segunda-feira

Processo público A prática de atos tão dramáticos como uma detenção só é explicável a partir de indícios factuais


Fernanda Palma
Professora Catedrática de Direito Penal
O fundamento da publicidade do processo sempre foi e continua a ser evitar o arbítrio do poder judicial e dar a conhecer o exercício da Justiça Penal. Numa sociedade democrática, a Justiça Penal realiza o interesse geral, não regulando somente as relações entre o arguido e as autoridades judiciais. A aplicação do Direito Penal é matéria de cidadania.
A divulgação de dados pela comunicação social, na sua legítima função de informar, pode conduzir à contaminação de processos e à condenação mediática de pessoas que não conseguem fazer ouvir a sua voz. E pode gerar expectativas condenatórias ou de aplicação de medidas de coação que constituem, objetivamente, um modo de pressão sobre magistrados.
No caso dos "vistos gold", fala-se da suspeita de vantagens patrimoniais para os arguidos em geral, mas, quanto a alguns, referem-se presentes irrelevantes. É da maior importância averiguar se há indícios de os vistos terem sido atribuídos a troco de uma vantagem (ou promessa) ou apenas para satisfazer o empenho do poder político na atração de investimento.
Além disso, o dolo não se basta com as motivações dos arguidos, sob pena de o Direito Penal do facto criminoso se transformar num Direito Penal do ânimo. Se estiver em causa a corrupção passiva imprópria (isto é, para a prática de ato lícito), é crucial identificar uma orientação objetiva e exteriorizada de quem emitiu os vistos a troco de uma vantagem.
Por outro lado, no caso de Sócrates não foram até agora comunicados factos, mas apenas conclusões. Os factos públicos são só os que resultam da investigação jornalística. E se eles não fossem referidos pela imprensa, a detenção seria um mistério. Ora, a prática de atos tão dramáticos como uma detenção só é explicável a partir de indícios factuais.
Estando em jogo questões deste tipo, não deve deixar-se que o plano aparentemente técnico, que é o plano da Justiça Penal, seja substituído por uma história simplificada. Sem prejuízo do segredo de justiça, cabe ao Ministério Público e ao Tribunal tomar providências para comunicar os factos e explicar os raciocínios jurídicos que fundamentam as suas decisões.
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Obs: Medite-se nas notas oportunas da profª Fernanda Palma e, nesse sentido, inste-se o juiz, o grande-juiz, o mega-juiz, o super-mega-juiz, o mega-mega-juiz a pensar que a justiça em Portugal não deve subordinar-se a uma agenda escondida, ocupando-se agora do caso Sócrates para ofuscar, cirurgicamente, o gravíssimo caso dos submarinos - que envolve Paulo Portas, a mega-fraude ao GES/BES que manda um balanço de centenas de milhões de €uros de prejuízo para a economia nacional, e ainda o não menos importante caso Tecnoforma(que envolve directamente o alegado PM) - pela sua relevância legal e até simbólica e outros casos a que a justiça tem tratado com lamentável displicência, senão mesmo incompetência e desprezo.
O tal juiz, para o ser, deverá, primeiramente, demonstrar aos portugueses que conhece bem o que ela é, ou deveria ser, e não revelar-nos uma agenda oculta e preferencial por uns casos sonegando de prova outros - que, pela sua natureza, volume e consequências para o tecido económico nacional - representa maior gravidade para os negócios da República. 
Ou será que o juiz Alexandrino anda mais preocupado com os alegados 20M€ de Sócrates (que, a ser verdade, é grave e carece de demonstração de património) do que com as centenas de milhões de €euros transferidos das constas dos clientes particulares do BES para contas particulares da família Espírito Santo?!
Um juiz a sério consegue compreender isto, e não ater-se à árvore marginalizando toda a floresta. Ainda que, no conjunto, careçam ambos de explicação, até por que é o conjunto das árvores que faz a floresta...
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