A recessão chegou à fé dos portugueses
Consta que na peregrinação de Outubro a Fátima, na tradicional procissão das velas, o santuário ficou meio cheio meio vazio. Ou seja, os peregrinos, os crentes, todos os religiosos afluiram em menor número a Fátima este ano. Provavelmente, a fé sofreu um tal rombo que até se registou um número menor de doentes pedindo pelo seu milagre, um menor número de pessoas a rastejar um ou dois kilómetros para que, lá no alto, "alguém" faça um milagre por uma perna partida, por um cancro, por uma criança deficiente ou por uma outra doença ou objectivo que atormenta os mais desvalidos e deserdados da terra. Sempre foi assim, e Fátima tem vivido com grande proveito à sombra tutelar dessa religião do milagre que, para se revelar mais proficiente, socorre-se da venda intensiva de objectos de cariz religioso que os crentes não dispensam para reforçar a sua crença no milagre. Mas os tempos já não são o que foram. Neste quadro, que está em linha com a crise económica que hoje se vive em Portugal, que atinge sériamente as empresas, as famílias e as pessoas, e até o rating da República, a fé encontra-se também em recessão, já que diminuiu substancialmente o número de fiéis que anualmente demandavam Fátima em busca de conforto espiritual e, quem sabe, de um milagre para as suas vidas. Desta feita, revela-se mais problemático que Lúcia, F. Marto e Jacinta consigam converter mais fiéis para a igreja. E uma igreja com menos fiéis entra em crise. Se esta tendência se replica por mais uns anos, o resultado poderá ser problemático para todo o comércio circundante que alí faz os negócios da alma, usando e abusando da crença, da credulidade e até da ingenuidade das pessoas, além daquelas que são regularmente assaltadas pelos carteiristas profissionais que ali montam arraiais nesta época religiosa. Neste quadro económico e social altamente recessivo, a mensagem de fé tem menor penetração nas mentes e nos corações das pessoas, preocupadas que estão com outros temas mais prioritários em suas vidas. Isso poderá ajudar a explicar esta menor procura por Fátima e pelos seus serviços religiosos, mas que é um sinal paradoxal, já que são em períodos de maior incerteza e crise que a fé aumenta e tende a dilatar as suas formas e manifestações de modo a compensar os mais desvalidos da terra.
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