O Sr. Mário e o Sr. Raul Bernardino: um pescador e um sapateiro
Este homem é o Sr. Mário, pescador de Sines, e alí está concertando a rede que todos os dias se vai partindo, e uma rede partida significa peixe na água, em vez de estar no barco dando lucro. É uma vida dura, condicionada por horários de DJ, mas mal paga e pouco considerada socialmente. Conheci-o na Doca-Pesca de Sines pela manhã, cedo. Apertei-lhe a mão e, no final, após obter dele autorização para aqui o publicar, senti-me mais homem. Eu próprio poderia ser pescador doutras ideias, e conheço muito académico, investigador, político e gestor que nem para pescador dariam. E se um dia me dissessem: "olha apanhei um peixe, vamos comê-lo..." Eu duvidaria sempre!!! No entanto, saí dalí com a impressão que ele me contou uma outra história: que tinha avistado o Lawrence da Arábia a nadar mari-poza na praia Vasco da Gama alí ao lado. E depois contara histórias de tempestades em que os cardumes no alto mar, pura e simplesmente, saltavam para os tanques do navios-pesqueiros que depois aportavam a abarrotar de peixes na doca. Outras vezes, pensando eu através daquele olhar sobranceiro e de olhos rasgados de felino alentejano - porque supõe que estou alí apenas para o enganar - (ou vender-lhe algum motor gripado a dois tempos para uma embarcação que mete água) - conta que o peixe é como dinheiro e os diamantes, desaparece!!! Como visões por entre aquela manhã de nevoeiro, de naufrágios e de salvamentos milagrosos de uma vida estafada, rotinada sem, afinal, nunca ter feito um cruzeiro porque - além de caro - também poderia vomitar devido aos enjôos.
- Este outro, é o Sr. Raul Bernardino, sapateiro de Sines, o único local - e dos poucos no País, apesar deste país ser um "país de sapateiros", mas isso é outra estória. Também tive o prazer de lhe apertar a mão. Twice. Outro bom investimento. Depois apresentou-me a sua menina: a sua "formiguinha-trabalhadeira" que o ajuda nas tarefas que hoje já são quase completamente executadas por máquinas industriais. Também fiquei com a sensação que me contara outra história. Não que bin laden da Al Qaeda - procurado pelos americanos há anos - fora visto em Fátima, pairando sobre uma azinheira e mais recentemente a apitar o jogo das meias-finais Portugal-França - tendo a sua aparição sido presenciada por 3 pastorinhos viciados em cola de sapateiro, mas memórias dum mundo diferente. Um mundo em que as pessoas calçavam bem, andavam bem, os filhos eram vivos, e a expectaciva geral de vida era outra. Até o sol era diferente e a areia mais fina e macia. Se esta maquineta falasse - mandaria este mundo à m... Por entre umas marteladas, umas prensadas e também umas cozidelas. O mundo há muito que deixou de ser artesanal, mas também não é melhor por isso. Enfim, dois retratos, dois mundos do nosso mundo. Um mundo que é o deles e o meu. O nosso. Na água e em terra. Também isto é para eles ainda que nunca o vejam... Porque o Plano Tecnológico sofre de sérias limitações e dá-se mal com as zonas costeiras...
Nota: duas grandes lições de vida, por isso estou grato a ambos.
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