segunda-feira

Santana Lopes: de "menino guerreiro" a Dom Sebastião

Sebastião, rei de Portugal (pintura a óleo atribuída a Cristóvão de Morais, patente no Museu Nacional de Arte Antiga). A representação do rei vestido com armadura e acompanhado por um galgo retomam simbolicamente a imagética imperial do seu bisavô D. Manuel e do seu avô Carlos V da Alemanha., in Wikipédia
Em 1º lugar, e atendendo aos cognomes que Santana lopes reclama para si próprio, entendo que deveria pedir desculpa à história e aos visados por frustrar o alcance e o peso simbólico que eles representam na história. O que contrasta com as performances e as cenas políticas a que Santana já habituou o país - que, em rigor, não o leva a sério.
Agora o candidato pelo psd a Lisboa afirma um desejo: ser mais ouvido pelos munícipes do que o é a líder do seu partido no País, Ferreira leite, que inicialmente se opôs ao seu nome para Lisboa. E para que Santana seja ouvido, terá de fazer duas coisas: andar de microfone na mão falando no Túnel do Marquês (o tal que é mais usado pelo moradores da Linha do Estoril que depois pagam os impostos ao Isaltino de Morais) e apostar na coligação com o cds/pp.
Pelos vistos, já está fazendo ambas as coisas, na medida em que já citou o Túnel uma centena de vezes e, por outro lado, precisa da muleta de Portas para não ser esmagado na capital - que deixou num pântano quando se serviu dela para trampolim político.
Mas o mais curioso é a gramática política utilizada pelo antigo e pior primeiro-ministro de que a história do post-25 de Abril guarda memória: já não deseja ser o "menino-guerreiro", doravante Santana, depois de ter sido literalmente corrido do Governo (por má governação e degradação do normal funcionamento das instituições) pelo então Presidente da República, Jorge Sampaio, quer encarnar na pele do D. Sebastião, e lutar contra o nevoeiro (in RTP), como diz.
Ouvir isto a frio é quase uma barbaridade histórica, mas após pensar um pouco conclui-se que, afinal, Santana "tem razão" no uso e abuso dessa terminologia. Vejamos: D. Sebastião era neto do reio João III, herdeiro do trono após a morte de seu pai. Trata-se, pois, de um herdeiro que dava continuidade à Dinastia de Avis, e ficou conhecido como O Desejado.
Ora, consabidamente, seria assim que Santana, passe a analogia, gostaria de ser tratado e recordado, em vez da "matrafona política" em que se tornou, esfrangalhando as condições de vida na cidade de Lisboa, primeiro, escavacando o País, depois, naquele semestre negro em que sucedeu monárquicamente a Durão Barroso na sequência da fuga deste para Bruxelas. Recorde-se, apenas por uma curiosidade histórico-financeira, que então (2004) Portugal tinha um défice quase nos 7% - ultrapassando em duas vezes o tecto do Pacto de Estabilidade e Crescimento/PEC imposto pela UE.
Mas D. Sebastião também era memorado pelo O Encoberto ou O Adormecido, devido à lenda que narra o seu regresso numa manhã de nevoeiro a fim de salvar a Nação. Talvez por isso não admira que, mais uma vez, Santana lopes tenha escolhido nomes, metáforas com as quais se possa identificar a fim de capitalizar simbólica e políticamente aquilo que elas representam na nossa memória colectiva.
Sucede, porém, que os portugueses, quando fazem apelo à sua memória colectiva por refª ao dito autarca da capital - apenas recordam uma gestão ruinosa e megalómana, o caos urbanístico e um caldo de cultura organizacional que convidava à corrupção. Eis a "lenda" de Santana que, apesar de agora se auto-cognominar D. Sebastião para lutar contra o nevoeiro - apenas dá de si, mais uma vez, uma imagem ridícula e pouco séria de mau político, ainda por cima reincidente representando o pior do passado recente na política autárquica e nacional em Portugal. Além de um usurpador da história e dos nossos símbolos colectivos que ele deveria saber respeitar.
Será este o regresso numa manhã de nevoeiro para salvar Lisboa agora em versão santanista?! Assim como assim, seria preferível o mergulho no rio Tejo de Marcelo, em 1989...
Aliás, se Santana lopes tivesse alguma vergonha política ele interrogar-se-ía acerca do método escolhido para a sua nomeação de Primeiro-Ministro de Portugal, aquando da saída de Durão para a Comissão Europeia. Como se tratou duma nomeação quasi-monárquica, sem congresso talvez isso explique a razão pela qual santana hoje recorre à metáfora do D. Sebastião, neto do rei João, para se pôr novamente em bicos-de-pés numa cidade que ajudou a destruir e da qual se serviu para vôos mais altos: ser PM.
Hoje, Santana já não quer ser deputado e ninguém lhe liga e também já está farto de andar por aí - resolve armar-se em O Desejado e atirar-se a Lisboa como gato a bofe - na vã esperança de que os lisboetas, mais uma vez, enfiem o barrete deste ex-PM duma República mas que foi empossado no cargo de forma monárquica.
Só assim se compreende o recurso abusivo ao D. Sebastião e à evocação histórica. A não ser que santana pense fazer uma expedição a Marrocos a partir da Torre de Belém e retomar as nossas possessões do Norte d' África como forma de relançar o comércio da Baixa de Lisboa e, assim, reforçar as nossas posições geoestratégicas em todo o Norte de África. As quais eram, diga-se em abono da verdade, uns autenticos sorvedouros de dinheiro à então monarquia, à semelhança da gestão perdulária santanista nos anos em que foi edil da capital.
Tal como D. Sebastião, parece agora poder concluir-se, pelo que se sabe da história de ambos, que quer D. Sebastião quer Santana lopes desenvolveram uma personalidade mimada e teimosa. Creio que são "qualidades" que não fazem um bom autarca, muito menos na capital do País.
É por isso que é infeliz e desadequada mais esta candidatura de Santana Lopes. Para não ficarmos totalmente deprimidos, resta-nos, talvez, recuperar o velhinho José Cid e ouvir o que ele nos canta...
Ainda que numa vã tentativa de salvar mais uma vez o infeliz do inevitável.
El Rei D. Sebastião - José Cid/Quarteto 1111