quarta-feira

A ideia de futuro de Cavaco vs a ideia de passado de Manuel Alegre


Numa leitura simplista e linear notamos que Cavaco pretende celebrar o 40º aniversário do 25 de Abril com uma ideia de futuro, mediante uma conferência internacional centrado no "espírito da democracia e na cultura do compromisso e nos desafios do desenvolvimento". Esta tem sido a terminologia desenvolvimentista do cavaquismo por se entender que o seu legado, essencialmente como primeiro-ministro, esteja associado ao desenvolvimento (material) do país, designadamente em infra-estruturas públicas e redes viárias que modernizaram a economia nacional e permitiram a emergência de uma nova classe média - que hoje está sendo destruída pelo XIX Governo (in)Constitucional que cavaco apoia a partir do seu farol de Belém.
Por contraponto, aparece uma outra ideia para comemorar o 25 de Abril protagonizada pelo poeta Manuel Alegre. O qual defende que o herói Salgueiro Maia, que teve um papel relevante na revolução de Abril e na criação da democracia pluralista, ocupe um lugar especial no Panteão. 
Aparentemente, Cavaco defende uma ideia de futuro para Portugal, e Alegre, por estar a recuperar os heróis de Abril e se preocupar em saber onde devem repousar os seus restos mortais (um pouco à boleia da recente morte de Eusébio), interpretará uma ideia conotada com o passado. 
Sucede, porém, que a ideia de futuro de Cavaco é errónea e resulta duma leitura interessada que ele faz da ideia de desenvolvimento de Portugal para se perpetuar na história e, assim, terminar com alguma dignidade o que resta do seu mandato presidencial. Pois sabe-se que este PR tem sido um elemento demasiado parcial no funcionamento do sistema político, e não, como seria desejável, a válvula de segurança que o país precisava neste momento particularmente difícil em que nos encontramos.
Por contraponto, a ideia de Alegre, no actual contexto sociopolítico e por causa da recente morte de Eusébio, ocorre desfasada no tempo e em desarmonia com aquilo que são os verdadeiros problemas dos portugueses. 
Nem a ideia de cavaco nem a de Alegre irão condicionar o futuro colectivo do povo português, pois quer um quer outro limitam-se a usar e abusar da agenda politico-mediática para impor temas de tipo emocional e, desse modo, explorar os sentimentos, as paixões e as emoções de todos e de cada um dos portugueses e extrair dividendos políticos com esse contexto dramático criado para o efeito.
Cavaco sonha em concluir com alguma dignidade o seu lamentável desempenho presidencial; Alegre procura cavalgar a onda da morte de Eusébio e a proximidade com a comemoração do 25 de Abril para, porventura, gerar uma vaga de fundo que o apoie a Belém. 
A política em Portugal ficou completamente contaminada por estes vested interest, em que os seus proponentes procuram afirmar valores e princípios republicanos mas, de facto, são as suas agendas politico-pessoais que dinamizam estas démarches políticas que acabam por confundir o povo e baralhar os eleitorados mais incautos e com menos cultura política. 
A conclusão que podemos extrair destas micro-propostas para a polis decorre do facto de a paisagem política portuguesa estar inundada de oportunistas que, a pretexto de certos factos relativos à mortalidade de certas figuras públicas (e sua trasladação para o Panteão) e à forma como se deve comemorar o 25 de Abril, procuram atingir objectivos políticos pessoais. 
Entre a aparente ideia de futuro de Cavaco e a exploração do passado por parte do poeta Alegre - ainda terá de emergir alguém que explore mais eficientemente a ideia de presente, que é a dimensão temporal mais importante para o futuro de todos nós.

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