domingo

Regeneração do sistema por recurso ao escândalo

Pode-se regenerar um sistema social, económico e político recorrendo às reformas, às evoluções e ajustamentos democraticamente consentidos nas sociedades contemporâneas, as mesmas que a srª Ferreira Leite quer suspender à laia de semestre para meter o mundo na ordem. Neste registo, só mesmo a srª leite...
Mas aquilo que hoje o caso-BPN está a gerar no país-político - e também já no país-profundo - é que é o efeito de escândalo que assumiu a direcção do processo, comandando quer as declarações judiciais, quer as declarações que emanam do miolo do sistema politico-partidário - em todo o seu espectro. Louçã, do BE, nestas coisas - é o Torquemata de serviço e antecipa-se aos tribunais e pede logo que rolem cabeças.
Aliás, se Louçã mandasse neste País já todos os membros do Governo e os Juízes teriam sido demitidos dos respectivos cargos. Muito provavelmente, até no hemiciclo o deputado já estaria a falar sózinho, porque nessa leva o bom do Louçã já teria despachado também todos os deputados que não concordassem com ele.
Mas o que é de sublinhar neste caso é que ele recorta o cenário da Disneylândia - gerando esquizofrénicamente um lado imaginário em todos nós e, por outro lado, um biombo que dita o fim da realidade - para além de certos limites. Ora, é neste plano simbólico que podemos compulsar três casos completamente distintos entre si (na forma e no conteúdo) - o Watergate nos EUA, a pedofilia em Portugal e, agora, este escândalo financeiro.
Casos que só são aqui referenciados porque, apesar das diferenças profundas entre si (repito), parece estarem ligados num único nó górdio: é sob o efeito do escândalo que o sistema judicial e político parece operar com vista à regeneração das virtudes públicas (e republicanas) - cujo imaginário visa criar uma nova realidade, mais aceitável na sociedade.
Deste modo, o recurso ao expediente do escândalo é, por um lado uma homenagem rendida à lei e, por outro, resultado de vinganças pessoais ocorridas na referida instituição, poderá ser a tal injecção moral e política que o país precisa para recuperar a sua CONFIANÇA nos mercados, ié., na economia e na sociedade.
Quantas vezes já as sociedades se regeneraram por este efeito de moralidade pública, e logo hoje em que pela 1ª vez em Portugal um banqueiro fica detido em regime de prisão preventiva - anulando assim a hipótese de fuga e destruição de prova.
Numa palavra, os sistemas políticos são hoje mais complexos do que nunca, pois se ele tende para a regeneração sob o impulso do dispositivo-escândalo (por sua vez alimentado pela indignação e por algumas vendetas, chantagens e tentativas de extorsão) - então estaremos em condições de defender que são esses os vectores que trabalham espontaneamente para a ordem do capital.
Mais uma vez o que aqui falhou, e mais do que a supervisão do BdP, é o sistema judicial que o país tem, um dos mais improdutivos, injustos e inúteis do mundo.