcar a região da direita e preparar o caminho para o regresso quando lhe deixarem de pagar na Sic; Belmiro deseja vingar-se de Horta e Costa e de mais um conjunto de accionistas que ele pura e simplesmente detesta; o BCP deseja copiar Belmiro na OPA à Pt; dizem que a mulher do presidente do BCP só é vice-presidente do PsD porque tem o marido que tem; e a televisão portuguesa, toda ela, com excepção do filme de 5ªfeira à noite com o dr. House - tem uma atracção pelo abismo e pela porcaria onde persiste amarfanhando-nos a todos. O dr. House e os Prós & Contras, naturalmente. Enfim, os exemplos poderiam multiplicar-se, com cor, som e tudo. Quer dizer, parece existir uma relação entre o desejo que determinado acontecimento ocorra e a sua efectiva realização. As vitórias do Benfica, a descida das taxas de juro e do preço do dinheiro, o take-of da economia portuguesa, os níveis de corrupção, cunhismo, nepotismo e incompetência generalizada são, contudo, excepções aquela regra. Aliás, nestes casos em lugar de termos self-fulling prophecy temos é o self-defeating prophecy, dado que o anúncio das previsões saíram todas furadas. Houve, nestes casos, uma mudança de comportamento não prevista ou contemplada nos cálculos de possibilidades iniciais. A guerra ao Iraque cai nesta categoria, o que parecia inicialmente fácil revela-se hoje desastroso, frustrante, degradante. Perante todas estas profecias que correram bem somadas às muitas outras outras que correram mal - resulta uma questão: Que fazer? Já não é a velha questão de Lenine, mas saber o que fazer para organizar a mudança, eliminar os factores de risco e de incerteza na vida das pessoas, das organizações, das sociedades, em suma, do sistema internacional.
No fundo, é do futuro que estamos a falar. Como antecipá-lo? Como conhecer os seus contornos antes dele chegar? Numa palavra: como comprar futuro? Será que valerá a pena atermo-nos muito mais com esta metodologia? Será que valerá a pena pedir à nossa massa cinzenta para prognosticar, inventar, desejar, projectar, cenarizar o quadro de possibilidades para, desse modo, olear melhor a realidade e dizer: olha lá ó "realidade", vem, vem antes do futuro e não nos deixes na incerteza, nem nos pregues partidas.. Será isto possível? Hoje à noite irá debater-se na RTP alguns pontos de intersecção que estão na fronteira da economia com a sociedade - mas também, creio, determinar que papel caberá à sociologia da esperança em rasgar novos horizontes de molde a tornar realidade muitas outras profecias em Portugal que ainda nem sequre foram concebidas. E não nos referimos aqui aos jogos de sorte e azar - tipo euromilhões, pois seria o pior dos indicadores que Portugal fosse conhecido no exterior por fazer a sua recuperação económica auxiliada pelos ventos da sorte. Já somos conhecidos pela pedofilia, sermos também conhecidos pelos novos ricos da Europa seria, no mínimo, desastroso.
Todavia, creio que existe um efeito positivo, por pequeno que seja, no enquadramento desta questão na vida dos portugueses. Um efeito quase mágico de criar essa tal realidade a haver, situada no futuro. Pois um país - como o nosso - quanto mais ameaçado se sente, tanto mais tendência terá para reforçar todos os seus mecanismos de produtividade e de inventividade, de trabalho e esperança, de capacidade de fazer e de acreditar. Ao invés, quanto mais elevados forem os impostos, como dizia César das Neves no dn, maior será a injustiça social. E nós dizemos que maior será a apetência dos portugueses, mesmo os mais honestos, para mentir. E aí criaremos uma sociedade de mentirosos, dado que os impostos em Portugal são elevados.
E se temos impostos elevados, passamos a vida a mentir e ninguém nos leva a sério. E se niguém crê em nós ficamos a falar sózinhos neste canto daEuropa à beira-mar-plantados, à espera de mercadorias e ideias. Como referimos no início, a profecia de um acontecimento pode levar justamente ao acontecimento dessa profecia. E como as coisas estão mal em Portugal, da economia às finanças, temos uma grande tendência para institucionaliar a sociedade da mentira - como algo já natural. Só que há aqui um problema com esse tipo de sociedade: a sociedade da mentira é um reflexo de uma modalidade de estupidez e de subdesenvolvimento cultural que hoje nos tolhe. O mais grave é que esse tipo de estupidez também se tranforma em profecias...
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