Resiliência - por António Vitorino -
O sublinhado é nosso.
Esta semana passaram quatro anos sobre os atentados terroristas de Londres. O mesmo é dizer que nos últimos quatro anos não ocorreu nenhum atentado perpetrado pelos grupos radicais de inspiração islamita em solo europeu. Contudo, os registos policiais indicam que se verificaram, no mesmo período de tempo, centenas de tentativas que foram evitadas ou desarticuladas.
O que é que estes dados significam?
Desde logo que as acções policiais e dos serviços de informações, de prevenção e dissuasão de actividades terroristas, têm tido resultados positivos. É bem verdade que estamos perante as chamadas "vitórias silenciosas", onde o sucesso se traduz na manutenção da normalidade. Mas são sucessos que importa registar como homenagem à capacidade de intervenção das forças de segurança que têm a responsabilidade de prevenir a ocorrência deste tipo de actos criminosos.
Do mesmo modo estes dados permitem concluir que foram aperfeiçoados os mecanismos que limitam a margem de acção dos grupos terroristas, desde a videovigilância até ao seguimento dos movimentos transfronteiriços, passando pelo controlo do acesso a produtos e materiais com potencial utilização no fabrico de explosivos. Mais complexa tem sido a questão do acompanhamento do uso da Internet como meio de difusão das doutrinas radicais e de recrutamento de terroristas suicidários.
De um modo geral, esta evolução indicia que os grupos atomizados que se reivindicam da Jihad Islâmica e preconizam o recurso a métodos terroristas continuam activos, mantêm as suas conexões, mas não lograram passar a um estádio superior de organização que potenciasse a sua capacidade de gerar vítimas entre as populações civis dos países europeus. Por contraste, chegam registos de um maior entrosamento destas organizações terroristas em países da periferia da própria Europa, designadamente do Magrebe, para além da continuada actividade terrorista no próximo Oriente, muito em especial no Iraque.
Estas as razões que levam cerca de 70% dos europeus, nos vários inquéritos de opinião pública, a continuadamente colocarem no topo das ameaças à sua segurança o terrorismo. Tem-se mesmo a sensação de que a consciência aguda do potencial desta ameaça é mais elevada no conjunto dos cidadãos do que da parte de muitos dos responsáveis políticos…
Esta consciência aconselha, pois, a que não se tome por adquirida a aparente acalmia destes quatro anos. Não só porque, como os números evidenciam, persiste uma actividade larvar, a exigir constante atenção das forças de segurança e dos serviços de informações, como em matéria de luta antiterrorista a lei e a ordem exigem sucessos diários enquanto o triunfo dos terroristas basta-se com um sucesso num só dia!
Esta troca desigual impõe um esforço enorme por parte das forças e entidades que têm a seu cargo a prevenção, do mesmo modo que exige uma troca de informações internacional que leva tempo a enraizar nos hábitos culturais e nos procedimentos das polícias, dos tribunais e dos serviços de informações.
Os especialistas nestas matérias têm vindo a chamar a atenção, de forma cada vez mais insistente, para a denominada resiliência das sociedades em relação à ameaça terrorista. No essencial o que está em causa é a tomada de consciência, por parte dos cidadãos, dos constrangimentos que resultam da prevenção do terrorismo e das atitudes e comportamentos a tomar colectivamente no caso de um atentado ser perpetrado logrando fazer vítimas entre a população.
Esta resiliência das sociedades que são alvos potenciais ou reais de atentados terroristas assenta num princípio fundamental: o de preservar a natureza aberta, plural, democrática e respeitadora das liberdades fundamentais, ao mesmo tempo que o corpo social previne um atentado e reconstitui a sua coesão, no caso infeliz de ele se registar. Olhando para a sociedade espanhola desde 2004 para cá e para a sociedade inglesa nestes últimos quatro anos podemos dizer que as duas sociedades europeias que foram vítimas da barbárie terrorista deram provas de uma notável resiliência que deve ser motivo de apreço e admiração.
Obs: AV faz aqui um balanço interessante destes últimos anos em matéria de produção de atentados terroristas e conclui que, por vezes, é mais importante conseguir eficientemente evitar ou prevenir o mal do que andar a publicitar essas acções dos serviços de segurança dos Estados. Em rigor, trata-se dum elogio à eficácia da intelligence dos Estados europeus que mais e melhor têm sabido reagir com discrição e eficácia na desarticulação de atentados terroristas. E essas são, a par doutras, as vitórias silenciosas do nosso tempo, que passam por conquistar a tal normalidade. No séc. XX eram coisas banais (até porque a Guerra e a Paz era algo previsível, quase programável no tempo e no espaço), hoje, ante a incerteza do atentado suicidário de cariz globalitário e catastrófico, são valores preciosos na manutenção da segurança, da liberdade e da própria coesão intraeuropeia (e global). Felicite-se, pois, o articulista por se lembrar de fazer o balanço dum valor essencial a todos nós: a Liberdade. Um valor que pouco ou nada vale sem bons serviços de intelligence. Por isso, aposte-se neles, sobretudo em períodos (de aparente) calmia.
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