A paz podre de Moçambique na antecâmara da guerra civil. Portugal é uma inutilidade estratégica no espaço da lusofonia
A paz podre em Moçambique parece ter chegado ao fim com a Renamo (Resistência Nacional de Moçambique, consolidada na Rodésia ao tempo do governo unilateral de Ian Smith que gozava do apoio da África do Sul, que vivia então o regime de apartheid) - e desmentiu a autoria dos ataques de que foi acusada pela Frelimo, ou seja, pelas forças governamentais de Moçambique.
Daqui nasce uma guerra de informação e contra-informação para justificar o conflito entre os dois tradicionais contendores (Frelimo e Renamo), o que confunde a opinião pública e a comunidade internacional. Sucede, porém, que o que parece estar na base deste diferendo, que já causou três mortos resultante do ataque a dois autocarros e um camião-cisterna, é a lei eleitoral que beneficia as forças do governo em prejuízo da Renamo, motivo pelo qual esta força já referiu não participar nos próximos actos eleitorais. E se assim é significa que o regresso à guerra civil é uma forte possibilidade.
Diante este quadro pode-se perguntar se algumas forças tentam passar pelas forças da Renamo e desferir ataques em seu nome só para as incriminar e, assim, criar uma justificação política e militar para as forças governamentais eliminarem a Renamo ou atacarem, no terreno, as suas posições.
Seja como for, Moçambique, que é um país pobre nos seus recursos (naturais e humanos) nada tem a ganhar em regressar à época da desestabilização - que terminou com o Acordo Geral de Paz, em Roma, em 1992 - após quase duas década de guerra civil.
No quadro deste conflito, que está em marcha, importa dizer, ao invés de há 30 anos, que Portugal já tem pouco a dizer sobre esta matéria, já que Moçambique está encravada geopoliticamente na zona de influência da África do Sul, até pela língua (inglesa) que já é mais falada do que o português. Logo, neste equilíbrio de poder que pode estar em recomposição, aquilo que for a posição da África do Sul, em termos políticos, militares, económicos e diplomáticos relativamente a Moçambique, sobreleva do que eventualmente forem as ténues considerações lusófonas de Portugal sobre a matéria. Aliás, importa sublinhar que em matéria de LUSOFONIA o XIX Governo Constitucional não tem nenhuma política para o sector.
Lusofonia, no governo Passos coelho, pura e simplesmente, não existe, o que diminui substancialmente a influência politico-diplomática de Portugal no espaço lusófono. E, em particular, nos bons ofícios e nas diligências diplomáticas que Portugal podia desenvolver na tentativa de resolução destes conflitos que podem generalizar-se ao conjunto nacional.
Por outro lado, a componente económico-empresarial de Portugal também sai profundamente diminuída desta ausência de estratégia lusófona, porquanto os nossos empresários (e empreendedores em geral) perdem a umbrela do Estado em abrir possibilidades de negócio naquele região do mundo banhada pelo Índico.
Se, como temos vindo a constatar pela natureza dos investimentos angolanos (não reprodutivos para a economia portuguesa) - a lusofonia serve aqui uma função específica de Special Financial Vehicle (SFV) - ainda que alguma opinião pública acreditasse que aqueles investimentos (banca, telecomunicações e pouco mais) serviam uma grande estratégia de desenvolvimento e consolidação das duas economias, a verdade é que os desígnios patentes nos investimentos da família Eduardo dos santos em Portugal visam ser uma plataforma giratória para atingir o imenso mercado europeu.
A esta luz, Portugal não passa duma barriga de aluguer daqueles investimentos, angolanos seja porque a crise assim o dita, seja ainda por falta de visão e estratégia para o futuro da lusofonia. Tudo isto se agrava se notarmos quem hoje ocupa o Palácio das Necessidades, rui machete, uma pessoa sem nenhum perfil para a função que se revelou, perversamente, incompetente e um pirómano das relações luso-angolanas por factos e declarações por demais conhecidas, além da violação grosseira do rule of law que um jurista deveria conhecer. O que faz de machete, além de incompetente, um pateta.
Naturalmente, as relações e o peso relativo que Portugal mantém com Angola não têm comparável expressão com as relações com Moçambique, mas o que importa avaliar, a partir da geografia de Luanda e de Maputo é que ambos sabem, cada um à sua maneira, que Portugal é hoje um pequeno protectorado da "República da Troika" e que Portugal, em termos político-diplomáticos, conta ZERO para qualquer tentativa de mediação de conflitos que estejam em curso no chamado espaço da lusofonia, ou que aí se venham a agravar no futuro próximo.
Se assim é, encontramos em mais esta fragilidade de uma das dimensões da política externa portuguesa, uma ausência de pensamento, estratégia e de acção de que o XIX Governo (in)Constitucional é o primeiro e último responsável.
Numa palavra: para certa África - Portugal não passa hoje de um veículo financeiro para atingir a Europa, e ainda por cima está naquela posição colonial pré-independência que Angola, Moçambique, Guiné, Cabo-Verde, S. Tomé e Príncipe e até Timor-leste tão bem conhecem e de que, provavelmente, guardam má memória.
Isto revela que o governo passos coelho, além de ser tremendamente incompetente intra-muros, converteu Portugal numa tremenda inutilidade estratégica no espaço da tão badalada lusofonia.
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