segunda-feira

Fernando Pessoa em passeio por Oeiras

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  • Imaginem que Fernando Pessoa se passeia por Oeiras. Imagine que ele gosta do que vê, porque a alegria dele só existia quase estava triste. Triste e com uns copinhos no sangue, o que lhe dava o traço de genialidade ímpar do seu tempo. Chega a Oeiras e confronta-se com a Modernidade que define como sendo o excesso de tudo.
  • Mas depois Pessoa também assiste a algumas das contendas verbais que por aqui fazem carreira e exclama: as nossas palavras não dizem as coisa, as palavras são sinónimos, são só palavras. Alí sempre disponíveis para serem usadas, usadas, protistuídas.
  • Pessoa também avalia a Política e julga que há candidatos a mais, ficção a mais, passado a mais. Alguém, porventura, bebeu mais vinho do que ele? E interroga-se: será que essa ficção política basta para preencher o vazio, cenarizando diversas formas de fingir que se compreende aquilo que ninguém entende?! Como o Marinheiro, que não tem nem terá nunca uma pátria neste mundo, mas tende a construí-la sobre o sonho de uma outra pátria. A ilusão do poder do passado. Será isto o Leopardo do Viscontti - em que na transição do séc. XIX para o séc. XX mostra que a aristocracia não compreendera que estava a perder o passo para a burguesia emergente?! Estas transições são terríveis, diz Pessoa - meio sóbrio, meio-meio.. Mas sempre inteiro.
  • Pessoa sabia, no fundo, que era um criador de mitos - como Oeiras durante anos foi. Mas aqui o mito teve algumas pernas e andou de mãos dadas com a realidade. Mas Pessoa também não ignorava que não era nada. Dizia: "sou uma ficção". Uma ficção de mim mesmo.
  • Mas o que Pessoa nos deixou foi a realidade da sua ficção. Dizia - que era inútil bucar num homem algo que não tivesse uma mutiplicidade. É aqui que bate o ponto: Pessoa sabia que Oeiras é uma terra bela, uma pérola do Atlântico. Mas também sabia que iria encontrar muitas máscaras nesse passeio marginal no séc. XXI. Pessoa sabia que não passava de um guardador de rebanhos, que eram os seus pensamentos, todos sensações.
  • Por isso insistia, dentro e fora de Oeiras: o que é preciso é aprender a não pensar. Mas viver só da nostalgia do passado não chega. Pessoa percorria Oeiras e sabia que havia um perigo maior. O de confundir Oeiras com o Mónaco, a Suíça, O Lichenstein.. Mas o que nos salvou foi a heteronímia de Pessoa, a sua visão da multiplicidade das coisas e dos "eus" que habita em cada um de nós. Numa proliferação indefenida, em cada instante pensado pela mente. Será assim com a vida das cidades? Quando se procura encontar para elas o melhor planeamento, a melhor harmonia, a melhor participação, o melhor desenvolvimento.
  • Afinal, o Hamlet estaria bem, se não tivesse à sua volta aquele drama todo, como diria Valéry. Será que Oeiras é assim? E se é, quem é o autor do drama... Será o próprio Fernando Pessoa - que se passeia pela marginal embriagado!!?? Saberia Pessoa nadar? Gostaria ele de praia?
  • No fundo, não será que Pessoa recorria à irrealidade do seu "eu" para revelar um jogo de vozes presentes-ausentes, vertido nos poemas? O que diria Pessoa do parque dos Poetas? e do Porto de Recreio? Seria um retrato contrastante.., ou harmonioso?
  • Será que Pessoa criou só imagens, só paisagens? Será que não criou também cidades, povoadas de ruas e travessas, uma a uma, cinzelando-as no cais da sua alma?
  • Pessoa sabia o que valia. Sabia que a sua ilusão teatral permitia uma pura ficção que espelharia a vida, mesmo que se trate só da recordação ou de vestígios dessa vida. Por isso, com Pessoa - em Oeiras - falando para todos alí do Parque dos Poetas - não estamos nem no inferno nem no paraíso; estamos no limbo, numa parelha de sombras. Com muitas multiplicidades, com muitas máscaras que a leitura atenta descodifica e desoculta, muitos homens duplicados, muitos charutos a arder sem se ver, mas a queimar, sempre a carburar na terrível linha do tempo que nos há-de matar a todos.
  • Afinal, O Alberto Caeiro, o Ricardo Reis, a "uva" de Pessoa, o Álvaro de Campos, o B. Soares - todos - em última instância, representam o Oeiras actual: uma criação das suas criaturas, um cenário aberto aos seus actores. Pessoa diria que o passado político de Oeiras que é - onde as coisas acontecen - num passado não muito distante - representam criaturas que se tentam inventar a si próprios, mantendo-se actuais, não obstante integrarem a galeria de múmias que não se resigna a viver escondido nesse mesmo passado. Cervantes foi, neste caso, segundo J. L. Borges e até Unamuno, a ficção de Don Quixote. Mas este não fumava charuto nem poluía a vila.
  • Pessoa regressa à Vila. Percorre os passos do concelho, vê os monumentos, perturba-se com o betão e diz: a teatralidade em Oeiras é simultaneamente nula e vertiginosa. É, em suma, um espectáculo objectivamente louco. Visto que nos obriga a todos a assumir a loucura que Pessoa pôs na sua própria aventura poética.
  • Mas não será necessário ficarmos prisioneiros no nosso inevitável transfert para o mundo-Pessoa ou será que é do de Pessoa para o mundo?
  • Será que Oeiras sabe responder a isto?
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Nota: este blog é dedicado a todos os amantes de Fernando Pessoa e aos oeirenses cultores das artes plásticas e d'outras esculturas da alma - que ainda não encontraram definição nos conceitos nem nos livros da especialidade.