quarta-feira

Duas reflexões: os "instrangeiros" e o futuro de Portugal

- Quando procuramos o nosso carro e ele não está lá, geralmente houve algo relacionado com o escape. Talvez valha a pena criar um Livro Branco sobre política de inovação para dinamizar a ciência (pura e aplicada) em Portugal. A meta (com o processo de Bolonha no horizonte) que, confesso, já enjoa e se transformou num 2º discurso sobre a globalização (não há gato sapato que não se lhe queira associar), é gerar empregabilidade científica.
- Com a chancela do Ministério da Ciência e Ensino Superior, o Estado poderia fazer um esforço acrescido em atrair investigadores portugueses de excelência, acabando assim com a fuga de cérebros nas ciências e gerar mais e melhores condições para os que cá estão. Mas o tal critério duma ministra tosca - a Srª Graça Carvalho - (ao tempo do governo de Durão - que até chorou publicamente quando S. Lopes foi demitido) - apontava, como condição sine qua non, que o dito investigador tenha publicado 100 artigos em revistas internacionais e supervisionado 10 doutoramentos... Ora, esta mezinha é absolutamente ridícula, para não lhe chamar outra coisa.
  • - A estratégia da então ministra da C & T de Durão foi, portanto, dum ridículo atroz, além de absolutamente inezequível e improdutivo. No entanto, e mascarado de despudor político, aquela estulta medida foi apresentada num embrulho às bolinhas absolutamente vendável e rezava assim: esta medida promove o emprego científico e premeia o mérito. Apesar dos critérios serem apertados para o fim em vista: atracção de cérebros nacionais no estrangeiro.
  • - Foi este tipo de incompetência buçal e de medidas experimentalistas de rato de laboratório na área da C & T do governo de Durão - que contribuíu para o subdesenvolvimento de que o sector ainda padece.
  • - Sendo certo que o objectivo seria (será) - com Mariano Gago à frente da pasta - contribuir para o tripé civilizatório em Portugal, já que o avanço técnico é indutor de igualdade e de liberdade.
  • - Daí a importância, hipotética, da criação do tal livro Branco sobre política de inovação para dinamizar a C & I em Portugal. Doutro modo, estamos condenados a cair na nossa própria ratoeira subdesenvolvimentista: pretendemos potenciar o emprego científico mas depois o país-real - através das suas estruturas de C & I não absorvem a oferta que o mercado gera, e cria-se o tal gap que atravanca Portugal.
  • - Ora, deste gap, deste atraso e destas disfunções entre a oferta e a procura no mercado de trabalho científico nacional, emergiu uma nova categoria socio-profissional que tem feito carreira em Portugal: os instrangeiros. Ou seja, são homens e mulheres já bastante qualificados que em Portugal não encontram saídas profissionais e têm assim de emigrar.
  • - Embora nacionais politicamente, são estrangeiros socialmente, daí os "instangeiros". Também aqui a globalização faz o seu curso: aumentou o número de cientistas mas empurrou-os, compulsivamente, para outros países onde existem melhores igualdades de oportunidade. Obrigou-os a mudarem de país, de família, de hábitos, de costumes, de leis, de ares e até de língua e de alimentação...
  • - Ora isto também reflecte a qualidade não só do nosso nível de desenvolvimento socieconómico, mas também permite-nos aquilatar da verdadeira natureza e funcionamento da nossa própria democracia que já conta com mais de 30 anos.
  • - É curioso como as coisas se passa entre os discursos dos poderes públicos e a realidade: fala-se em Bolonha, em empregablidade, em mobilidade, em melhoria das condições de igualdade de oportunidades no mercado de trabalho mais qualificado, mas depois as pessoas são cada vez mais excluídas do direito ao trabalho, do direito à família, do direito ao rendimento, a terem filhos, um lar, etc, etc, etc...
  • - Aqui a distância que medeia o discurso e as boas intenções políticas e a realidade nua e crua dos factos, é a mesma que vai de Lisboa a Dili, em Timor-Leste - como muitos incêndios, catanadas e dramas pessoais pelo meio desse trajecto longo e tenebroso. Não vejo, sinceramente, como aqui se possa falar em sustentabilidade e inclusividade, dois chavões que andam na boca das autoridades e que, na prática, nada significam.Isto, apesar do conhecimento se ter tornado global, embora também global sejam cada vez mais os factores de exclusão e de integração social neste país situado na cadau-da-cauda da Europa.
  • - Contudo, importa notar uma curiosidade: os cientistas de reputação mundial são originários do 3º Mundo, mas vivem e enriquecem culturalmente as megapolis do 1º Mundo (EUA e Europa); outros operam nessa aldeia global através de filiais de multinacionais produzindo um saber que poderá segregar os indígenas num quadro de novas exclusões. O que não deixa de ser um paradoxo dos novos tempos...
  • - Seja como for, costumo dizer que sempre que Mariano Gago comanda a área da C & T, independentemente deste governo ser socialista, algo mexe naquele sector de ponta. Aguardemos, pois, se os novos desenvolvimentos apontam para a criação de mais vantagens competitivas não negligenciando a dimensão social deste problema ou se, como se teme, as coisas não sofram grandes modificações, por entre os já milhares de discursos e notas de pé-de-página sobre Bolonha e o espargete em que já se transformou essa discussão pública europeia.
  • - Quem sabe se ao livro Branco não se poderia criar um observatório permanente para fazer o livro Amarelo (centro operacional de formulação de propostas); e um livro Verde (plano estratégico global da empresa-cidade-região) comprometendo eleitos e eleitores, cientistas e poderes. Ao branco da reflexão prospectiva seguia-se o amarelo da mobilização e o verde da acção estratégica. Assim, os elos da cadeia do processo de tomada de decisão poderia, de forma mais segura e eficiente, identificar as linhas estratégicas e as tendências que podem tecer o futuro que aí vem.
  • - Naturalmente, este reflexão pode muito bem encadear-se com a seguinte, pois elas poderão representar as duas faces da mesma moeda. Afinal, é do futuro de Portugal e dos portugueses que estamos a falar... ::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::
E O FUTURO? (reflexão extraído do blog o Jumento) Para os nossos políticos o futuro tem três, quatro ou cinco anos o tempo que, consoante os casos, duram os seus mandatos. Para a Comissão Europeia o grande problema da nossa economia é o défice público, para o Medina Carreira e outros profetas do purgatório, é a despesa pública, isto é, Portugal não tem futuro, por aqui só se pensa no imediato e, para desgraça de todos, nem nisso somos bons. E o futuro, o que vai suceder daqui a vinte ou trinta anos? O mais longe que temos ido é dez ou quinze anos, porque a segurança social entra em crise ou porque o aeroporto de Lisboa fica lotado. - Temos um problema com a natalidade e o que fazemos? E quanto a medidas de promoção da natalidade nem se fala, e, pior do que isso, o discurso dos nossos políticos é tão anti-libidinoso que um dia destes nem vão nascer caracóis neste país. As desgraças anunciadas são tantas que decidir ter um filho quase se torna um crime, e aqueles que os têm assistem à sua partida para o estrangeiro, ou porque são qualificados e não encontram emprego compatível, ou porque não o são e ganham miseravelmente. - Temos um problema energético e parece que o vamos resolver quando Pina Moura e a Iberdrola avançarem com uma Opa à EDP. Se hoje a importação de energia nos consome os recursos o que sucederá se o parque automóvel crescer desordenadamente, se a industrialização for promovida sem considerar as prioridades energéticas, e se continuarmos a pensar que as eólicas recompensar-nos-ão por não termos nascido na Arábia Saudita? - Não temos mão de obra qualificada, o que nos condena a níveis de produtividade que nos remete para a cauda da Europa. Mas nada de sério se faz no plano do ensino ou da formação profissional. Nem sequer temos uma política de emigração, deixamos que a vinda de emigrantes seja gerida por máfias ou pelo oportunismo da construção civil, em vez de sermos criteriosos promovendo a vinda de quadros e trabalhadores qualificados. - Eu que não sou nada dado a nacionalismos aljubarróticos (o raio da costela andaluza não me permite) ainda poderia sugerir que daqui a 30 anos, quando não houvessem mais soluções, voltássemos à Espanha, mas receio que nessa ocasião os espanhóis já não aceitem devoluções, ou que considerem que os nossos políticos sejam ainda mais perigosos que os etarras.

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