sexta-feira

Com ferros se mata, com ferros se esfola: José António Saraiva com salário e casa penhorados

José António Saraiva está com o seu salário e a sua habitação penhorados (Carlos Lopes)
Público
Por causa desta acção executiva, José António Saraiva está agora com o seu salário e a sua habitação penhorados para garantir o pagamento de 110 mil euros da indemnização pedida, acrescidos de juros e custas do processo. De acordo com fonte ligada ao processo, o director do semanário pode ficar com um rendimento mensal reduzido a menos de 1500 euros, uma vez que a lei permite a penhora se aplique à totalidade do rendimento mensal acima de três salários mínimos nacionais (abaixo deste valor aplica-se a regra de executar até um terço do salário).
Estas acções executivas foram interpostas por Rui Pedro Soares alegando que o jornal e o José António Saraiva não cumpriram a decisão do Tribunal Cível de Lisboa que, em Maio, condenava o director e duas jornalistas por desrespeitarem as providências cautelares que proibiam a divulgação de notícias sobre o processo Face Oculta envolvendo o ex-administrador da PT e por não retirarem da internet as notícias.
Nesse acórdão, o tribunal dava novamente razão ao ex-administrador da Portugal Telecom nas razões que invocara nas providências cautelares de Fevereiro. Proibia o semanário de publicar, em papel ou na internet, transcrições de escutas em que Rui Pedro Soares tenha participado e condenava o director e as duas jornalistas autoras dos textos a pagar respectivamente 10 mil euros e cinco mil euros por cada violação das providências cautelares - ou seja por cada notícia publicada. E ordenava a retirada dos textos da edição do Sol na internet.
Ao que o PÚBLICO apurou, Rui Pedro Soares mantém a intenção de actuar contra as duas jornalistas que assinaram as peças, Felícia Cabrita e Ana Paula Azevedo, também com acções executivas. Quanto à acção contra o semanário, a desistência da instância não significa abdicar do direito à indemnização, mas apenas suspender a execução desse direito.
Não possível obter um comentário de José António Saraiva mas Felícia Cabrita insurgiu-se contra este tipo de acção judicial. "Este tipo de expediente, a nível cível, é uma forma de intimidação e uma tentativa de liquidação do jornal e de jornalistas." Depois dos recursos que jornalistas e director apresentaram é bem possível que em breve levem o caso ao Tribunal dos Direitos do Homem, diz Felícia Cabrita. "Existe sem dúvida, nos últimos anos, uma tentativa de estrangulamento da liberdade de imprensa em Portugal."

Obs: É sabido que nos últimos anos em Portugal tem proliferado um certo "jornalismo-mastim" que torna essa corporação, ou parte dela, em agentes politicamente irresponsáveis. O resultado, em inúmeros casos, é incriminar pessoas inocentes na praça pública, que depois não têm a capacidade e a oportunidade de se defender para limpar a sua imagem. É sabido como alguns jornais fazem manchetes acusatórias e quando são obrigados judicialmente a repor a verdade remetem para as páginas menos lidas os pedidos de desculpa. O pedido de indemnização requerido pelo visado é, ou pode ser, um sinal de que a prática do jornalismo em Portugal tem que ter regras claras e um papel ético, sob pena de as indemnizações serem pesadas e o alegado crime não compensar.

Este "jornalismo-pitbull" - que teve a sua expressão mais lamentável no Indy de Paulo Portas no combate cerrado ao cavaquismo nas décadas de 80 e 90 do séc. XX - deve ser aplacado, pois a sua limitação constitui uma valorização da responsabilidade dos jornalistas, mormente dos jornalistas políticos, e um estímulo à liberdade de expressão, ao pluralismo e à democracia.

Por vezes, as pequenas vendettas jornalísticas saem caras, e a ser assim algo começa a mudar em Portugal. Alguns jornalistas que se cuidem, pois deixou de valer tudo na publicação das matérias mais escaldantes. Ainda que seja curioso registar que quando a temperatura aperta lá se evoca o Tribunal dos Direitos do Homem, mesmo que aqueles que em vão o invocam devam, préviamente, ter mais cuidado com o que escrevem para não vender lixo noticioso por rigor informativo que, em muitos casos, resulta nestes penhores.

Balsemão deve estar radiante, feliz dando saltos e pulos na redacção do Espesso. Just a feeling...

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