sexta-feira

Os media sociais e a agregação de interesses corporativos resultante da crise e da recessão

Os media sociais: uma centralidade cada vez maior nas nossas vidas ante a quebra da mediacracia agravada pela crise e pela recessão económica e a criação de novos hábitos de cultura contemporânea.
Não raro vejo directores de jornais integrarem o facebook, coisa impensável há uns anos. Esse gesto não é, seguramente, ingénuo e desinteressado. Certamente, existe um gosto pela comunicação com os outros, pela troca de experiências, imagens e opiniões, mas no caso concreto destes players o que se afigura é o seguinte: eles, como alguns de nós, sabem que a mediacracia clássica está de pantanas, os leitores compram menos jornais, e estes, enquanto empresas que são, sofrem brutalmente com essa quebra de receitas, seja na venda directa de exemplares seja na consequente quebra de Pub., a verdadeira galinha dos ovos de ouro do metier.
Há dias fiz uma experiência meio previsível: convidei um desses players cuja opinião por vezes até relevo, mas prontamente ele aceitou o meu “telepedido de amizade virtual”. Para mim o gesto não teve nenhum significado, confesso, a não ser confirmar a minha tese segundo a qual o mercado mudou drasticamente no mundo dos jornais, facto que obrigou a classe dirigente dos media clássicos, a tal mediacracia que vive dos jornais, a instalar arraiais no Facebook (e noutros fora electrónicos) a fim de dizer, senão mesmo gritar: vejam, olhem bem para mim, eu estou aqui produzindo a minha opinião que todos Vós devem ler e reler minorando, na medida do possível, o passivo resultante da quebra da venda de jornais diários e semanários de que diários como o Público e o DN se têm ressentido nos últimos anos.
Isto, em rigor, não é novidade para ninguém, mas talvez seja a forma peculiar que o sentido desta mudança está a trilhar, ou seja, aqui o que releva é o comportamento exibicionista dos players, ainda que o façam de forma aparentemente discreta e desinteressada a fim de serem eficazes no atendimento dos seus interesses e objectivos.
Vemos de tudo: directores de jornais impondo o seu nome e a sua presença à massa anónima de pessoas que projecta no Facebook uma identidade a fim de que a sua opinião nos jornais que dirigem encontrem uma 2ª auto-estrada fora dos caminhos apertados em que já navegam.
Poder-se-á dizer: todos nós temos interesses, é certo, e amanhã eu próprio me socorro(rerei) dessa rede de redes no imenso rizoma a fim de potenciar o lançamento de um projecto editorial, mas aqui o que é subversivo é o carácter sistemático e organizado com que certos players usam e abusam da bonomia da tal massa anónima que dá o “rabinho e oito tostões”, como se dizia em tempos, para ter uma dessas vedetas do espaço mediático na sua rede virtual de amigos.
E à medida que as pessoas continuam a produzir análise e opinião em sites e blogues essa mudança, no âmbito das redes sociais, ainda se torna mais patente, já que as pessoas tendem a actualizar o seu estado por essa via, e logo entram em competição para ver quem se torna o autor da análise, da opinião ou do evento mais espectacular, com a nuance de que tudo hoje flui à velocidade do som.
Imagine-se que sou autor duma opinião influente e produzo uma opinião sobre as vantagens de passar férias em Albufeira no Hotel X, a tendência das pessoas que seguem com atenção a minha opinião é a de poder dar-lhe uma utilidade prática, e o mesmo se diga à generalidade dos eventos que as nossas sociedades avançadas produzem actualmente. Ou a recomendação de um livro que depois tenderá a ser lido pelas pessoas que respeitam essa opinião e a seguem atentamente. Sendo certo que cada uma dessas abordagens contribui para valorizar a imagem de marca de cada um de nós no rizoma em que todos – mais ou menos – vamos comunicando.
De certo modo, esta comunicabilidade directa e quase instantânea é um aferidor de vidas pessoais no tecido colectivo, permitindo que cada um de nós compare o que cada um vai fazendo, ainda que superficialmente, e concluir se a vida está a valer a pena no quadro destes novos parâmetros avaliativos.
Mas o que procuro sublinhar nesta pequena reflexão é, de facto, compreender as motivações profundas de alguns players quando procuram introduzir a sua identidade em redes como o Facebook, sobretudo se considerarmos a circunstância gritante de que os índices de vendas de jornais e de audiências televisivas (o rádio talvez seja mais discutível…) tem vindo a diminuir drasticamente nos últimos cinco anos, empurrando essas empresas para a necessidade de produzir produtos alternativos e de seguir caminhos associados ao espaço virtual, de que a sua apropriação também acaba por ser um objectivo a atingir no campo desta nossa tele-realidade.
O passivo deste esquema emergente de comunicação virtual é sermos empurrados para interesses editoriais, económicos ou outros que determinadas empresas buscam ante a crise sistémica em que mergulharam; mas o activo é certamente enorme no âmbito das vantagens dessas redes sociais, compostas de “grupos de amigos” alinhados em torno de círculos de recomendação de imagens, de vídeos, de livros, de serviços, de filmes, enfim, dum sem número de bens culturais e outros de que já não podemos abdicar em razão do tipo de sociedade, de economia e de civilização que fomos criando ao longo dos tempos.
E para que esta relação de comunicação se mantenha há que valorizar esse cimento – traduzido em capital-confiança – de que hoje as sociedades são feitas, mas que, paradoxalmente, também sentem muito a sua falta.
Pacific Heights & Joe Dukie - Peace

Pink Floyd - Money - Live 8

À Marília e ao ZD na esquina do tempo, ou como diria Sto Agostinho - o Tempo é o espaço onde as coisas se desenrolam..

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