terça-feira

Breves ao Notas Soltas de António Vitorino na RTP1

Ontem António Vitorino sistematizou alguns dos factos da semana de que aqui procuramos muito sumariamente reinterpretar.
Ainda que na política à portuguesa - uma evidência que remonta ao tempo do cavaquismo, se detecta um desvio entre o anunciado e o realizado, ou seja, entre o que Belém pensa e diz enquanto tal, e o que Belém dizia ao tempo do cavaquismo - enquanto o actual locatário de Belém era PM.
Dito isto, e tomando como referência o que o analista AV ontem sistematizou, deixo aqui algumas notas para ulterior reflexão.
A saber:
1. Cavaco aceitou contrariar-se através do agendamento das eleições legislativas num acto eleitoral distinto do das eleições autárquicas. Foi esse o sentir dos partidos auditados por Cavaco, foi essa a decisão de Belém, embora Cavaco quisesse fazer o seu habitual número predilecto: o tábu. Um tábu que anulou o efeito de arrastamento que, à partida, interessaria muito a Ferreira leite - que pensou que se os dois actos eleitorais fossem em simultâneo o psd beneficiaria com mais uns votinhos manhosos, captados em resultado do tal efeito de arrastamento ou do sistema de vasos comunicantes - que, em rigor, imputa(ria) um verdadeiro atestado de estupidez ao povo português. Mas essa é a crónica relação que a srª Ferreira mantém com o leitorado.
2. As sondagens são, cada vez mais, dada a framentação sociológica, um exercício pantanoso dada a dificuldade em arrumar e redistribuir os indecisos, o que baralha as previsões eleitorais e converte as sondagens em exercícios de magia.
3. Ferreira leite esteve mais à vontade, mais conversadora, não cometeu nenhuma gaffe e cavalgou a onda da tvi e do não ao TGV - aproveitando uma sondagem aos portugueses em que a vontade aí expressa é a de adiar o investimento. O que revela que leite afirma-se pela negativa, pois nenhuma ideia estruturante para o país alí se identificou.
4. Caberá ao PS desenhar novas propostas de políticas públicas e diferenciar-se do abismo e da ausência de ideias e propostas do actual psd, de resto a srª Ferreira, para afirmar o seu legado democrático - já disse que se for governo (credo!!!) fará tudo diferente do PS, excepto a reforma da Segurança Social. Já é alguma coisa... Infelizmente, o PS não poderá dizer o mesmo, reconhecendo uma única ideia a Ferreira leite. E não será por maldade, certamente!!!
5. Os indicadores de investimento e de consumo do INE - ainda que algo positivos estão longe de gerar um turn-over na actual crise, embora seja positivo esta alteração de percepção face à economia, sendo certo que o emprego é actualmente o problema n.º1 da economia nacional. Infelizmente, o manifesto dos 28 assim não o entendeu, o que revela que os economistas agora também estão apostados em andar por aí a fazer política-partidária, e alguns com muito pouco jeito. Depois até serão esquecidos como economistas. É mais um sinal dos tempos.
6. O dossier TVI e a aquisição do capital da Media Capital pela PT - mostrou como o governo esteve mal, objectivamente mal e trapalhão, com Mário Lino a fazer das suas, ou seja, contradições. Desde que se ligou essa aquisição à substituição da linha editorial da estação de Queluz e à dispensa de Moniz do cargo que ocupa - o governo ficou sem espaço de manobra para fazer o que quer seja. Se bem que do ponto de vista da estratégia empresarial faz sentido a PT ter uma estação a fim de potenciar os seus conteúdos e competir com a Zon num mercado cada vez mais agressivo.
De resto, também faz sentido - em termos de racionalidade empresarial - a PT entrar no capital espanhol - porque é também essa a aposta da Telefónica nas empresas portuguesas. Mas o mais curioso em toda esta trapalhada é que Moniz concordou com os termos do negócio e até ficaria no cargo que actualmente ocupa.
Quanto à restante trapalhada deste dossier quente, atrevo-me a dizer que ela foi de monta pelo facto de AV se encontrar no estrangeiro, e estando abroad parece que o governo fica privado de ajuda e de conselho inteligente e entra em remoinho e acaba por espalhar-se. Numa palavra: AV não pode estar fora muito tempo, estando o governo entra em regime de auto-trapalhada...
Sugira-se, pois, a AV que, doravante, não se ausente do país por mais de 24h. Ainda assim, quando se comparam os lapsos do Governo com a possibilidade tenebrosa de Ferreira leite ser governo os portugueses não deverão pensar duas vezes e investir em Sócrates.
7. Esta questão correlaciona-se com a Golden share que o Estado ainda detém na PT e que está em contradição com a doutrina jurisprudencial do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias. Posição que não se compreende a partir do momento em que tais empresas já não se encontram em regime de monopólio, mas sim aberta às regras do mercado competitivo, o que obrigará de futuro à identificação de soluções mais criativas e menos impositivas na relação do Estado com o sector empresarial em que, directa ou indirectamente, ainda detem participações.
Estranho, ou talvez não, é a circunstância de Ferreira leite levantar o braço e Cavaco, no take seguinte, estar a movimentar a orquestra - falando na transparência da PT.
Ou seja, Cavaco segue a sua pupila, e se dantes era Ferreira leite que servia de porta-vox não autorizada de Belém, parece que agora os termos da relação se inverteram, cabendo a Cavaco ser o porta-voz oficial da actual comissão liquidatária do PSD - com o intuito de ajudar a srª Ferreira a ser alguém na vida política nacional.
Por razões óbvias, não o conseguirá.