Cavaco Silva abre o livro contra Sócrates
Nota prévia: Os livros de memórias, por regra, comportam sempre o risco da ideia distorçida que o seu autor tem de si, dos outros e da própria história. Uma ideia e um discurso de auto-justificação, quer para se absolver dos erros e omissões cometidos no decurso dos seus mandatos (e cavaco já está na vida política activa há mais de 30 anos), quer para tentar culpabilizar os outros do que fizeram ou deixaram de fazer por força das circunstâncias.
- Ora cavaco, como é bem sabido, além de não ter facultado uma única ideia ou visão de futuro para o desenvolvimento do país nos últimos 20 anos, apesar de se arrogar da sua imensa experiência governativa, nutre pelos outros, em especial pelos actores políticos da esquerda, uma ideia que oscila entre o ressentimento, a má fé e a vingança.
- O caso das famosas escutas a Belém, simuladas por um seu assessor de imprensa, Fernando lima, ilustram bem o carácter político do ex-PR e da sua forma de estar na vida pública. Cultivando um estilo austero, fechado, antipático e, no limite, salazarento, parecendo até que cavaco é mais um fiel discípulo de António de Oliveira Salazar do que propriamente um filho da revolução dos cravos de 1974.
- No plano externo, em boa medida conseguido à base de bons contactos internacionais, cavaco é - e sempre foi - uma nulidade. Pela sua congénita timidez, mal se relacionava com os líderes europeus, estes, por seu turno, também mal o conheciam, e isso prejudicou gravemente os interesses de Portugal na esfera externa que, assim, ficou privado duma voz activa no plano internacional durante os dois mandatos em que cavaco foi PR, de 2006-2015.
- Em face disto, das suas obscuras ligações a figuras tenebrosas como Oliveira e Costa, M. Dias Loureiro e outros players que estiveram na base do BPN, e que obrigaram Portugal e os portugueses a empobrecer para pagarem milhares de milhões de €uros pelo buraco deixado pelo BPN ao erário público, pergunto-me se cavaco valerá sequer a vã e inútil ideia que alguma vez um leitor possa ter de vir a gastar 15 ou 20€ num livro com a sua assinatura. Um dia alguém ouviu cavaco a pedir publicamente a verdade sobre o caso BPN? sobre o caso BES? Ou sobre os submarinos??? etc, etc, etc..
- No meu entendimento, a resposta é negativa. E se, por ventura, alguém um dia lhe oferecer o livro finja que nada recebeu, ou então que o mesmo seja forrado a papel pardo a fim de servir de base a qualquer objecto lá de casa de menor valor.
- E no Inverno, com este frio, as lareiras agradecem...
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Cavaco Silva abre o livro contra Sócrates
Foto: Carlos Manuel Martins/Global Imagens
Judith Meneses e Sousa
"Foram 188" as reuniões, no Palácio de Belém, entre Cavaco Silva e José Sócrates. O primeiro encontro entre os dois foi, no entanto, à mesa de um casamento no Alentejo, conta Cavaco.
Depois da eleição como Presidente da República, Cavaco Silva e José Sócrates encontram-se no Forte de São Julião da Barra, um encontro "simpático", descreve o antigo presidente, contando, por exemplo, que Sócrates lhe disse que Mário Soares se tinha "oferecido" como candidato presidencial e ele, Sócrates, não tinha outro remédio senão apoiá-lo". Embora estivesse convencido de que Cavaco ia vencer.
Das reuniões de trabalho, às quintas-feiras, Cavaco Silva diz que o então primeiro-ministro vinha bem preparado mas, com o tempo, o Presidente aprendeu a "desconfiar" das "boas noticias".
Entre as críticas a Sócrates estão: "fingimentos, mentiras e falta de lealdade", o antigo primeiro-ministro, escreve Cavaco Silva, era "parco a cumprir o que dizia".
A "reunião mais difícil", o tom azedo, com o antigo primeiro-ministro aconteceu a 16 de setembro de 2009, De um lado da mesa Cavaco Silva convencido de que o PS era responsável por intrigas de verão" envolvendo o nome dele, do outro lado estava Sócrates a "subir o tom de voz" e insinuar que presidente tinha querido prejudicá-lo eleitoralmente". Cavaco Silva diz que esteve quase a terminar a reunião antes de tempo.
Pelo relato de Cavaco Silva, José Sócrates surge obcecado com a comunicação social - uma atitude
"diametralmente oposta" à do Presidente, que diz ter chegado a Belém "saturado de "exposição mediática".
Ao longo da convivência, às quintas-feiras, o antigo presidente registou os lamentos de Sócrates sobre os casos da licenciatura, do Freeport, da Face Oculta. O antigo presidente diz ter sido alvo da ""tenebrosa" máquina de propaganda do PS", em 2009, durante as eleições em que Sócrates perdeu a maioria.
O mote da campanha de Manuela Ferreira Leite era "Verdade". Sócrates, conta Cavaco, considerou o slogan um ataque a sua idoneidade e terá dito "receio que tenhamos uma campanha crispada", relata Cavaco ter ouvido Sócrates.
O antigo presidente diz ter ficado convencido que tanto Sócrates como o PS "iriam fazer tudo, sem olhar a meios, para ganhar as eleições e para preservar a maioria absoluta no Parlamento".
Férias "marcadas" pela polémica sobre a "escutas"
Cavaco Silva escreve que as férias algarvias de 2009 ficaram marcadas por uma "intriga política insidiosa, criada e alimentada por setores do PS com a participação ativa de alguns órgãos de comunicação social, a qual pretendeu envolver-me na campanha eleitoral".
O jornal Público dava conta que Belém acreditava estar a ser alvo de vigilância por parte do Governo mas Cavaco Silva descreve agora o caso como uma "historieta de verão" para desviar atenções do estado do país.
"Bastava ler o texto para perceber que se tratava de um título absurdo, reflexo do gosto de alguns jornalistas pela intriga e pela criação de factos políticos".
E esclarece: "em três anos e meio de mandato, nunca tinha ouvido falar em suspeitas de a presidência estar a ser vigiada por quem quer que fosse".
O PS é acusado por Cavaco Silva de ser "o partido que, quando no Governo, procurava exercer maior controlo sobre a comunicação social e que mais facilmente arregimentava jornalistas para as suas manobras políticas". Por outra palavras: a "tenebrosa" máquina de propaganda do PS, que teria montado uma operação para minar a minha credibilidade institucional e pessoal".
A "reunião mais difícil", o tom azedo, com o antigo Primeiro-Ministro aconteceu a 16 de setembro de 2009.
De um lado da mesa Cavaco Silva convencido de que setores do PS eram responsáveis por "intrigas de Verão" envolvendo o nome dele, do outro Sócrates a "subir o tom de voz" e insinuar que presidente tinha querido prejudicá-lo eleitoralmente". Cavaco Silva esteve quase a mostrar-lhe a saída.
"Esta foi sem dúvida, a reunião mais difícil que tive com o primeiro-ministro José Sócrates. O diálogo chegou a azedar e, quando se exaltou ao ponto de subir o tom de voz, interrompi-o e chamei-o à ordem, dizendo-lhe que não estava a falar com membros do seu gabinete ou do seu Governo, mas sim com o Presidente da República e que, se não era capaz de manter a compostura, o melhor era dar por finda a audiência",
No livro, Cavaco Silva relata que José Sócrates lhe terá pedido para "fazer algumas coisa para pôr fim ao inquérito" parlamentar sobre a compra da TVI pela PT por considerar que a PT estava a sair fragilizada. A resposta do Presidente foi curta: "O senhor primeiro-ministro sabe que isso é uma ideia absurda".
Diz ainda que, desde cedo, diversos gestores" lhe fizeram "chegar a mensagem de que nunca se tinha verificado tanta interferência do Governo na vida das grandes empresas".
Já na reta final das relações com José Sócrates, fica um raro elogio, pelo facto de o antigo primeiro-ministro não se ter deixado "capturar" pelo PCP e Bloco de Esquerda.
Na leitura de Cavaco, "não existe na Europa, nem tão pouco no mundo, qualquer país que seja desenvolvido e que registe um caminho de sucesso tendo partidos da extrema-esquerda a determinar a condução da política económica".
Os ministros de Sócrates.
Em plena crise, com a sombra do resgate a pairar, Teixeira dos santos é descrito como "patriota" e "corajoso". O antigo ministro das Finanças acompanhou Sócrates numa das reuniões, à quinta-feira, e teve com o Presidente um diálogo "num plano muito técnico", ao contrário do Primeiro Ministro que surgia "algo abatido" e a queixar-se de "grande dificuldade em dormir" e a quem Cavaco disse ter dado explicações que "os seus conhecimentos de macroeconomia não chegavam para a entender."
Se Teixeira dos Santos merece um tom elogioso, já Correia de Campos, Jaime Silva e Mário Lino são criticados.
Na governação socialista, a área da Saúde é descrita como "uma panela em permanente ebulição" com um ministro, Correia de Campos, "politicamente inábil".
Mas também o tom crítico do ministro da Agricultura e a falta de bom senso e incompetência de Mário Lino, nas Obras Públicas, preocupavam o Presidente.
As críticas a Mário Soares
Logo na fase inicial do livro, Cavaco Silva mostra como foi difícil o relacionamento com Mário Soares a quem acusa de, enquanto Presidente da República ter "tentado travar os ventos de mudança".
E cita como exemplo, o "esforço para impedir o sucesso da negociação com o PS para a realização da Revisão Constitucional de 1989".Anos mais tarde, ambos candidatam-se à Presidência.
Cavaco escreve:"tendo testemunhado (..) idiossincrasias da sua personalidade, não tinha dúvida de que imaginava que a campanha eleitoral seria um tapete vermelho (...) "que o reconduziria majesticamente ao Palácio de Belém".
Cavaco diz que Soares, durante a campanha eleitoral "empenhou-se a denegrir a minha pessoa fazendo insinuações quando as minhas capacidades para o cargo que ultrapassaram os limites toleráveis no combate político e democrático".
Na leitura de Cavaco Silva, o desejo de Soares de regressar à presidência visava "apagar do currículo político" a derrota na eleição para o topo do Parlamento Europeu.
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