A "vaca" na e da economia portuguesa
Recentemente o governo publicitou cerca de meia dúzia de empresas multinacionais dispostas a investir em Portugal os seus capitais, recursos financeiros e saber-fazer. Essas empresas, na prática, elegeram Portugal para investir e fazer bons negócios. Em conformidade o governo preparou esse caminho de sedução de investimento externo: desburocratizou o funcionamento da administração pública, fez novas leis amigas do investimento e do empresariado, acelerou processos e agilizou procedimentos administrativos, vendeu a ideia do "simplex" e, desse modo, convidou as pessoas e as organizações empresariais a investirem cá dentro. De tudo era esperável que a produtividade aumentasse, os rendimentos das famílias disparassem porque os níveis de emprego também aumentariam em conformidade, o consumo interno consolidar-se-ía, as exportações engrossassem o caudal de bens e serviços a enviar para o exterior. Enfim, era expectável que a economia portuguesa observasse o tal mecanismo ou efeito de multiplicação que J. M. Keynes explicou à humanidade há uns bons anos. Infelizmente, o take-of da economia portuguesa ainda não se fez. Antes pelo contrário, a estganação e o clima de recessão parecem estar aí, como o Toytota, para ficar e durar. Daí a interrogação que aqui nos fazemos. Entre o anunciado e o realizado não deixa de ser paradoxal o comportamento da economia nacional. Não se compreende como não estamos já aumentando a nossa riqueza, os nossos rendimentos, o consumo interno e os níveis de bem-estar que, regra geral, acompanham as fases de crescimento socioeconómico da vida das sociedades e dos países.
Como à luz da teoria económica mais simples não encontro razão para este subdesenvolvimento crónico que nos tolhe a todos, adianto, em alternativa - uma outra explicação para a nossa desgraça colectiva. Certo dia um profeta e o seu discípulo fizeram uma viagem, e pediram alojamento numa dessas residências que encontraram pelo caminho. Às refeições, foi-lhes servido, como alimentação, apenas um copo de leite. Era a única coisa que os donos da casa tinham para oferecer, apesar de todos ali serem pessoas saudáveis. Pois a terra era boa, havia muito plantio, porém a família não a cultivava. Estes dois caminhantes tinham de partir, pois sem alimentação não poderiam ficar mais tempo. Mas antes de partirem o profeta ordenou ao discípulo que empurrasse a tal vaca que pastava à beira do precipício. Como era obediente, o discípulo empurrou a vaca e o animal morreu na queda. Anos depois, estes dois companheiros regressaram àquela região e pediram novamente hospedagem na mesma casa. Observaram imediatamente que alguma coisa havia mudado naquela família: viam-se plantações em redor da casa, inúmeros animais pastando.. E, ao jantar, já não lhes foi servida o tal miserável copinho de leite, mas uma comida variada, preparada com alimentos colhidos da própria terra, o que foi motivo de orgulho para todos. Depois da estadia, estes dois homens despediram-se dos donos da casa e prosseguiram viagem. Foi então que o profeta disse ao seu discípulo: - Se não tivéssemos empurrado a vaca pelo precipício, esta família nunca se teria desenvolvido, trabalhando e cultivando a terra que possuía. Isto revela como devemos expandir as nossas habilitações para coisas novas. Só assim poderemos progredir. Mas também mostra que a mudança de hábitos requer novos comportamentos, novas atitudes, o que implica sacrifícios e rupturas drásticas com os padrões de trabalhos existentes. Perante toda esta história - agora aplicada ao caso da economia nacional - interrogo-me duplamente: por um lado, onde é que está a "vaca" da economia portuguesa; por outro, quem está disposto a empurrà-la pelo penhasco abaixo..
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